O ex-diretor financeiro do Itaú Unibanco Alexsandro Broedel Lopes está sendo acusado pelo banco de violar “gravemente o Código de Ética da instituição”. A instituição financeira diz ter encontrado “fortes indícios” de que a consultoria que fornecia pareceres ao banco tinha o executivo como sócio. Entre 2019 e 2024, informou o Itaú, foram identificadas 23 transferências bancárias somando R$ 4,86 milhões e que teriam sido direcionadas a Broedel.
Na última sexta-feira, o Itaú entrou com ação na Justiça em São Paulo para impedir que pagamentos ainda por vencer por pareceres contratados prescrevam, pedindo a reparação de danos de forma a reaver os valores suspeitos de desvio pelo ex-diretor financeiro.
As acusações ocorrem pouco após a demissão de Eduardo Tracanella, então diretor de Marketing, por mau uso do cartão corporativo. Os dois casos, porém, não estão ligados.
Broedel trabalhou no banco de maio de 2012 a julho deste ano, e como diretor financeiro desde 2021 e até a sua saída. Ele pediu para deixar a companhia para assumir um cargo no Santander, na Espanha. Mas acabou desligado do Itaú em setembro, após a conclusão das investigações, enquanto estava em período de carência e ligado administrativamente ao banco, mas licenciado.
“Broedel Lopes ainda atuou em grave conflito de interesses, transgredindo as regras internas e as leis aplicáveis, usando irregularmente as alçadas do seu cargo, e nos últimos cinco anos, aprovou contratações de pareceres e pagamentos no valor total de R$ 13.255.000 – sendo 10.455.000 entre 2022 e 2024 -, para empresa ligada ao fornecedor do qual era sócio”, diz posicionamento do Itaú.
A assessoria de imprensa do executivo destacou que as acusações são “infundadas e sem sentido”. E informou que Broedel sempre atuou de forma ética e transparente, dizendo que “o parecerista mencionado pelo Itaú já prestava serviços ao banco há décadas” e que “os serviços mencionados eram do conhecimento do Itaú e requeridos por diferentes áreas do banco”.
Afirma ainda que Broedel tomará as medidas judiciais cabíveis, questionando a conduta da instituição financeira: “Causa profunda estranheza que o Itaú levante a suspeita sobre supostas condutas impróprias somente depois de Broedel ter apresentado a renúncia aos cargos no banco para assumir posição global em um dos principais concorrentes, cumprindo o período de quarentena definido”.
De acordo com a inicial da ação, o alerta sobre irregularidades na atuação de Broedel foi acionado quando o banco soube que o ex-diretor prestava consultorias quando estava em quarentena para transição para outra instituição. “Tal informação gerou alerta de atuação em desconformidade com o Código de Ética”, puxando as apurações internas.
Nessas investigações, descobriu-se que Broedel era sócio de Eliseu Martins – uma das maiores referências em contabilidade no país – desde 2012, numa sociedade que “nunca foi declarada” aos controles internos, afirma o banco, apesar de Martins ser prestador de serviços do Itaú. Tampouco a atividade externa de consultor de Broedel teria sido comunicada ao Itaú.
Tanto Martins quanto Broedel foram diretores da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), o órgão regulador do mercado de capitais, o que mobilizou as conversas entre executivos de mercado ontem, segundo fontes que preferem não se identificar.
O Itaú afirma que desde janeiro de 2019, a Care, sociedade entre Martins e um de seus filhos, e a Evam, que tem como sócios dois filhos de Martins, fizeram 56 transferências em benefício de Broedel e da Broedel Consultores, “das quais 23 guardam estrita correspondência com pagamentos realizados pelo Requerente (Itaú) à Care”. Essas transferências permitem inferir, segundo a ação, participação de 40% de Broedel nos pagamentos realizados pelo Itaú à Care.
Tanto o Banco Central quanto a CVM já foram informados do caso pelo Itaú, que afirma tratar-se de situação isolada, sem impacto nas demonstrações financeiras, como certificado pelo Comitê de Auditoria e pela consultoria externa e independente PwC.
Eliseu Martins, em nota, disse estar estarrecido com as acusações e que “protesta, de forma veemente, contra as declarações e decisões do Itaú”. “Tenho uma vida profissional e acadêmica com conduta que pode ser verificada com centenas ou milhares de pessoas”, sublinhando que presta serviços ao Itaú há quase 50 anos. Ele informa que Broedel era seu colega como professor da pós-graduação da FEA/USP há muitos anos e que sempre tiveram ligações acadêmicas e profissionais.
“Há vários materiais suporte das consultorias que foram feitos sem formalidade, algo de que me arrependo agora, dada a má-fé da interpretação dada pelo banco. Trabalho com aproximadamente seis outros colegas e temos inclusive a condição de só opinarmos verbalmente ou via parecer; assim, há opiniões que não geram parecer e não aparecem em qualquer documento. Mas são serviços efetivamente prestados”, acrescentou.
Segundo Martins, eles sempre fizeram pareceres para terceiros, “às vezes assinando em conjunto e às vezes com ele sempre ajudando tecnicamente, como com outros colegas, com o faturamento por uma única empresa”. E contesta a inclusão dos filhos na ação.
Na ação impetrada, o Itaú diz que foram contratados 40 pareceres, sendo 36 deles recebidos por Broedel. Do total, 20 foram localizados e quatro, pagos antecipadamente, não foram realizados. Martins afirma que “houve pagamentos antecipados”, “tanto que formalmente declarei a necessidade de devolução dos valores relativos aos quatro ainda não emitidos, dado que não irei mais prestar qualquer tipo de serviço ao Itaú”. E diz que o Itaú talvez interprete de forma incorreta pela “perda de tão brilhante profissional”.
Caio Machado, sócio do Chediak e Cristofaro Advogados, avalia que o posicionamento do Itaú está ancorado no aspecto reputacional:
– Entendo ser mais uma questão de reputação, para mostrar que os controles internos estão funcionando, do que risco material para o banco.
Já Alexandre Di Miceli, especialista em governança e fundador da Virtuous Company Educação Executiva, entende que eventos relacionados a duas lideranças devem ser observados:
– É preciso atenção com a justificativa da “maçã podre”, ética é consequência do que uma organização cria e opera no dia a dia. Após a saída do executivo, o Itaú rastreou e identificou o que era feito.
Texto de: Cássia Almeida e Glauce Cavalcanti (AG)