Uma pesquisa divulgada nesta terça, 30, pelos institutos Patrícia Galvão e Locomotiva traz um retrato alarmante da violência sexual no Brasil: 15% das mulheres afirmam já ter sido vítimas de estupro.
Entre essas, a maior parte (12%) relata que o abuso ocorreu quando tinham até 13 anos de idade. O dado mais perturbador é que mais da metade delas (57%) nunca contou a ninguém sobre a violência sofrida. Além disso, a maioria não buscou atendimento em serviços de saúde, e 8% das vítimas engravidaram em consequência do crime.
O levantamento ouviu 1.200 pessoas em todas as regiões do país, sendo 622 mulheres com 16 anos ou mais, entre 11 e 25 de julho.
O estudo revela também que seis em cada dez brasileiros (59%) conhecem uma mulher que foi estuprada ainda na infância. Já 22% afirmam conhecer uma vítima que engravidou após a violência.
Segundo Marisa Sanematsu, diretora de conteúdo do Instituto Patrícia Galvão, o silêncio é alimentado pelo tabu em torno do abuso sexual de crianças e pelo estigma que recai sobre as vítimas.
“A maioria dos estupros ocorre dentro de casa e é cometida por um parente ou conhecido. Muitas vezes, a família não quer enxergar e muito menos denunciar o agressor, pois isso poderia desestruturar a casa. Assim, quando a menina rompe o silêncio, com frequência dizem que ela está inventando, enquanto o agressor nega ou culpa a criança”, explica.
Ela destaca que o abusador se aproveita da proximidade com a vítima e da confiança da família. Muitas crianças, sem compreender o que acontece, tornam-se reféns do agressor por afeto, sensação de cumplicidade ou medo de ameaças.
Essas violências, lembra a especialista, deixam marcas duradouras, podendo gerar traumas, apagões de memória e sofrimento que muitas vezes só emergem na vida adulta.
Aborto legal e desinformação
A pesquisa também mostra que 96% dos entrevistados acreditam que meninas de até 13 anos não têm preparo físico e emocional para serem mães. E sete em cada dez brasileiras defendem o direito de interromper legalmente uma gestação decorrente de estupro.
Apesar disso, ainda há forte desconhecimento sobre a lei. Apenas 43% da população sabem que o aborto é permitido em casos de estupro, estupro de vulnerável, risco de vida para a gestante ou má formação fetal.
O desconhecimento é ainda maior sobre o acesso ao procedimento: só quatro em cada dez pessoas sabem que não é necessário apresentar boletim de ocorrência para realizar o aborto legal. Para 80% dos entrevistados, faltam informações claras sobre o tema.
O estudo também aponta que quase metade da população (47%) conhece uma mulher que já realizou aborto — sendo que 71% desses casos ocorreram de forma clandestina.