Aline Rodrigues
Na noite do dia 29 de março, Sexta-feira Santa, às 18h30, o bairro de Canudos, em Belém, vai reviver uma tradição que teve início em 1983: a encenação da Paixão de Cristo da Igreja de Queluz. Com o tema “Paixão de Belém e Justiça Social”, a encenação completa 41 anos e está a todo vapor, com ensaio e toda equipe montada trabalhando para fazer o espetáculo acontecer mais um ano.
O tema busca dialogar com a Campanha da Fraternidade lançada pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil-CNBB este ano – Fraternidade e Amizade Social. Propõe cenas e reflexões sobre o papel das mulheres na busca pela amizade e justiça social. Pelo segundo ano, contará com tradução em Libras.
“Este ano, como os outros, a gente está preparando todo o espetáculo, como toda a história, novamente para rua. O ano passado a gente retornou e já começamos os ensaios a partir de janeiro. Estamos agora com bastante intensidade, fazendo as cenas de rua, as cenas que acontecem dentro da quadra da paróquia. Nossos ensaios estão acontecendo em todas as terças, quintas e domingos. Já estamos com as equipes de produção, figurino, músico, narradores, o elenco todo fazendo, desde janeiro, as oficinas e agora fazendo a montagem do espetáculo, por meio dos ensaios”, falou Aluízio Freitas, diretor geral do espetáculo, realizado pelo grupo de teatro Aldeato.
Na Sexta-Feira Santa, acontece a apresentação principal. Com duração de cerca de 45 minutos, as primeiras cenas vão desde a entrada de Jesus em Jerusalém até a condenação por Pilatos, e acontecem na quadra coberta da Paróquia de São José de Queluz. Em seguida, a encenação vai para a rua, percorrendo cinco quarteirões, onde acontecem as cenas da Via Crucis, que duram cerca de uma hora e meia. Mais à frente, na rua Dr. Américo Santa Rosa, próximo ao barracão de ensaios, acontecem as cenas da morte e ressurreição, com os 45 minutos finais da apresentação.
São cerca de 100 pessoas no elenco, mais setenta na equipe de apoio, que inclui produção e equipe técnica. Mas, como nos anos anteriores, a organização precisa de ajuda para realizar a encenação.
“Infelizmente a gente está com as mesmas dificuldades de todo ano. Este ano não tivemos ainda o apoio do poder público. Participamos do Edital Paulo Gustavo, nossa pontuação foi bem alta e não conseguimos entrar porque praticamente cem por cento do resultado do edital foi para cotistas, e a gente não foi contemplado”, disse Aluízio.
O grupo está realizando promoções e campanhas de arrecadação para pagar despesas básicas, mas o valor arrecadado junto à comunidade, por volta de R$ 7 mil, ainda é insuficiente para bancar o total de gastos com espetáculo, que gira em torno de R$ 20 mil. Por isso, a paróquia tem pedido contribuições de quem queira ajudar na realização do espetáculo.
Mesmo com as dificuldades, a expectativa dos encenadores é ver o público comparecer para manter a tradição do bairro com um lindo espetáculo. A estimativa dos realizadores é de que em torno de 5 a 10 mil pessoas assistam à Paixão em Canudos.
“O povo está esperando o nosso espetáculo, se envolvendo, com toda dificuldade, embaixo de sol e chuva, um elenco jovem, adolescente, temos também adultos, pessoas que realmente deixam suas famílias e se juntam a nós. Os moradores estão nos apoiando de novo, com promoções, com rifa, com bingo, vendendo lanche, vendendo tudo, na tentativa de arcar com o contrato de palco, luz, som, trio, a manutenção de figurinos, de adereços, estamos na luta”, contou Aluízio.
“É muito gratificante mesmo. Para mim, é como se me renovasse a cada ensaio, a cada apresentação. Acredito que esse sentimento seja também de muitos que assistem e acompanham o projeto da Paixão”, acrescentou o diretor.
Celeiro de talentos para o teatro
Já no bairro da Condor, a tradição da encenação completa 56 anos em 2024, sendo a Paixão de Cristo mais antiga de Belém e a maior atividade que a juventude da Paróquia de São Judas Tadeu. “É realizada pela Juventude com a ajuda de muitos ex-participantes, comércios do bairro e algumas vezes com patrocínio, que às vezes aparece. Este ano, infelizmente estamos em busca ainda. Mas temos um figurino completo, arrumado, de personagens, a gente ensaia de segunda a sexta”, falou Flávio Lima, coordenador geral da apresentação.
O espetáculo conta, em média, com cinquenta pessoas. O palco principal da encenação sempre foi a Praça Princesa Isabel, mas após a pandemia de covid-19, o grupo não voltou a encenar no espaço, embora planeje voltar a ocupar a praça em 2025 e levar o teatro para toda a comunidade do entorno.
“Nestes dias 26 e 27 de março, encenamos no Salão Paroquial, e na Sexta-Feira Santa [dia 29], a Paixão sai para rua e finaliza no estacionamento da igreja, um local organizado justamente para as atividades maiores da paróquia, que apesar de ser grande não comporta todo esse pessoal da Sexta-Feira Santa. É muita gente que vem para assistir”, disse Flávio.
Segundo o coordenador, um ponto positivo do trabalho é que da encenação saem grandes atores, e a apresentação acaba sendo uma grande escola. Tanto que a paróquia tem uma parceria com o grupo de teatro Catarse, que se formou a partir da apresentação.
“Hoje eles se apresentam no Theatro da Paz e alguns outros locais. A gente tem uma referência tão boa que não vêm pessoas só da comunidade, não é fechada só para paróquia, não tem uma idade mínima para participar, de seis anos para frente, pode vir participar. As portas são abertas para criança, adolescente, jovens, adultos, idosos, quem quiser”, contou Flávio.
Os papéis da peça também são considerados pela organização um outro diferencial: são disputados, de tão forte que é o trabalho e de tanta aceitação que tem dentro da igreja, da comunidade e outras igrejas no entorno do bairro.
“Já existiram situações – este ano não, mas acontece com frequência – até de pessoas de outras religiões aderirem à proposta e participarem da Paixão de Cristo. Isso já aconteceu bastante”, pontuou Flávio.
EVANGELIZAÇÃO
No conjunto Júlia Seffer, o Grupo Teatral Shalon surgiu a partir da encenação da Via Sacra, em 1996, passando pelas ruas da comunidade com jovens cobertos por lençóis. O grupo pertence desde o seu início à Paróquia do Sagrado Coração de Jesus, quando ainda era comunidade, e muitos dos jovens fundadores permanecem no grupo até hoje, porém o grupo vem se renovando. Este ano, a apresentação completa 29 anos.
“Quem vai contar a Paixão de Cristo será Santa Margarida Maria Alacoque, para um jovem rapaz. A devoção ao Sagrado Coração começou com ela. Nossa peça tem apresentadores que estão entre as cenas. Esse ano a paróquia completa 15 anos de criação, então vamos homenagear nosso padroeiro”, falou Breno Pinheiro, coordenador geral.
A encenação da Paixão de Cristo durante a Semana Santa, segundo ele, é um momento comovente para qualquer pessoa, atrai o público e evangeliza por causa da verdade dos fatos: Cristo, o inocente, o Cordeiro de Deus, entregou sua vida por todos nós.
“Que possamos evangelizar utilizado o Evangelho vivo. A história de Jesus precisa ser mostrada e divulgada cada vez mais. Recebemos pessoas novas para assistir ao espetáculo todos os anos e costumam voltar”, finalizou Breno.
Trindade Jovem leva Paixão de Cristo para o palco
Nos próximos sábado e domingo, dias 23 e 24 de março, às 19h30, no Teatro Universitário Cláudio Barradas, a Trindade Jovem, grupo de jovens da Paróquia da Santíssima Trindade, apresenta a segunda edição do espetáculo “A Paixão de Cristo”, uma emocionante jornada que retrata os últimos momentos da vida de Jesus Cristo.
“Esse ano apresentaremos, pela 2ª vez a Paixão de Cristo. A primeira foi em 2019, mas historicamente temos mais de 10 anos de serviço através da arte, e outros dois espetáculos que são tradição: ‘Um anjo veio me contar ‘, musical de Natal, e o ‘Totus Tuus’, musical dedicado à Nossa Senhora”, falou Alessandra Melo, que assina a direção da encenação junto com Karine Lima.
O espetáculo vai retratar as últimas doze horas de Cristo, da agonia no Jardim das Oliveiras até a sua crucificação. As cenas, normalmente retratadas pelos grupos de teatro das paróquias nas ruas de Belém, ganha esta versão no palco, com o mesmo impacto que a história, por si só, carrega.
“Vamos nos ater fielmente às passagens bíblicas e ao drama do sacrifício de Jesus, mas, de novidades, estamos trabalhando intensamente com as expressões para transmitir a dor desse momento da vida de Cristo. O espetáculo retrata desde a Santa Ceia até a Ressurreição”, disse Alessandra.
Segundo a diretora, os preparativos para a apresentação desse ano estão intensos, com ensaios todos os dias – de domingo a domingo, onde o elenco está dedicado, e com pessoas talentosíssimas.
“A equipe de figurino também caprichou e repaginou nosso acervo, e acrescentamos elementos cênicos. Também realizamos oficina de teatro e preparação vocal para auxiliar no processo de construção do espetáculo”, acrescentou ela.
Para a diretora, o ponto alto da apresentação é que o grupo vai destacar, durante as encenações, histórias paralelas. “Tivemos atenção para destacar as histórias que ocorreram simultaneamente ao sofrimento de Jesus: a negação de Pedro, a morte de Judas e a dor de Maria. Não posso detalhar muito para não dar spoiler!”, adiantou ela, destacando ainda que o diferencial da apresentação do grupo é o fato de terem feito essa peça pensando num formato não convencional.
“O público fica muito próximo das cenas e consegue sentir bem as emoções. Além disso, tivemos muito cuidado e zelo em preparar o elenco para viver a história com o peso do drama que ela tem. Buscamos apoio de profissionais formados em artes cênicas e a nossa inspiração de roteiro foi o filme ‘A Paixão de Cristo’, do Mel Gibson”, pontuou Alessandra.
Para o ator Matheus Amorim, que interpretará Jesus Cristo, é um momento especial: após quatro anos longe dos palcos, ele volta à cena teatral da cidade com o espetáculo, o que tem se revelado algo bastante simbólico e significativo para o artista.
“Um retorno às minhas raízes e minha identidade como artista e hoje também como pesquisador e professor de artes. Iniciei no mundo das artes cênicas fazendo teatro de igreja, por isso digo ser algo simbólico e significativo, pois quando decidi seguir profissionalmente com o curso técnico em teatro, a graduação em teatro, a especialização em dramaturgia e hoje estando na reta final de um mestrado em artes, me dediquei a outros movimentos de representação com o teatro, a performance e o audiovisual, narrativas voltadas para questões fragmentadas de identidade e pertencimento”, falou ele, que acredita que rememorar o caminho que o trouxe até o momento presente, por meio não só do espetáculo, mas principalmente da narrativa e da história que o drama carrega, tem mostrado a ele que determinados propósitos nunca morrem.
“Se trata de entender a complexidade que envolve ser artista num tempo onde a efemeridade de determinados discursos é capaz de silenciar nosso ofício. Além da preparação física, com exercícios diários, uma alimentação reforçada e nutritiva, têm sido importante os momentos devocionais, de estar sozinho, conversando com Deus, buscando compreender seu olhar, sua mansidão e humildade, pois no recorte do espetáculo que estamos propondo, da Santa Ceia até a Ressurreição, são os momentos onde mais percebo o caráter do filho de Deus se revelar, seu propósito e sacerdócio. Me pergunto como alcançar esse olhar, esse sentir, essa obediência que Jesus teve ao pai para cumprir sua missão, o seu chamado”, contou ele, que vê esse momento de preparação como um processo de autoconhecimento, pois não tem como não ser tocado pelas palavras que Jesus proferiu.
“Admito que tudo isso tem transformado meu fazer, compreendendo a necessidade de me posicionar dentro do contexto artístico, cultural e político no qual estou inserido. Jesus tem muito a nos ensinar, principalmente num tempo onde nossas diferenças têm se tornado cada vez mais individualizantes. Interpretar Jesus Cristo de Nazaré tem sido esse constante movimento de repensar o que tenho feito na tentativa de tornar minhas ações, não só no palco, mas na vida, algo frutífero e salutar para minha geração e sociedade”, finalizou o ator.
ASSISTA
l Espetáculo “A Paixão de Cristo” – Trindade Jovem
Quando: Dias 23 e 24 de março, às 19h30.
Onde: Teatro Universitário Cláudio Barradas (Av. Jerônimo Pimentel, 546 – Umarizal)
Quanto: R$ 60 + 1kg de alimento não perecível
Classificação: 16 anos
l Paixão de Cristo em Canudos
Quando: Dia 29 de março (Sexta-feira Santa), a partir das 18h30
Onde: Início na Paróquia de São José de Queluz (Av. Cipriano Santos, 311 – Canudos) e percurso pelas ruas do bairro
Quanto: Gratuito.
Para ajudar: Pix (91) 980241339
l Paixão de Cristo na Condor
Quando e onde: Dias 26 e 27 de março (Salão Paroquial da Paróquia de São Judas Tadeu – Av. Alcindo Cacela – Condor), e dia 29, Sexta-Feira Santa, cortejo na rua com final no estacionamento da igreja.
Informações: WhatsApp (91) 3115-6020
l Via Sacra – Um Coração para Amar – Grupo Teatral Shalon
Quando: Dia 29 de março, às 19h.
Onde: Paróquia do Sagrado Coração de Jesus (Conj. Júlia Seffer)
Quanto: Gratuito.