Enfermagem: Programa Saúde da Família pode ter cortes

Enfermagem: Programa Saúde da Família pode ter cortes

Um levantamento feito pela Confederação Nacional de Municípios (CNM) revela que o novo piso salarial das equipes municipais de enfermagem pode impactar em R$ 10,5 bilhões ao ano no orçamento das prefeituras.

De acordo com a entidade municipalista, para honrar o piso salarial sem ampliar o montante total de recursos para essas folhas de pagamento, as prefeituras podem ter que demitir um quarto dos 143,3 mil profissionais ligados à Estratégia de Saúde da Família (ESF). O estudo revela que, apenas nesse programa, o impacto do piso da enfermagem, pode ser superior a R$ 1,8 bilhão no primeiro ano

A CNM informa ainda que o enxugamento das equipes de saúde da família pode deixar mais de 35 milhões de brasileiros sem assistência médica de qualidade. Os cálculos consideram apenas o cenário em que o orçamento para os salários da enfermagem permanece inalterado, sem fontes adicionais de financiamento. Norte e Nordeste seriam as regiões mais prejudicadas com o corte de equipes de saúde da família.

O Pará tem hoje 6.019 profissionais da área de enfermagem trabalhando nos municípios, informa o estudo feito pela CNM. Desse total, 1.883 atuam exclusivamente na Estratégia de Saúde da Família (ESF) e levam atendimento a mais de cinco milhões de pessoas em todo o Estado.

Considerando a soma dos salários pagos nos 144 municípios paraenses a essas equipes, o valor chega a R$ 208 milhões. O impacto, segundo estudo da confederação municipalista, seria um acréscimo de mais 104 milhões de reais nas folhas de pagamento (soma para os 144 municípios).

A CNM previu que, caso seja feito um corte de 33% no número de equipes, que somam 630 profissionais atualmente, para todas as cidades paraenses, pelo menos 1 milhão e 735 mil pessoas ficariam desassistidas.

RIBEIRINHOS

A CNM também mensurou o impacto estimado do novo piso salarial da enfermagem nas equipes que atendem as famílias ribeirinhas, considerada bastante vulnerável que atualmente conta com 208 equipes de Saúde da Família Ribeirinha (eSFR) e 34 equipes de Saúde da Família Fluvial (eSFF), assistindo mais de 500 mil usuários do SUS que residem em localidades ribeirinhas de difícil acesso, em municípios da Região Amazônica.

A legislação atual prevê que as equipes que atendem a essa população, devem ser compostas por um enfermeiro e um técnico de enfermagem. No orçamento nacional, estima-se que são necessários R$ 15,9 milhões ao ano para manter as despesas com a remuneração desses profissionais de enfermagem, considerando os valores declarados na RAIS. O impacto financeiro do novo piso salarial nacional da enfermagem pode chegar a mais de R$ 7 milhões somente no primeiro ano.

Para manter as despesas atuais equilibradas, de acordo com a Confederação Nacional dos Municípios, será necessário o desligamento de 64 equipes de Saúde da Família Ribeirinha, o que pode deixar desassistidas mais de 155,7 mil pessoas em situação de vulnerabilidade.

O Pará conta com 79 equipes de Saúde da Família Ribeirinha e para manter o equilíbrio das contas municipais, teriam que ser cortadas 23 equipes, ou 30% do total o que deixaria desassistidas 67.631 pessoas do total de 227.573 que são atendidas hoje pelo programa.

Os impactos também afetam as equipes de Saúde Fluvial que atuam na região amazônica. São 34 equipes que assistem mais de 494 mil habitantes ribeirinhos. A implementação do piso da enfermagem gera um impacto financeiro de R$ 2,7 milhões no orçamento geral desse programa no primeiro ano.

Para manter o equilíbrio econômico e financeiro dessa estratégia, a CNM calculou que os municípios da região deverão descredenciar 12 equipes (34%), deixando de assistir mais de 168 mil usuários do SUS em condições de vulnerabilidade.

Isso sem levar em conta o valor investido na construção de cada UBS Fluvial, que somados os valores de 12 unidades ultrapassam os R$ 22,6 milhões. Nesse cenário analisado pela entidade, o Pará é a unidade da federação que mais seria impactada, com o corte de 30% das equipes, o que deixaria desamparadas mais de 68 mil pessoas.

No dia 4 de setembro, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, apontou risco ao sistema de saúde nacional e suspendeu a lei que determina o novo piso salarial para a enfermagem. O ministro do STF atendeu a pedido de entidades do setor que indicaram risco de demissão em massa e de sobrecarga na rede.

Após a decisão de Barroso, parlamentares começaram a discutir uma solução para o financiamento. Estão entre as opções as correções da tabela do SUS, a desoneração da folha de pagamentos do setor e a compensação da dívida dos estados com a União.

O presidente da Confederação Nacional dos Municípios, Paulo Ziulkoski, disse que nenhuma das alternativas discutidas até o momento atendem às prefeituras brasileiras. Ele também defendeu que o Fundo de Participação dos Municípios seja elevado em 1,5%. “Estamos procurando uma fonte que possa ter a solidariedade da União e dos estados”, concluiu o representante municipalista.

STF tem placar de 5 a 3 pela suspensão do piso

O STF (Supremo Tribunal Federal) registra um placar de cinco a três a favor da suspensão do piso nacional da enfermagem, conforme decidido pelo ministro Luis Roberto Barroso. Os votos divergentes são dos ministros André Mendonça, que abriu a divergência, Kassio Nunes Marques e Edson Fachin.

O tribunal analisa, em sessão do plenário virtual, se mantém a decisão de Barroso que determinou a suspensão da lei que estabeleceu uma remuneração mínima para enfermeiros e auxiliares e técnicos em enfermagem “até que seja esclarecido” o impacto financeiro da medida para estados e municípios e para os hospitais.

Seguiram o voto de Barroso os ministros Ricardo Lewandowski, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Cármen Lúcia. Ainda faltam votar os ministros Rosa Weber, Gilmar Mendes e Luiz Fux.

O julgamento, porém, só será encerrado na sexta-feira (16), e os ministros podem modificar os seus votos ou interromper a votação. No plenário virtual, cada integrante do Supremo deposita seu voto na plataforma, durante um período determinado de tempo.

A norma aprovada pelo Congresso fixou o salário mínimo de R$ 4.750 para os enfermeiros. Técnicos em enfermagem devem receber 70% desse valor, e auxiliares de enfermagem e parteiros, 50%.

Desde que decidiu pela suspensão do piso, Barroso tem reiterado que a sua decisão tem o objetivo de criar, de forma consensual, uma fonte de custeio que a viabilize o cumprimento da lei.

“Minha posição é que é muito justa a instituição de um piso para a enfermagem e para outros profissionais de saúde. Portanto, eu estou empenhado em viabilizar a concretização desse piso”, afirmou Barroso após a sessão do STF na última quinta-feira (8).

“[Mas] Minha visão e a de muitos é de que, sem se construir uma fonte de custeio, seria muito difícil tirar do papel esse piso salarial”, argumentou. De acordo com Barroso, havia um risco real e iminente de descumprimento geral da lei.

“Muitos hospitais já estavam demitindo por antecipação pela dificuldade em cumprir o piso. Obras sociais importantes avisaram que iam fechar. As Santas Casas, se conseguissem não fechar, já acenavam com redução de serviço. Os hospitais conveniados do SUS acenavam com demissão em massa”, afirmou o ministro.

“Essas instituições, como é sabido, já têm contas bastante combalidas pela defasagem da tabela de contraprestação do SUS”, afirmou o advogado.