'Escola de Quebrada": KondZilla promove a cultura jovem das favelas com longa

A produtora KondZilla, conhecida por fomentar a cultura funk, lança seu primeiro longa-metragem. Foto: Divulgação
A produtora KondZilla, conhecida por fomentar a cultura funk, lança seu primeiro longa-metragem. Foto: Divulgação

Wal Sarges

Gírias, vestuário e temas como a falsificação de roupas e a ruptura com alguns estereótipos moldam o comportamento de personagens do filme “Escola de Quebrada”, o primeiro longa-metragem do KondZilla, que estreou na última sexta-feira, 3, com exclusividade no Paramount+, serviço de streaming.

O lançamento do filme ocorreu em uma coletiva de imprensa, com mediação de Thiago Torres, o Chavoso da USP, contando com a presença de Kaique Alves (KondZilla), que atua na produção executiva, direção – ao lado de Thiago Eva -, criação e também no elenco. Estiveram presentes ainda os atores Maurício Sasi, Lucas Righi, Pathy de Jesus e Laura Carvalho.

A narrativa apresenta a história de Luan, personagem do ator Maurício Sasi, em uma escola pública da periferia de São Paulo. Cansado de sempre ser excluído dos grupinhos e, principalmente, ser invisível aos olhos de Camila, papel da atriz Laura Carvalho, na tentativa de fazer parte de algum grupo, ele consegue ter a inimizade de todos e até coloca em risco o amado campeonato de futsal da escola.

Para fugir dessa bagunça, ele vai precisar da ajuda de seus amigos: Rayane, interpretada por Bea Oliveira, e David, personagem de Lucas Righi. Juntos, eles encontram uma maneira de salvar o campeonato e obter a tão desejada atenção de Camila. Ou pelo menos é o que Luan pensa.

Chavoso da USP, conhecido por vídeos sobre educação, destaca que a obra traz “enredo impecável” e que fez parte de sua vida porque sempre estudou em escola pública. Já o diretor Kaique Alves diz que queria se sentir representado nas produções cinematográficas e esta foi a oportunidade que encontrou. “Eu cresci assistindo a filmes de entretenimento com cenário escolar, mas nenhum deles retratava a escola da quebrada, sempre eram ambientes ligados aos padrões norte-americanos e de elite”, conta o diretor.

Um dos grandes motes do filme é quebrar estereótipos sobre as pessoas que moram em lugares periféricos, que em São Paulo são chamadas de “quebradas”, que é onde o longa foi ambientado, trazendo referência nas roupas, nas gírias ou nos cenários das gravações. “Isso é incrível, é muito importante mostrar que existem outros ambientes que muitas vezes não aparecem nos filmes ou sempre são mostrados de forma estereotipada. É um degrauzinho que a gente subiu para inspirar também de forma potente outras produções de audiovisual”, afirmou Maurício Sasi.

OUTRAS VIVÊNCIAS

O ator considera que as produções audiovisuais devem ser mais atentas à forma como se pode enaltecer outras formas de viver na periferia.

“O Luan é um menino preto que se apaixona por uma menina na escola, tratando um tema que todo adolescente pode viver um dia. Penso que, muitas vezes, as pessoas nos chamam para fazer atuações só para falar de racismo. É importante, mas acredito que é interessante também mostrar que muitas vezes a gente tem uma família linda, apesar de morar na periferia, que é alguém que pode se preocupar em comprar tênis novos e roupas bonitas. Podemos falar disso também”.

O ator Lucas Righi destaca como todas as pessoas de uma escola estão representadas na narrativa. “Acho importante existir um filme assim, em que cada personagem traz uma mensagem diferente. As pessoas se identificam com os personagens porque o filme mostra como a gente lida com a cultura do funk, com as amizades na escola e a internet, que é o nosso mundo, de quem é adolescente ou quem já foi”.

A atriz Laura Carvalho destacou outro ponto importante da produção, que é a leveza. “Uma coisa muito legal que foi comentado durante as preparações de elenco, é que o filme é da quebrada sem uma gota de sangue derramada. É interessante mostrar o outro lado da quebrada, que tem alegria, diversão”, pontuou.

Pathy de Jesus, que fez a mãe de Luan, conta que ficou feliz com a atuação dos atores mais jovens. “Eu fui de quebrada e agora estou participando de um filme que me coloca sob outro prisma, do olhar de uma mãe. Tive muitos flashbacks, principalmente pensando no meu filho, que hoje tem três anos, e daqui um tempo também será adolescente ou viverá esses conflitos no futuro”, contou.

A atriz lembrou-se de uma cena em que defendeu o filho com unhas e dentes na escola. “Foi maravilhoso de duas formas. Primeiro lembrei da época que a gente sofria bullying, mas nem tinha um termo ainda para classificar isso. E ao mesmo tempo a cena traz esse olhar da mãe e faz-me pensar no meu filho, de cuidado, de acolher. Me sinto lisonjeada de estar em meio a tanto talento maneiro, jovens que deram aula”.

Estreando sua primeira grande produção em um longa-metragem, o produtor KondZilla, criador da empresa que leva seu nome, diz que buscou referências a partir de seu olhar voltado para a periferia. “Geralmente, as grandes produções sempre são do Rio de Janeiro e elas ditaram na maioria das vezes a voz das periferias do Rio, mas a gente queria trazer elementos típicos de São Paulo para dentro do filme, colocar o nosso vocabulário e a gente precisava imprimir a nossa peculiaridade de quarta maior favela do Brasil. Além disso, para mim, era importante trazer a leveza do entretenimento, do filme que transmite uma mensagem, mas diverte”.

Kaique conta que se preocupou muito em trazer situações que são grandiosas para quem está na escola, como o primeiro dia de aula, o tênis branco, que lembra uma guerra mundial quando alguém pisa nele.

“Outra coisa é a presença do Sangue Bom, personagem inspirado no meu tio que foi preso no Carandiru, sobreviveu à chacina e era alguém que sempre me deu bons conselhos, apesar de estar naquele universo. Tem ainda a questão das roupas falsificadas, que é algo que existe nas periferias. A galera não tem dinheiro, mas não quer deixar de realizar um sonho. Mas a gente traz isso de forma diferente”, aponta.