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Zecas Coletivo de Teatro estreia peça inspirada em história real da periferia de Belém

"O fantástico mundo de Talco" utiliza a linguagem do circo e ludicidades para expor problemas sociais FOTO: DIVULGAÇÃO
"O fantástico mundo de Talco" utiliza a linguagem do circo e ludicidades para expor problemas sociais FOTO: DIVULGAÇÃO
TEXTO: WAL SARGES

Inspirada em uma história real, a montagem teatral “O fantástico mundo de Talco” retrata um menino da periferia que perdeu a infância para a criminalidade. Talco é o nome do personagem que, nesta narrativa, encontra nas múltiplas artes sua salvação e um recomeço de vida. O espetáculo estreia hoje, 23, e será apresentado também nesta sexta-feira, 24, às 19h, no Teatro Experimental Waldemar Henrique, em Belém. Depois parte para Soure, no Marajó, com apresentações nos dias 3 e 4 de março, às 18h, em local ainda a ser divulgado.

Contemplado pelo Prêmio Preamar de Arte e Cultura, da Secretaria de Estado de Cultura do Pará (Secult-PA), a peça conta com a direção de Assucena Pereira, do grupo paraense Zecas Coletivo de Teatro. “Foi demais fazer a direção deste espetáculo. Acredito muito na direção com processo colaborativo, em que o artista me traz ideias, e ver o que funciona e o que não funciona”, diz a diretora.

RELATO INSPIRADOR

A peça parte de uma história real que aconteceu entre 2004 e 2005, com uma criança da Matinha, periferia de Belém, e é baseada nos relatos da professora Keila Brasil, que teve contato com o menino em um espaço para crianças e adolescentes em conflito com a lei. “O Talco retrata a história desse menino da periferia que começou a praticar assaltos para tirar da cadeia a mãe que foi presa injustamente por tráfico de drogas. Há uma perda da infância para a criminalidade porque ele não tem saída e nem oportunidade. Então, desde muito cedo teve que se virar sozinho, contando apenas com o amigo Maik”, descreve Assucena Pereira.

Depois de ouvir o relato, a atriz e professora da Universidade Federal do Pará (UFPA) Gisele Guedes começou a escrever a dramaturgia da peça, mas ela faleceu em 2019. Assucena Pereira lembra que as produções do Zecas Coletivo de Teatro eram dirigidas por Gisele e que depois de sua partida, o projeto foi engavetado. “A gente queria manter a encenação que ela tinha começado e fazer jus a ela, porque a Gi era uma artista incrível. Quando a gente leu uma parte do texto dela, foi encantador. Começamos a montar algumas cenas e a Gisele faleceu. Ela é quem movimentava o grupo e dava gás para gente fazer as produções, então engavetamos a ideia e ficamos produzindo outras coisas”, relembra.

Até que “O fantástico mundo de Talco” foi inscrito no Edital Preamar e aprovado. Foi então que começaram a escrever as cenas que restavam. “O Coletivo de Teatro tem oito anos de existência em Belém, com pessoas daqui e do Marajó. Então, o espetáculo será apresentado aqui e e em Soure”, ressalta Assucena Pereira.

TRABALHO DE CORPO É INTENSO EM CENA

A diretora do espetáculo conta que o protagonista passa por uma bela reviravolta a partir da arte. “Tem um momento que o Talco encontra a arte e se salva. É quando passa a fazer aulas de circo dentro da cadeia. Ele fica encantado com tudo o que aprende com o circo, o rap e várias linguagens artísticas. Passa a criar uma relação muito forte com a professora dele e toda vez quer ser preso para fazer as aulas”, detalha Assucena Pereira.

No palco, sete atores em cena se dividem entre artes circenses, como malabares e acrobacias, além do canto, do rap e da percussão. Para Miller Alcântara, que atua no teatro há nove anos, encenar esta dramaturgia traz recordações e reflexões.

“A minha construção do Talco se dá de uma forma um pouco mais cuidadosa, porque tive contato com a Gisele, que era da minha turma de licenciatura em Teatro. Ela acreditava na força e na potência do teatro, então deixou também essa semente plantada com a história do Talco. E o meu cuidado era para que eu não criasse alguém que fosse distante da história dessa criança. Peguei a história a partir do que a Gisele deixou escrito e ouvi os áudios que a professora Keila Brasil mandou falando dessa relação dela com o Talco e como ele era”, lembra-se o ator.

A preparação de corpo foi bastante exigente, conta Miller Alcântara. “Tem sido uma preparação bem intensa porque a gente trabalha um pouco do circo, que exige bastante do corpo. Outro ponto a destacar é que é uma história daqui, e para dar uma suavizada, a gente quis trazer uma narrativa um pouco diferenciada, através da ludicidade, dos jogos, de brincadeiras, para apresentar esse contato da criança com a importância do ato de brincar”, aponta ele.

HISTÓRIA TAMBÉM TROUXE REFLEXÕES AO ELENCO

O ator ressalta algumas reflexões que teve ao viver este personagem. “A gente vive numa sociedade muito cruel com muitas crianças, principalmente as que moram nas periferias e o Talco é uma criança negra da periferia. Enquanto pessoa da periferia, também conheço muitas histórias que se assemelham à do Talco. Penso que o público precisa ouvir e entender o quão prejudicial para uma criança é esse contexto, em que o menino só queria ter a mãe perto, o quanto é prejudicial a injustiça com pessoas pretas de periferia, que às vezes são vistas como alvo apenas por sua cor de pele”, analisa.

Assucena completa: “O espetáculo se torna muito representativo por conta dessa dramaturgia que é real, que mostra a perda da infância para o amadurecimento precoce. Tem uma importância social e política muito forte, de denunciar essas violências e vulnerabilidades sociais, propostas que podem trazer ainda maior identificação por parte do público.”

ASSISTA

“O fantástico mundo de Talco” – Zecas Coletivo de Teatro

Quando: Hoje e amanhã, às 19h

Onde: Teatro Experimental Waldemar Henrique (Praça da República – Campina)

Quanto: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia-entrada e antecipados)

Quando: 3 e 4 de março

Onde: Soure (local a ser divulgado)

Classificação indicativa: 14 anos