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A "trilogia das mães" de Dario Argento une o belo e o grotesco

Dario Argento é conhecido por suas tramas de mistério e suspense, com boas doses de sangue, que jorram de jugulares mutiladas por um assassino de luvas pretas. São os ‘giallos’, que fizeram a sua fama e o tornaram um dos mestres do cinema de horror. Mas o cineasta italiano também emprestou o seu talento para narrativas sobrenaturais. Aliás, minto. Narrativa é uma palavra que não cabe nesse caso. O que ele fez, com extrema maestria, foi costurar cenas que mesclam beleza e grotesco, sem uma lógica discernível. Em seus filmes, deu vida a pesadelos e os transformou em obras de arte.

Para alcançar esse resultado, Argento minimizou a importância do conteúdo (leia-se roteiro) e se debruçou sobre a forma e o estilo. Fez um cinema sensorial, uma verdadeira experiência estética, onde as cores e os sons são elementos fundamentais para a compreensão e o desenvolvimento da história. Assim, ele consegue que imagens aterradoras fiquem gravadas durante um bom tempo na retina. É como se aqueles pesadelos bem reais, que tentamos trancafiar em algum lugar remoto do nosso cérebro para que não volte a nos assombrar de noite, explodissem em fúria, em plena luz do dia, negando-se a ficar preso na escuridão.

A Mansão do Inferno, de 1980, o segundo filme da trilogia

A obra de Thomas De Quincey, portanto, se adequou perfeitamente a esse intento. O escritor inglês do século XIX imaginou o mal encarnado em três mulheres, três bruxas responsáveis por toda dor e sofrimento da humanidade. São elas: a Mater Suspiriorum, a ‘Nossa Senhora dos Suspiros’; a Mater Tenebrarum, a ‘Nossa Senhora da Escuridão’; e a Mater Lacrimarum, a ‘Nossa Senhora das Lágrimas’. Tais entidades inspiraram Argento em três filmes, sendo que dois deles causam um misto de fascinação e repugnância por sua excepcional qualidade, ‘Suspiria’ e ‘A Mansão do Inferno’ (ou apenas ‘Inferno’).

Os filmes são de 1977 e 1980, respectivamente. Naquela época, Argento estava no seu auge criativo. A violência é explícita, mas estranhamente bela e recheada de significado. As ações dos personagens nunca condizem com o racional. É a emoção e o instinto que falam mais alto. Afinal, quem, em sã consciência, mergulharia em um buraco no porão de um prédio para resgatar uma chave? É uma cena surreal, digna de um terror noturno. Ou então quando, ao fugir do ‘nada’, talvez do próprio medo, a vítima encontra o seu destino fatal em uma prisão de arame farpado.

O retorno da maldição: a mãe das lágrimas, filme que fecha a trilogia do mestre italiano

Argento fechou os seus contos de fada (bruxas) bizarros com ‘O retorno da maldição: a mãe das lágrimas’, que veio apenas em 2007, quando o cineasta havia perdido um pouco do vigor e da vontade de ousar, de criar. Desse modo, ele abriu mão de parte das experimentações e realizou um filme ‘quase normal’, quebrando o mórbido encanto dos anteriores e caindo em clichês do gênero – embora a brutalidade ainda seja uma marca e nos forneça alguns momentos perturbadores e imagens delirantes, bem ao seu estilo. Só isso já basta para recomendá-lo fortemente, pois o insere na grife ‘Argento’. E ver um mestre em ação é sempre recompensador.

ONDE ASSISTIR:

  • Suspiria: Amazon Prime Video, Darkflix e Oldflix;
  • A mansão do inferno (Inferno): Looke, Darkflix e NetMovies;
  • O retorno da maldição: a mãe das lágrimas: não disponível em streaming.

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