Luiza Mello
Enfrentar a crise climática é o grande desafio do século. Neste ano, o planeta apresentou as maiores taxas médias de temperatura, demonstrando que o aquecimento global é uma realidade e ameaça a vida de todos os seres. O Brasil caminha a passos lentos para alcançar a sustentabilidade. No último ranking realizado entre os países que mais avançaram nessa meta, o Brasil ficou em 55ª colocação, mesmo sendo o berço de um dos maiores biomas do mundo, a Floresta Amazônica.
Para contribuir com o avanço do país nesta nova urgência mundial, o senador Jader Barbalho (MDB-PA) apresentou um projeto de lei que prevê a criação de um conjunto de normas para reconhecer projetos ou ativos sustentáveis, e que possa servir de baliza para orientar investimentos públicos e privados, uma taxonomia sustentável nacional.
A taxonomia verde é um dos instrumentos para financiar o plano, e busca dar transparência e segurança aos investidores, assegurando que os recursos destinados para o Plano de Transição Ecológica nacional, que conta com 100 ações para promover a transição da economia. Estão incluídas entre as ações do plano o combate ao desmatamento, geração de energias limpas e um marco regulatório para mineração. “A taxonomia permite uma maior atração de investimentos privados para viabilizar o planejamento de transição ecológica do país”, ressalta o senador Jader.
“O que estamos a presenciar é um dos momentos mais críticos do nosso planeta e todos nós precisamos agir. Diversos países no mundo já discutem e alguns já definiram classificações que permitem orientar investimentos financeiros sustentáveis ao identificar atividades econômicas que contribuem para os objetivos sustentáveis. Espero que o Congresso Nacional tenha sensibilidade para agilizar este, que é um dos temas mais importantes para a humanidade”, justifica o autor da proposta.
Jader Barbalho antecipa que, entre outras urgências, a proposta indica a definição e regulamentação de propriedade sustentável. “O Brasil ainda não tem uma legislação que estabeleça os critérios para a definição de propriedade sustentável. Esse projeto, se for aprovado, trará diversos benefícios, como a redução de custos para a sua elaboração, a atração de capital, o apoio à formulação de políticas de incentivo e o mapeamento dos fluxos de crédito”, explica.
FRAUDES
Jader Barbalho cita a necessidade de o país tomar medidas imediatas para evitar que pessoas mal-intencionadas utilizem desse novo mercado de capital mundial para tirar vantagem. “É preciso cortar o mal pela raiz e essa ação no Brasil é extremamente necessária. Já vimos a identificação de falsos ‘vendedores de carbono’ na Amazônia, o que na prática é chamado de ‘greenwashing’ (do inglês, lavagem verde). Somente uma legislação moderna e específica para esse novo horizonte que se abre vai nos permitir evitar divulgações falsas sobre produtos sustentáveis”
O senador se refere, inclusive, a empresas que divulgam que seus produtos são sustentáveis — seja usando publicidade, seja colocando informações indevidas nos rótulos. O “greenwashing”, identificado em outros países, significa passar uma imagem falsa de sustentabilidade por parte de uma companhia. Isso pode acontecer de várias formas: ocultando dados, dando ênfase em algum componente ou característica que pode ser considerado sustentável no lugar de produtos que não são sustentáveis, ou até mesmo usando informações inverídicas.
CENTRO
O projeto de lei apresentado pelo senador paraense mostra que a Taxonomia Verde Nacional pode posicionar o país como um centro financeiro sustentável de referência no mercado financeiro latino-americano, considerando que o Brasil é a maior economia da região, além de que atrair investimentos internacionais é fundamental para alcançar o desenvolvimento sustentável.
A taxonomia, no contexto das finanças (sustentáveis), é um sistema de classificação que permite identificar atividades, ativos e/ou projetos que apresentem objetivos sustentáveis (ambientais e/ou sociais) com base em métricas e/ou metas preestabelecidas. Ao estabelecer critérios objetivos, a taxonomia facilita a comunicação e avaliação das atividades econômicas e financeiras, aprimorando o monitoramento da transição a uma economia de baixo carbono e resiliente.
Empresários e técnicos engajados no processo de transição sustentável cobram do governo brasileiro uma taxonomia nacional a exemplo de União Europeia, da China e do México. A falta de padronização para definir o que é um empreendimento “verde” (ambientalmente sustentável) tem preocupado investidores que querem destinar recursos a operações que promovam ações de sustentabilidade.
Especialista em taxonomia verde, a diretora da Associação Soluções Inclusivas Sustentáveis (SIS), Luciane Moessa, afirma que a medida é fundamental para as estratégias de descarbonização, ou seja, de estímulos à produção econômica menos poluente. “É preciso promover essa transição justamente etiquetando: que o setor financeiro passe a financiar o esverdeamento das atividades econômicas tradicionais usando tecnologias mais avançadas para o seu setor e, ao mesmo tempo, financiar a nova economia”, declarou.
Luciane Moessa lembrou que essa é uma agenda global, na qual o Brasil está atrasado, inclusive em relação a vizinhos latino-americanos.
CERTIFICAÇÕES
Atualmente, os investimentos que se anunciam como verdes e sustentáveis são certificados por consultorias privadas que têm seus próprios critérios, não uniformes. A necessidade de ter no Brasil critérios mais firmes para enquadrar quais carteiras e fundos de investimentos seguem de fato os aspectos de investimentos sustentáveis, tem sido uma das principais pautas de reuniões de empresários e investidores comprometidos com a questão ambiental, inclusive com o governo federal.
O único órgão público que participa do processo, segundo especialistas, é a CVM (Comissão de Valores Mobiliários) —ainda assim, de forma indireta. Resolução prevista para entrar em vigor ainda este ano determina que gestores de fundos de investimentos ambientais, verdes ou sociais devem sinalizar os benefícios de seus investimentos e qual a metodologia adotada.
A norma, porém, não vale para todos os tipos de fundos no mercado. Além disso, segundo a CVM, a fiscalização só é feita a partir de uma denúncia ou, de forma mais ampla, em um relatório bienal sobre os riscos do mercado financeiro. Essa lacuna na legislação brasileira não deslegitima os atuais fundos verdes, que já atuam no mercado. O projeto de lei de autoria do senador Jader Barbalho foi protocolado na Mesa Diretora do Senado e aguarda a definição de tramitação na Casa Legislativa.