JOÃO GABRIEL, THIAGO RESENDE, THAÍSA OLIVEIRA E VICTORIA AZEVEDO
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Após o Congresso Nacional derrubar o veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à tese do marco temporal, o governo federal deve entrar com um pedido para que o STF (Supremo Tribunal Federal) analise o caso.
A informação foi confirmada à reportagem pela ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, nesta quinta (14), logo após a derrubada do veto pelo Legislativo.
“Essa decisão vai totalmente na contramão dos acordos climáticos que o Brasil vem construindo globalmente no atual governo do presidente Lula para o enfrentamento à questão da emergência climática que também coloca em risco os direitos e as proteções dos territórios indígenas e de suas populações”, disse ela.
“O Ministério dos Povos Indígenas vai acionar a Advocacia Geral da União para dar entrada no STF a uma Ação Direta de Inconstitucionalidade a fim de garantir que a decisão já tomada pela alta corte seja preservada, assim como os direitos dos povos originários”, completou.
As pastas devem alegar inconstitucionalidade da tese. Anteriormente, a AGU já se manifestou nesta linha, quando embasou o veto de Lula ao tema.
“Se judicializarem, nós vamos trabalhar para ganhar de novo. Eu acho que você ter a votação que nós tivemos, será que é preciso judicializar? No Senado, 53 votos, na Câmara, 321. Mostrou que essa Casa, que legisla, quer o marco temporal. Isso precisa ser respeitado”, disse a senadora Tereza Cristina (PP-MS), que foi ministra da Agricultura de Jair Bolsonaro (PL).
Já o presidente da bancada ruralista, Pedro Lupion (PP-PR), disse que o resultado foi “uma vitória estrondosa” e que o placar indica quórum para o Congresso alterar a Constituição e afastar a tese de março temporal. Portanto, se o Supremo avançar nessa discussão novamente, os ruralistas pretendem aprovar uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição).
“Não tenho dúvidas de que haverá questionamentos, mas temos força para colocar isso na Constituição e encerrar essa discussão. Isso foi o mais importante da votação de hoje”, disse Lupion.
A tese do marco temporal é defendida pela bancada ruralista e determina que devem ser demarcados os territórios considerando a ocupação indígena em 1988, na data da promulgação da Constituição.
A proposta é criticada como inconstitucional pelos indígenas, que argumentam que o direito às terras é anterior à criação do Estado brasileiro e que, portanto, não pode estar restrito a um ponto temporal.
Em reação, a bancada ruralista no Congresso aprovou um projeto de lei que instituiu na legislação o marco, que foi vetado por Lula, e depois derrubado, nesta quinta-feira (14), pelos parlamentares.
Agora, a intenção da bancada ruralista é aprovar a PEC. A lógica é que, se o STF deve seguir a Constituição em suas análises, ao inserir o marco na Carta Magna, os ministros devem seguir a tese em suas decisões.
A articulação contra o marco, como mostrou a Folha de S.Paulo, integra também uma ofensiva maior do Congresso, impulsionada pela oposição e pelos ruralistas, contra movimentações recentes do Supremo, por exemplo sobre aborto e drogas, nas quais parlamentares avaliam existir uma interferência indevida em suas competências legislativas.
O movimento começou quando o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), anunciou a PEC antidrogas, uma resposta direta ao julgamento em andamento na corte sobre a descriminalização da posse de substâncias em pequena quantidade -a análise na corte foi interrompida por um pedido de vista (mais tempo para analisar) do ministro André Mendonça.
A proposta de Pacheco, por sua vez, determina a criminalização de qualquer quantidade e qualquer substância. Ela está atualmente na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), e deve avançar, segundo parlamentares.