Chegado a uma polêmica, o carioca e pastor evangélico Silas Malafaia está, desde 20 de agosto, quarta-feira, proibido de se comunicar com Jair Bolsonaro (PL) e seu filho, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), e ainda de viajar para fora do Brasil. Ele precisou entregar todos seus passaportes às autoridades e a Polícia Federal foi autorizada a acessar dispositivos eletrônicos apreendidos, bem como quebrar sigilos bancário, fiscal e telefônico do líder neopentecostal. Ele inclusive chegou a prestar depoimento à PF ontem à noite, e claro, saiu chamando o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, que determinou as medidas, de criminoso.
O STF afirma que a decisão de Moraes foi tomada com base em um pedido feito pela Polícia Federal e com manifestação favorável da PGR. Prestes a fazer 67 anos – no próximo dia 14 – Malafaia é líder da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, televangelista, graduado em Psicologia, presidente da editora Central Gospel e vice-presidente do Conselho Interdenominacional de Ministros Evangélicos do Brasil (Cimeb), entidade que agrega cerca de oito mil pastores de quase todas as denominações evangélicas brasileiras.
É bastante conhecido por sua atuação política e pelos discursos de ódio sobre temas como homossexualidade, união estável entre pessoas do mesmo sexo, pedofilia e aborto, bem como por defender a chamada teologia da prosperidade – que prega que a fé, a confissão positiva e as doações financeiras a igrejas levam à abundância material, saúde e sucesso na vida do fiel. O Conselho Federal de Psicologia já recebeu pedido de cassação do registro profissional do pastor. Já foi denunciado por homofobia e corrupção, e durante a pandemia da Covid-19, a Justiça precisou intervir para que ele não fizesse cultos em meio à proibição de circulação de pessoas.
Em agosto de 2011, Silas Malafaia chamou um vereador do município de São Luís, no Maranhão, de “vagabundo”, “bandido” e “idiota”, após este ter se oposto ao projeto de lei que concederia o título de “Cidadão Ludovicense” ao pastor por considerá-lo homofóbico. Em resposta à reação de Malafaia, a Câmara de Vereadores da cidade arquivou a homenagem e aprovou uma moção de repúdio contra Malafaia, considerando-o persona non grata.
O pastor chamou a jornalista Eliane Brum de “vagabunda” durante uma entrevista concedida ao jornal norte-americano The New York Times, em novembro de 2011. A ofensa foi proferida após a publicação de um artigo de Brum no qual ela relatava a intolerância vivida por pessoas ateias no Brasil. Em resposta ao comentário de Malafaia, Eliane Brum disse: “A afirmação do pastor é autoexplicativa: ao atacar minha honra por discordar de minhas ideias, ele proporciona a maior prova do acerto e da relevância do meu artigo”. Silas Malafaia depois disse que tudo não passou de um “mal-entendido” e afirmou que usou um termo “inapropriado” para se referir ao artigo que Brum escreveu e não ao caráter da jornalista.
Ele nem sempre foi um ferrenho apoiador da extrema direita. Em 2002 e 2006, apoiou Lula (PT) em suas duas campanhas vitoriosas a presidente, chegando a ser indicado a um Conselho informal da Presidência da República. Em 2010, transita para a oposição, apoiando José Serra (PSDB) ao mesmo cargo. Dois anos depois, ainda cabo eleitoral evangélico de Serra à prefeitura de São Paulo, ajudou a eleger 24 prefeitos e 16 vereadores em sete estados. Nas eleições de 2014, fez campanha para Aécio Neves (PSDB) à Presidência da República.
Fortuna e Polêmicas
Em janeiro de 2013, a revista Forbes o classificou como o terceiro pastor mais rico do Brasil, com um patrimônio estimado pela publicação em US$ 150 milhões de dólares. Em entrevista à jornalista Marília Gabriela ele negou a informação: disse que seu patrimônio girava em torno de R$ 6 milhões de reais.
Em 2015, protagonizou uma discussão acalorada com o jornalista Ricardo Boechat, que viria a falecer em 2019, no antigo Twitter (X), após Boechat fazer uma crítica a pastores neopentecostais durante um programa de rádio que apresentava na BandNews FM Fluminense. Malafaia xingou muito no Twitter, ameaçou processo, e o jornalista lhe recomendou “procurar uma rola”, chamando-o ainda de “tomador de grana de fiel”. Os dois se retrataram em audiência judicial.
Durante as duas campanhas de 2018 e 2022 de Jair Bolsonaro à presidência, foi forte cabo eleitoral. Apoiou a invasão das sedes dos Três Poderes por radicais bolsonaristas no dia 8 de janeiro de 2023, chamando-a de “manifestação do povo”. Em entrevista ao Contexto Metrópoles na tarde desta quinta-feira, 21 de agosto, o pastor Silas Malafaia criticou o presidente da Câmara, o deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) por não ter pautado a discussão sobre a anistia dos réus do 8 de janeiro na Casa.
Entenda o caso
A Suprema Corte diz que Malafaia está sendo investigado por suposta participação em crimes de coação no curso do processo, obstrução de investigação envolvendo organização criminosa e abolição violenta do Estado Democrático de Direito.
A decisão de Moraes foi tomada depois que a Polícia Federal apresentou trocas de mensagens entre Malafaia e Jair Bolsonaro ocorridas após o anúncio de imposição pelos EUA de tarifas de 50% sobre produtos brasileiros.
Segundo a polícia, as mensagens sugerem que existe uma articulação para vincular o fim das sanções à concessão de anistia a pessoas envolvidas na invasão de Brasília em 8 de janeiro de 2023.
Acusações e Defesa
Em uma das mensagens, Malafaia afirma que “a próxima retaliação vai ser contra ministros do STF e suas famílias. Vão dobrar a aposta apoiando o ditador? DUVIDO!”
Segundo o STF, o pastor orienta Bolsonaro por meio de áudios e textos de celular a condicionar a suspensão das tarifas à anistia, sugerindo ainda a gravação de vídeos para “viralizar” a narrativa. Em um trecho, ele diz que “tem que pressionar o STF dizendo que se houver uma anistia ampla e total, a tarifa vai ser suspensa”.
A Procuradoria Geral da República deu um parecer recomendando as medidas contra Malafaia. Na sua manifestação, a PGR afirma que Malafaia atuou como “orientador e auxiliar” nas ações de coação e obstrução promovidas por Jair e Eduardo Bolsonaro com o objetivo de interferir no andamento da ação penal em que o ex-presidente é réu por tentativa de golpe de Estado.
Na sua decisão, o ministro Alexandre de Moraes disse que as condutas de Silas Malafaia em conjunto com Jair Bolsonaro caracterizam “claros e expressos atos executórios”, em especial dos crimes de coação no curso do processo e obstrução de investigação de infração penal envolvendo organização criminosa.
Moraes justificou a medida contra Malafaia dizendo que sua conduta influencia diretamente Bolsonaro, e inclui “postagem de conteúdos nas redes sociais previamente combinados”.
O ministro disse que há “fortes evidências” de que Malafaia “atua na construção de uma campanha criminosa orquestrada, destinada à criação, produção e divulgação de ataques a ministros do Supremo Tribunal Federal” e comparou essa atuação à de milícias digitais.
Próximos Passos da Investigação
A Polícia Federal terá 15 dias para apresentar um relatório parcial sobre o material apreendido de Silas Malafaia.
Na semana passada, o próprio Silas Malafaia divulgou que estava sendo investigado. Em vídeo publicado no X em 15 de agosto, Malafaia disse que ficou sabendo pela televisão da investigação.
Malafaia foi organizador do ato de apoio a Jair Bolsonaro no dia 3 de agosto, evento em que Bolsonaro apareceu em um vídeo transmitido por redes sociais de terceiros e que resultou na prisão domiciliar do ex-presidente no dia seguinte, 4 de agosto.