Wal Sarges
A primeira escola de samba do Pará e a quarta do Brasil, o Grêmio Recreativo Beneficente Jurunense Rancho Não Posso Me Amofiná completa 90 anos nesta quarta-feira, 31. Fundada em 1934, a agremiação carnavalesca é parte fundamental da história cultural de Belém e da memória afetiva de quem já sambou no ritmo de sua bateria.
“Considero o Rancho a minha segunda casa. Lutar pela cultura e pelo carnaval faz parte do meu DNA. Eu passo 12 horas do meu dia na escola, incentivando outras pessoas e administrando a escola”, diz o presidente da escola, Jackson Santarém, que já soma 40 anos de Rancho.
E para celebrar os 90 anos da escola haverá uma missa, às 18h, na Igreja de Santa Teresinha; seguida de uma festa, às 20h, na quadra da escola. “Teremos convidados que farão parte da solenidade desses 90 anos. A escola é tão rica para a cultura do Pará, a segunda detentora de títulos do Brasil”, destaca Jackson.
Compondo o grupo especial, o Rancho é detentor de 28 títulos do Carnaval de Belém, sendo 18 enquanto escola de samba e outros 10 na categoria rancho, sempre trazendo em sua bandeira as cores azul, amarelo e vermelho. Além disso, Jackson, que começou na escola ainda menino e passou por várias funções e departamentos, sendo de ritmista a presidente, destaca como ela é importante para sua comunidade.
“É a única escola que tem um acervo cultural do nosso estado, mostrando artesanato dentro da sede. Temos uma biblioteca pública, e o melhor: se o aluno ler um livro e gostar, a gente doa o livro”, exemplifica.
Mas é claro que neste momento, o Carnaval é assunto que não sai da cabeça de seus brincantes e o enredo dos 90 anos saúda essa história: “Nada melhor do que festejar o aniversário fazendo uma homenagem ao fundador Raimundo Manita, com o enredo deste ano que traz o samba reeditado, de 1989”, comenta Jackson. “Estamos trabalhando muito para este carnaval, fazendo eventos diversos para colocar a escola na avenida. A expectativa, mesmo com todas as dificuldades, são as melhores possíveis”, completa o presidente do Rancho.
IDENTIDADE
Se é para falar de pessoas que fizeram essa trajetória, o historiador, professor e pesquisador de carnaval Rudivaldo Souza diz que o Rancho equivale à identidade de quem mora no bairro do Jurunas. “A escola iniciou na Honório, na esquina com a Rua dos Caripunas, e a gente sempre fala: debaixo de três mangueiras que tinham onde o Manito morava. E numa conversa numa Sexta-feira Santa surgiu a ideia de fundar a escola”.
Nessa história de 90 anos, 1983 foi o único ano em que o Rancho não desfilou. “Há uns relatos que, na época, quem gerenciava o Rancho era o Bosco Moisés, mas como a gente diz, era a ‘testa de ferro’, e por uma questão ele preferiu investir na construção da sede do Rancho e ganhar o título de escola campeã no ano seguinte. Foi o que aconteceu no carnaval de 1984”, relata o historiador.
Outro fato importante dessa trajetória ocorreu em 1975. Faltando menos de um mês para o carnaval, o Rancho conseguiu se produzir para colocar a escola na rua, tendo como enredo “Tudo é Carnaval”, destacando grandes nomes, como Bento Maravilha, Manoel Augusto e Guilherme Tadeu, responsáveis pela façanha. “Para mim, esse é um marco muito importante”, destaca Rudivaldo.
Dos anos 1960 até início dos anos 1980, era a comunidade jurunense que contribuía com dinheiro necessário para a escola entrar na avenida. “Eu sempre digo que quem é jurunense é ranchista, quem é ranchista é jurunense. Não basta morar no Jurunas, tem que gostar das coisas do Jurunas e gostar das coisas dos Jurunas é gostar do Rancho Não Posso Me Amofiná, que fica no centro dos Jurunas, e, portanto, está no coração dos jurunenses”, destaca Rudivaldo.
Há 13 anos nessa história, o carnavalesco Paulo Anete se diz um desses apaixonados pelo Rancho. “O carnavalesco é o poeta, o cara que sonha, que pensa, ele pesquisa um determinado tema e, dessa pesquisa, reúne os dados e monta uma linha ou uma narrativa e dali se torna o enredo”, comenta sobre seu papel na escola, onde é o responsável ainda por criar os desenhos que se observa na avenida.
“É o projeto visual pensado para a escola, o desenho das fantasias, o desenho da comissão de frente, de carros alegóricos. Isso é fruto de como o carnavalesco enxerga a escola na avenida, como ele vê o espetáculo acontecendo. A gente gosta de fazer carnaval acontecer e mantém a paixão viva”, afirma ele, que guarda no coração o carnaval quando a escola homenageou o clube do Paysandu, seu time favorito, e que rendeu à escola um dos 28 títulos de campeã do Carnaval de Belém.