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Aline Kominsky-Crumb: um legado a ser descoberto

Autorretrato de Aline  Kominsky-Crumb, desenhista falecida na última semana aos 74 anos.
Autorretrato de Aline Kominsky-Crumb, desenhista falecida na última semana aos 74 anos.

Texto: Tylon Maués*

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Há dois anos, analisando o que tinha sido sua carreira, Aline Kominsky-Crumb foi direta: “Eu era uma pintora com graduação em Artes Visuais, e escolhi fazer coisas que pudessem ser lidas no banheiro”. Artista plástica e conhecida pelos trabalhos em quadrinho, Aline faleceu semana passada em decorrência de um câncer no pâncreas, aos 74 anos. Ela deixou o marido Robert, 79, e a filha Sophie, 41. Robert, parceiro dos trabalhos mais destacados no mercado, é Robert Crumb, o maior artista underground dos Estados Unidos, um dos papas das HQs mundiais.

Essa relação desnivelada eclipsou boa parte do trabalho de Aline, que tem vida própria. Quando eles se casaram, em 1978, ela era uma artista ainda buscando seu espaço, mas com um trabalho já incensado pela crítica. Crumb já era Crumb, milionário e sem preocupações para manter seus gostos por velhos vinis de jazz e bluegrass. A parceria de vida passou para o lado profissional.

 

 No começo dos anos 1980, o casal ampliou suas contribuições para a revista “Weirdo”, uma das várias bíblias da contracultura norte-americana – onde Aline também atuou como editora – e publicaram uma série de tiras chamada “Aline and Bob’s Dirty Laundry”, que no Brasil ganhou o título de “Desenhados Um Para o Outro”. Uma coletânea da obra foi publicada pela Companhia das Letras. O outro trabalho lançado por essas bandas foi “Essa Brunch é um Amor”, pela Conrad, em 2011, que reunia várias publicações de 1972 até 2005.

Aline Kominsky-Crumb e Robert Crumb: parceria na vida e no trabalho.

Além de duas coletâneas, Aline teve alguns desenhos publicados na revista “Piauí”. O citado desnível entre o trabalho dela e do marido fica explícito na quantidade de trabalho que Crumb já teve publicado no Brasil, com livros, revistas e graphic novels que abraçam quase toda sua obra.

Aline, ao contrário do marido, nunca foi campeã de vendas, mas tem um valor histórico que merece mais atenção dos editores nacionais. Além de uma temática quase sempre autobiográfica – uma semelhança a outro grande parceiro de Crumb, o escritor Harvey Pekar, falecido em 2010 -, muitas vezes descambou para uma temática fortemente sexual, explícita ou apenas atrevida. Sempre provocadora, pioneira e inquieta. Ela mesma sempre foi sua personagem preferida, sapeca e com um carisma que transbordava pelos cabelos ruivos e revoltos.