BRASÍLIA (AG) – O governo definiu em portaria divulgada nesta quinta-feira a listagem de meios de pagamento das apostas on-line chamadas de “bets”, que estão em processo de regulamentação pelo Ministério da Fazenda. O cartão de crédito será proibido.
O apostador só poderá pagar a aposta por meio de Pix, TED, cartões de débito ou cartões pré-pagos. Será necessário uma conta cadastrada na empresa que realiza o jogo. Não serão aceitos pagamentos por meio de dinheiro em espécie, cartão de crédito, boletos de pagamento, criptoativos, etc.
A portaria também proíbe pagamento de “qualquer outra forma alternativa de depósito que possa dificultar a identificação da origem dos recursos”. A proibição do cartão de crédito é citada pela Fazenda como uma “medida prudencial de desestímulo” ao endividamento das pessoas que realizam apostas.
O Instituto Jogo Legal (IJL) estima que o mercado de apostas online no Brasil movimenta R$ 45 bilhões ao ano, segundo dados de 2023.
Outra definição que consta na portaria é que o ganhador deverá receber valor do prêmio em até 120 minutos. O prazo é contado a partir do encerramento do evento de temática esportiva ou de uma sessão do evento virtual de jogo on-line objeto das apostas.
Em janeiro, um decreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, oficializou a criação da Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA), que ficará responsável por todo o processo de regulamentação, abrangendo as apostas esportivas chamadas de “bets”. A expectativa é terminar esse processo até o início do segundo semestre.
A Secretaria também é responsável por ações de prevenção à lavagem de dinheiro, assim como de monitoramento do mercado visando prevenir a compulsividade nos jogos e buscar a proteção de pessoas vulneráveis, especialmente menores. A fiscalização das ações de comunicação, de publicidade e de marketing também está prevista.
O Ministério da Fazenda anunciou um cronograma para regulamentar o mercado de prêmios e apostas on-line, que inclui a publicação de 11 portarias para a regulação do mercado, até o início do segundo semestre. Serão tratados diversos temas, desde o combate à lavagem de dinheiro a fraudes relacionadas à exploração comercial de apostas de quota fixa.
Haverá também, outro exemplo, um normativo de “ação sancionadora”, com procedimentos de aplicação de sanções administrativas na atividade de exploração comercial para as apostas de quota fixa.
No início do ano, mais de 130 empresas manifestaram interesse no mercado brasileiro, número acima das expectativas do Ministério da Fazenda. Cerca de 298 sites já foram identificados em funcionamento no país, mas mais de um domínio pode pertencer a mesma empresa.
A lista traz companhias de grande porte, como a MGM Resorts, com sede em Las Vegas, nos Estados Unidos, e outras casas do Reino Unido, China, França, Portugal, além de uma grande quantidade de empresas sediadas em paraíso fiscal.
As medidas anunciadas pelo governo foram bem recebidas por representantes de casas de apostas e especialistas no tema, que avaliam que o veto a alguns meios de pagamento, por exemplo, busca prevenir o transtorno de jogo compulsivo.
– A proibição ao cartão de crédito traz a segurança de que o brasileiro não vai se endividar para apostar – resume André Gelfi, presidente do Instituto Brasileiro de Jogo Responsável (IBJR), que representa empresas como Betfair, Bet365, SportingBet, Betano e outras.
Na ponta da linha, no entanto, o impacto é limitado. Estimativa do IJL mostra que aproximadamente 95% dos pagamentos realizados em plataformas de apostas online são por meio do Pix.
José Victor Valadares, diretor de negócios da Case de apostas Bet7k, diz que a grande maioria das empresas que atuam no Brasil tem apenas essa modalidade de pagamento.
Já quanto ao prazo de 120 minutos para o pagamento dos lances em que o apostador saiu vencedor, os representantes das casas de apostas dizem que é importante ter uma regra comum ao segmento. A maioria afirma fazer essa transferência de forma instantânea.
– O prazo anunciado pelo governo é completamente justo. Em nossa plataforma, realizamos o pagamento com agilidade para que os jogadores possam usar o prêmio em instantes – conta Rafael Borges, Country Manager da Reals.
É o mesmo que diz Marcos Sabiá, CEO da galera.bet. Ele considera importante traçar limites comuns ao mercado, mas a realidade é que as empresas já realizam esses pagamentos em tempo bem inferior a duas horas.
Atualmente, as plataformas criam seus regramentos de forma individual, impulsionando certa disputa entre as empresas, que buscam conseguir pagar o consumidor o quanto antes.
Para o presidente do IJL, Magnho José, a mudança deve acabar excluindo operadoras menores do mercado, que encontram mais entraves operacionais para realizar pagamentos com rapidez.
– A normativa “subiu a régua”. As operadoras terão que buscar maior nível de desempenho e excelência, além de reservas financeiras para atender as exigências da portaria. A norma vai ajudar a eliminar os aventureiros – diz José.
Outro ponto importante da série de medidas anunciadas pelo governo é a implementação de uma reserva financeira no valor de R$ 5 milhões.
Cada operador de apostas deve manter um fundo como medida preventiva para garantir o pagamento de prêmios e demais valores aos apostadores, em caso de problemas de liquidez.
O advogado Marcus Fonseca, sócio do TozziniFreire Advogados, afirma que o governo busca garantir que os recursos dos apostadores não sejam comprometidos em caso de saques elevados.
O documento ainda diz que os valores depositados pelos apostadores devem ser considerados patrimônio separado, ou seja, que não se confunde com os recursos do agente operador de apostas.
– O patrimônio separado já estava previsto e agora só está sendo replicado de novo na portaria. O que é recurso da empresa é dela e o que é recurso dos apostadores estaria segregado desse patrimônio – resume Fonseca.
Para o advogado Luiz Loques, outra medida importante é a garantia de maior transparência ao modo como as odds (as chances de que um resultado aconteça) são contabilizadas. Quanto maior a odd, mais dinheiro o apostador recebe se vencer o lance.
– O consumidor precisa entender a metodologia por trás das odds. Por vezes, um mesmo lance tem odd menor em uma casa (ou seja, com prêmio menor para caso o resultado se concretize). O consumidor também precisa saber se a casa pode pagar essa aposta, para não escolher apenas pela que paga mais e correr o risco de não receber.
Texto de: Renan Monteiro e Ana Flávia Pilar