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Racionais MC's no The Town: prova de resistência e lavação de almas

Com Mano Brown, o Racionais MC's, foi uma das atrações do festival paulista, dos mesmos criadores do Rock in Rio, que estreou neste sábado (2).
Com Mano Brown, o Racionais MC's, foi uma das atrações do festival paulista, dos mesmos criadores do Rock in Rio, que estreou neste sábado (2).

LUCAS BRÊDA

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – “O que Marighella pensaria de mim agora?”, disse Mano Brown no palco do The Town. Seu grupo, o Racionais MC’s, foi uma das atrações do festival paulista, dos mesmos criadores do Rock in Rio, que estreou neste sábado (2).

O rapper refletia sobre o líder comunista Carlos Marighella, homenageado em música que leva seu nome. Brown expôs logo de cara o dilema que o grupo enfrentou ao subir no palco de um festival mainstream, em que o “capitalismo selvagem”, cantado pelos Racionais em “Mano da Porta do Bar” salta aos olhos nas estruturas iluminadas de dezenas de marcas patrocinadoras do evento.

Mais que isso, se a favela é imortal nos versos de Brown, como ele cantou em “Vida Loka Parte 1”, ela não estava massivamente presente no The Town. Algo natural, devido aos altos preços dos ingressos do festival.

Mas muito mais que os dilemas éticos, a chuva atrapalhou o maior grupo de rap do Brasil. Brown logo no começo do show disse que o chão estava “um sabão”, antes de ser, ele próprio e a plateia, encharcados pela água que caiu no Autódromo de Interlagos.

Os Racionais cantaram também “Capítulo 4, Versículo 3”, clássico de 1997, “Rapaz Comum” e “Expresso da Meia-Noite”, todas acompanhadas pela Orquestra Sinfônica Heliópolis. Os músicos da maior favela de São Paulo encorparam os samples disparados por KL Jay, acrescentaram drama e melodia às músicas do grupo.

Em certa altura, porém, eles tiveram que deixar o palco devido às fortes chuvas. Segundo a assessoria do evento, eles deixaram a apresentação para preservar as dezenas de instrumentos.

Dali em diante, a chuva só piorou, invadindo o palco e molhando os artistas. Afastou parte do público, mas muita gente ficou para ver os Racionais, uma multidão levantando as pulseiras coloridas no estilo Coldplay.

Pelas condições, o show ficou entre prova de resistência e lavação de almas. Microfones falharam, o telão apresentou alguns defeitos e era difícil até ver os músicos no palco com tanta água caindo dos céus.

O repertório do grupo foi acompanhando a carreira dos Racionais, do começo dos anos 1990 até o álbum mais recente, “Cores e Valores”, de 2014. Desse disco, o quarteto cantou “Quanto Vale o Show?”, derradeira da apresentação.

Antes dela, vieram sucessos como “Jesus Chorou” e “Vida Loka parte 2”, cantadas pelo público a plenos pulmões –ainda que fosse difícil ouvir o coro debaixo das capas de chuva. Na segunda delas, aliás, as falhas nos microfones deixaram para a plateia o dever de cantar os versos.
Ainda que estivesse na zona sul paulistana, tão presente nas rimas do Racionais, o grupo não jogou em casa. Enfrentou molhado a chuva e a falta da orquestra com garra e respeito à plateia.
Certamente, não foi como o planejado. Assim como a opinião de Marighella sobre o show dos Racionais no The Town, um encontro decente entre o rap do grupo e a orquestra paulistana vai ficar para a imaginação.