O risco de se criar “universos” para franquias que dão certo embute uma série de questões para produtores e realizadores. O primeiro é a autoralidade, já que parte do público acostumado com aquela saga quer ver mais do mesmo, o que limita a criatividade. Mas essas “sequências” podem acabar cansando quem busca coisas novas, mesmo em filmes de ação no estilo “exército de um homem só”. Ou de uma mulher só, como é o caso de “Bailarina” (2025), “spin-off” que se passa no mesmo universo dos sucessos de “John Wick” e que não faz questão de esconder a inspiração/sequência lógica da série de ação de Keanu Reeves.
O novo filme do universo Wickeriano tem no roteiro o elo mais fraco. Não que os antecessores sejam primores nesse quesito. No caso, apesar de trazer muito da mitologia de Wick, como o Hotel Continental, os clãs assassinos e as recompensas milionárias, a história da bailarina se apoia na batida premissa da vingança inconsequente, que antecessores exploraram muito melhor e com mais substância. Aqui temos Eve Macarro, que vê o pai sendo morto por um grupo de assassinos e promete vingança, enquanto treina com a organização feminina chamada Ruska Roma, já vista anteriormente.
Se tem diálogos e motivações frágeis, pelo menos o filme dirigido por Len Wiseman (que “cometeu” a péssima saga “Anjos da Noite”) se apoia competentemente no carisma do seu elenco e nas ótimas e inventivas sequências de ação, principalmente do meio para o fim, fazendo o público esquecer o longo e aborrecido primeiro ato.
É quando o filme ganha impulso e se torna frenético, sem perder o foco e conseguindo dar ritmo às sequências sanguinolentas a partir dali, sempre usando novos artifícios para surpreender o público. Há uma sequência envolvendo neve e lança-chamas que se tornou uma das melhores de toda a franquia.
O trabalho dos atores funciona muito também, seja pelos que já estão acostumados aos papéis, como os veteranos Anjelica Huston e Ian Mcshane, seja por Ana de Armas, que tem muito carisma e disposição para abraçar o papel em outras produções. E Keanu Reeves é o de sempre: a sisudez do personagem caiu como uma luva para ele, em uma jogada de sorte poucas vezes vista na indústria.
É a fórmula que vem dando certo: se apoiar no absurdo cada vez maior, fazendo o público esquecer a fragilidade temática, incluindo a falta de qualquer elemento opositor a todo aquele esquema absurdo de economia girando em torno de mortes. Mesmo assim, quando Reeves e de Armas aparecem em tela com tiro, porrada e bomba, o que resta é se ajeitar na poltrona e curtir as experiências absurdas que vêm a partir daí.
Confira o trailer de Bailarina: