Texto: Aline Rodrigues
Workshops, masterclasses, ateliês livres, exposições, feira de quadrinhos, e o famoso “Beco dos Artistas” – espaço destinado à apresentação, trocas e comercialização de quadrinhos, ilustrações, tiras e quaisquer outros formatos de publicações e impressos de produção autoral independentes ou financiada -, estão na programação da 10ª Semana do Quadrinho Nacional, no prédio do Centur/Fundação Cultural do Pará, que começa hoje, 30, a partir das 10h, e segue até o dia 2 de fevereiro.
O evento é uma realização da Fundação Cultural do Pará (FCP), por meio da Biblioteca Pública Arthur Vianna, e visa celebrar o Dia Nacional das Histórias em Quadrinho.
“A programação foi pensada de modo a atingir diversos tipos de público e diversos níveis de interesse desses públicos. Ou seja, é uma programação voltada tanto para quem não conhece nada, tem vontade de conhecer ou tem curiosidade sobre a produção de quadrinhos de modo geral quanto para pessoas que já são profissionais da área”, explica Jorge Ramos, técnico em Gestão Cultural da FCP.
A proposta do evento é oferecer ao público conhecimento, informação e entretenimento, além de estímulo à leitura e à produção de histórias em quadrinhos, além de dar protagonismo e valorizar as HQs produzidas no Brasil, em especial as produzidas no mercado local.
“A programação é voltada para todas as idades. Há bate-papos e palestras voltados para o público mais adulto, juvenil e iniciados, que já trabalham e desenham. Os Desafios são voltados para um público mais infantil e juvenil”, explica Jorge, referindo aos desafios de desenho, com oficinas livres que serão ministradas todos os dias, de 15h às 17h, por Gabriel Cardoso.
“Para além disso, contamos com a Feira dos Quadrinhos que acontece do dia 30 até o dia 1º e o Beco dos Artistas, que acontece no dia 02, à tarde [15h às 21h], que é uma feira de produtores autorais”, completa o técnico.
O evento vai contar ainda com lançamentos de publicações recentes, com sessão de autógrafos dos autores Gyselle Kowalsky, Thalyne Crystyna (Álbum de Quadrinhos – Paina), Mandy Modesto (Assuntos Inacabados) e Arthur Braga (Tiras do Beybinho).
OLHO NA GENTE
Presença constante nas feiras do quadrinho paraense, desde a primeira edição, o ilustrador, quadrinhista e animador Otoniel Oliveira ministra este ano, desta terça até o dia 1º de fevereiro, a masterclass “História em Quadrinhos: A Narrativa e a Genealogia do Autor”. Na opinião dele, não existe mercado sem produção, e não existe produção sem condições para os autores. Logo, o mercado local, assim como qualquer outro, precisa de estímulo, de política pública de incentivo.
“Precisamos de dois eixos: dar condição para os autores trabalharem, com financiamento, com editais e prêmios, e dar condição de distribuição abrangente e justa para o público ter acesso e comprar. Pontos de venda, eventos e feiras. Um crítico liberal incauto pode objetar, mas isso aconteceu nos EUA, na França e no Japão, por exemplo. Precisamos parar de achar que quadrinhos é só o que vem de fora, gente de roupa colorida e apertada. Isso é colonização cultural”, diz.
Programação inclui atividades para todas as idades FOTO: DIVULGAÇÃO
Evento fortalece quadrinhistas locais
“O Dia do Quadrinho Nacional é para reafirmarmos que temos que tomar as rédeas da produção cultural que consumimos e, na outra ponta, consumirmos quadrinhos nacionais feitos por autores nacionais”, defende Otoniel Oliveira, cuja masterclass foca no papel e na responsabilidade de criação que um autor de quadrinhos tem ao escolher o que narra e o que desenha.
“Nesse mundo assolado por uma ideia de arte como produto industrializado, em que AI [inteligência artificial] surge como mais um modelo de exploração e precarização do trabalho, os quadrinhos são uma mídia humana, demasiadamente humana, de criação de histórias”, acrescenta Otoniel Oliveira, roteirista e desenhista de quadrinhos como a graphic novel “Pretérito Mais Que Perfeito” (2015), por edição de autor.
“No dia do Quadrinho Nacional, a gente vai discutir o papel do autor, o quadrinhista nacional, nessa realidade. A data não é pra falar de Batman ou Goku, é para falar do que produzimos aqui e sobre a realidade daqui”, acrescentou ele.
Para esta décima edição da sua Semana dos Quadrinhos, a FCP contou com a parceria do Coletivo BRT, que irá organizar as atividades e ficou responsável por criar a marca oficial utilizada no evento. O Coletivo BRT propõe discutir a urbanidade caótica da Amazônia através das histórias em quadrinhos, com publicações impressas, tiras e charges.
Os workshops serão realizados de 10h às 12h, no estande da Gibiteca, com os temas: “Elementos de composição e arte-final”; “Teoria das cores nos quadrinhos”; “Escrita criativa e storytelling para quadrinhos”; e “Diagramação e formatos: como montar uma revista”.
O dia 30 de janeiro de 1869 foi marcado pela primeira história em quadrinhos lançada no Brasil. Em Belém, o grupo de quadrinistas Ponto de Fuga, fez o primeiro evento de comemoração da data em 1992, na Casa da Linguagem, integrante da Fundação Cultural do Pará. Em 2015, o evento se tornou regular na programação da FCP.
Diversos temas foram abordados desde então, como questões relacionadas à produção, mercado e linguagem, até pesquisas acadêmicas sobre quadrinhos, além das atualidades sociais, como a representatividade negra e feminina nas HQs.
Para Andrei Miralha, artista multimídia, animador e quadrinhista, a comemoração é importante por dar destaque ao quadrinho produzido no Brasil e, no caso da Semana do Quadrinho Nacional da FCP, ao quadrinho e aos quadrinistas paraenses.
“Pela primeira vez temos um evento de quadrinhos consolidado. Antes disso, comemoramos, desde os tempos do Ponto de Fuga, o Dia do Quadrinho Nacional desde 1991 na Casa da Linguagem e no Centur. Porém, essas comemorações aconteciam num ano de uma forma, em outro ano não acontecia, voltava no ano seguinte com outras pessoas ou instituição organizando e assim não conseguia se manter de forma consistente”.
“Estive na organização dessa Semana do Quadrinho Nacional-FCP desde a primeira edição, em 2015, junto com a equipe da Biblioteca Pública Arthur Vianna. Ao longo desse anos, conseguimos criar um formato de evento que foi crescendo com a participação de artistas e coletivos de quadrinhos. Ter um evento como esse na agenda de uma instituição pública de cultura é uma conquista importante para quem produz e se interessa por quadrinhos, principalmente por promover o encontro entre leitores, artistas iniciantes e profissionais da área”, completa Andrei.
Ainda segundo Miralha, o mercado local é bem diverso, com vários desenhistas muito talentosos que trabalham profissionalmente para o mercado americano de quadrinhos e artistas que desenvolvem seu trabalho autoral e publicam por meio de financiamento coletivo ou autopublicação, e comercializam suas obras em feiras e eventos de quadrinho e ilustração, como no “Beco dos Artistas”.
“Fora isso, os coletivos que surgem a cada ano têm um papel importante para artistas iniciantes ao proporcionar o compartilhamento de experiências e engajamento para produzir quadrinhos”, diz ele, destacando ainda, que atualmente, temos mais mulheres envolvidas na produção de quadrinhos e com uma presença muito engajada na área.
“Na época do Ponto de Fuga, lá pelos anos 1990, o grupo era formado apenas por homens e não conhecíamos nenhuma mulher que produzisse quadrinhos naquele período. Isso, sem dúvida, é uma grande evolução nesse cenário. Esse ano, por exemplo, todos os bate-papos da Semana do Quadrinho Nacional-FCP serão com autoras mulheres, cada uma com uma característica de trabalho diferente da outra. Vale muito a pena conferir o que vem sendo produzido por elas. O evento é uma ótima oportunidade de ver o que vem sendo produzido por aqui, além de poder adquirir essas obras, conhecer os autores e autoras locais”, indica Andrei Miralha.
Icoaraci também festeja a data
Outra programação destaca as histórias em quadrinhos nesta terça-feira, 30, em Belém, em alusão ao Dia Nacional das Histórias em Quadrinhos. A Biblioteca Pública Municipal Avertano Rocha, em Icoaraci, realizará, ao longo do dia, dinâmicas e oficinas, além de exposição das obras e bate-papo com o público. Os ilustradores e quadrinistas Anne Reis e Allan Fernandez serão os mediadores de uma roda de conversa sobre HQs produzidas na Amazônia, com destaque às obras de artistas de Icoaraci.
“Será para dar visibilidade aos artistas e quadrinistas da região metropolitana de Belém, com foco nos desenhistas do distrito de Icoaraci. Além disso, será um momento de acesso ao acervo de quadrinhos nacionais que a biblioteca disponibiliza para a comunidade”, diz a diretora da biblioteca, Gorette Figueiredo. Ao todo, 13 artistas participam do evento, contando sobre seus quadrinhos, experiências e projetos futuros. O encontro ocorrerá em dois momentos, pela manhã, às 10h, e à tarde, às 15h.
“O que realmente esperamos neste evento é reaproximar os artistas e leitores dos quadrinhos e trazer de volta as rodas de conversas sobre quadrinhos e oficinas de HQ para nossa comunidade. Em Icoaraci, há muitos talentos que precisam ser descobertos e ter mais visibilidade. Além disso, é uma forma de levar as pessoas para dentro da biblioteca”, declara Anne Reis.
Estão na programação os artistas Carlos Paul, Alex Barros, Roberto Mendes, Alexandre Nascimento, André Luis, Robson Marone, Volney Nazareno, Luis Cláudio, Anne Reis, Fernando Carvalho, Alan Yango, Fábio Jansen e Allan Fernandez.
*com assessoria da Fumbel
ESCOLHA
10ª Semana do Quadrinho Nacional – FCP
Quando: Hoje, 30 de janeiro, a 2 de fevereiro, a partir das 10h.
Onde: Fundação Cultural do Pará/Centur (Av. Gentil Bittencourt, 650 – Nazaré)
Quanto: Entrada gratuita.
Dia do Quadrinho Nacional
Quando: Hoje, 30, das 9h às 17h (roda de conversa às 10h e 15h, e oficinas às 10h e 16h).
Onde: Biblioteca Pública Avertano Rocha ( Rua Siqueira Mendes, s/n – Icoaraci).
Quanto: Entrada gratuita.