É DIA DE ROCK, BB!

Rock é resistência: 70 anos depois, o estilo ainda desafia padrões

13 de julho, Dia Mundial do Rock, lembra que o gênero permanece mais vivo e potente do que nunca.

À frente da Móbile Lunar, Johann mostra que a maior força do rock está na sua rebeldia. FOTO: divulgação
À frente da Móbile Lunar, Johann mostra que a maior força do rock está na sua rebeldia. FOTO: divulgação

Se o rock fosse uma pessoa, hoje estaria na casa dos 70 anos. É à década de 1950 que remontam muitas histórias de sua formação, inspirada principalmente pela música negra, pelo soul e mais especificamente pelo blues, de onde ele surge. Dançante, divertido, jovem, o estigma que ainda existe sobre um dos mais populares estilos musicais no mundo é do roqueiro raivoso, do adolescente rebelde e do sujeito avesso às normas vigentes. Mas nesses 70 anos de vida, o rock, celebrado no dia 13 de julho, tem se mostrado a verdadeira fonte do elixir da vida, conseguindo se reinventar e renascer, sempre que uma nova geração descobre a potência da sua filosofia.

Foi assim com Johann, cantor, drag queen e vocalista da banda paraense Móbile Lunar. Sua infância em Ananindeua foi dividida por extremos: a igreja e o bar do avô. A igreja abraçava suas habilidades criativas para cantar, dançar, explorar suas ferramentas artísticas. Já o bar, era onde recebia o alimento para o repertório que criaria anos mais tarde com sua drag e sua performance no palco. Entre muitos bregas, na trilha sonora do bar saltavam a seus ouvidos Raul Seixas, Legião Urbana e Secos e Molhados, os artistas que formariam sua percepção de arte. Som, letra e estética inspiraram Johann a romper com o preconceito que sentia ao redor por sua sexualidade e a usar sua arte para incomodar padrões.

“Não quero xingar ninguém, eu não sou essa pessoa, mas a minha arte tem o poder de fazer isso por mim”, declara Johann, que se diverte, rindo de surpresa sempre que emite algum posicionamento que provavelmente chocaria suas antigas amizades bíblicas. Desde a maquiagem que usa no rosto, até a escolha de fazer uma drag andrógina, trazendo sua voz doce com a potência do canto, ele conta que suas escolhas estéticas sempre andam juntas com a ideia de provocar, gritar e se impor. Foi exatamente o que teve que enfrentar quando assumiu o posto, há um ano, de vocalista da banda Móbile Lunar, uma veterana dos palcos paraenses. Uma drag, mesmo com estética gótica, chocou alguns fãs antigos do grupo que até pediram para a banda mudar de nome. Já Johann responde às críticas com uma visão bem firme: “revolucionar é existir numa sociedade preconceituosa”.

É esse posicionamento de “roqueiro” que mantém o estilo vivo, de acordo com o professor e músico paraense Pratagy. Para ele, o rock é um universo estético que vai muito além da combinação de guitarra, baixo, bateria e vocal, com harmonias simples que se complexificam em cima de um conjunto de acordes também simples. Para Pratagy, o que marca o rock é o caráter de reinvenção, de ser “um gênero que por sua natureza tem a inventividade na veia”, ele define.

Cheirando a espírito adolescente

Pratagy também traz como contradição e paradoxo a cobrança que os fãs mais antigos do gênero, fixados nos clássicos dos anos 1960 a 1980, direcionam aos artistas mais jovens, reivindicando uma fixação e estruturação estética. O professor analisa que o rock é um dos poucos estilos populares que tem por filosofia buscar referências em outras fontes e se misturar com outros movimentos, se expandindo e garantindo sua diversidade e longevidade na música popular no mundo.

Pratagy também traz como contradição e paradoxo a cobrança que os fãs mais antigos do gênero, fixados nos clássicos dos anos 1960 a 1980, direcionam aos artistas mais jovens, reivindicando uma fixação e estruturação estética.
Pratagy também traz como contradição e paradoxo a cobrança que os fãs mais antigos do gênero, fixados nos clássicos dos anos 1960 a 1980, direcionam aos artistas mais jovens, reivindicando uma fixação e estruturação estética. Foto: Divulgação

“A meu ver, o que o rock carrega de especial é esse ethos, essa postura de sempre se reinventar, de absorver outros estilos musicais, outras culturas. Às vezes, você curtir a banda não significa curtir só a música da banda, mas o que ela carrega como bandeira, como filosofia, para além do som. O rock não é só música, é cultura, moda, política, atitude. O legado do rock é essa bagagem conceitual que está envolvida nele”, declara.

INCANSÁVEL

Escondido no quarto do primo, que tinha MTV na televisão, o músico Camillo Royale descobriu, aos 10 anos, o que faria para o resto da vida: rock ‘n’ roll. O finalzinho do videoclipe de “Smells Like Teen Spirit” (em tradução do inglês, algo como “cheira a espírito adolescente”), da banda Nirvana, foi o bastante para apresentar a ele um universo, um sentimento, um vislumbre de futuro que agarrou com todos os dedos e, com eles, tem feito música desde então.

Camillo é hoje um dos rockstars incansáveis da música paraense, lançando projetos atrás de projetos e apadrinhando jovens a embarcarem nesse universo e desafio da música independente no Norte brasileiro. Se algum dia inventarem uma premiação para classificar o guitar hero do rock papa-xibé, Camillo é um concorrente difícil de bater, assim como seu espírito muito otimista sobre o futuro do gênero.

“O rock sempre vai ter esse papel de protestar e questionar nas letras, tendo guitarra pesada ou não, isso faz parte da cultura brasileira, de certa forma. Pode estar na mídia ou não, sempre tem banda surgindo, rodando o Brasil do jeito que for, lançando música e fazendo esse papel de passar o sentimento que está ali no coração. Gravam, lançam, fazem seu público, aos poucos. A molecada continua comprando instrumentos, dando seu jeito de gravar em casa, então isso nunca vai parar”, vaticina.

“Já mataram o rock tantas vezes, mas sempre volta, de uma forma ou de outra ele sempre está ali ressurgindo na molecada que está pegando os discos agora na internet, coletando um monte de referências, que vão se transformando em um monte de outras coisas. A base está ali. Pode não soar rock, mas a atitude e a intenção sempre vai partir ali desse meio”, vislumbra Camilo.

Para celebrar o Dia Mundial do Rock, neste 13 de julho, a banda Móbile Lunar – formada, além de Johann, pelos músicos Alê Brandão (voz e guitarra), Lars Esteves (guitarra),Rayssa Tiger (baixo) e Igor Gomide (bateria) – se antecipou e lançou, na última sexta-feira, 11, um EP ao vivo. Gravado no Sesc Ver-o-Peso em setembro do ano passado, com quatro músicas já lançadas pelo grupo, as composições ganharam um tom novo na voz e performance de Johann, que traz sua atitude para celebrar nos palcos o espírito adolescente encarnado e vivo para sempre em cada um de nós.

Texto de Gustavo Aguiar