Texto: Wal Sarges
O olhar sobre a Amazônia Legal expresso por meio de imagens e instalações está contemplado na exposição “Sintétika”, fruto do edital Ocupa Centro Cultural Vale Maranhão (CCVM), espaço onde a mostra abre nesta terça-feira, 28, em São Luís. A mostra coletiva poderá ser vista até o dia 13 de janeiro de 2024, na capital maranhense, e conta com a participação de dois paraenses, o fotógrafo Alberto Bitar, editor do DIÁRIO, e a artista visual Evna Moura.
O edital recebeu projetos de fotografia e audiovisual vindos dos estados que compõem a Amazônia Legal. Foram selecionados para a mostra os trabalhos dos artistas maranhenses Tairo Lisboa, Letícia Martins, Lucas Ferreira e Márcio Vasconcelos; dos paraenses Evna Moura e Alberto Bitar; do rondonense Gabriel Bicho; e dos amazonenses Alessandro Fracta e o Coletivo Picolé de Massa.
“Sintétika” é o encontro das diferentes perspectivas sobre a vida em meio à maior floresta tropical do planeta. “Quando ouvimos a palavra ‘sintético’, logo relacionamos ao que é artificial. No entanto, ‘sintético’ refere-se principalmente a tudo aquilo que está pronto para funcionar junto em comunhão. Nesse sentido, os habitantes da Amazônia Legal têm muito a nos ensinar, quando pensamos em cada um deles enquanto seres sintetizadores da complexidade que é viver na e com a maior floresta tropical do mundo. A exposição revela vários olhares sobre a relação entre o sujeito e seu meio e discute questões que concernem à manutenção desse bioma tão importante para o planeta”, explica Gabriel Gutierrez, diretor do Centro Cultural Vale Maranhão e curador da mostra.
Uma das obras em cartaz é “Corte Seco”, de Alberto Bitar, uma série fotográfica que aborda a impermanência a partir de cenas de crimes capturadas durante reportagens policiais na cidade de Belém. Três fotografias e um vídeo fazem parte da obra. O título escolhido por Bitar faz uma analogia ao termo usado na linguagem audiovisual para transições de cena.
“Desde 2009 trabalho na edição de fotografia do jornal DIÁRIO DO PARÁ e no início de 2010 comecei a perceber algumas conexões entre séries fotográficas que eu havia produzido anteriormente, que tratam de questões como a memória e a transitoriedade, com algumas características das imagens produzidas para o caderno policial do jornal. Então lembrei de um procedimento que havia pensado para um outro trabalho, onde as longas exposições seriam utilizadas e que o resultado disso me daria as imagens que suscitariam questionamentos sobre a impermanência”, detalha.
Bitar conta que começou a produzir as imagens no início de 2012, depois do convite para participar da 30ª Bienal de São Paulo, onde mostrou a série pela primeira vez. “Apesar da série trazer fatos de interesse jornalístico que estão no cotidiano das grandes cidades, esse não é o objeto principal de ‘Corte Seco’. Claro que isso não pode deixar de ser percebido e não deixa de ter relevância, mas a ideia principal é nos fazer pensar sobre a nossa condição de impermanência e sobre o quanto somos frágeis”, reflete, completando que se sentiu feliz com o convite para expor no Centro Cultural Vale Maranhão.
“É sempre um prazer fazer parte de exposições que trazem artistas que admiro e de quem acompanho o trabalho, que é o caso da Evna, do Márcio Vasconcelos, dentre outros, e de ver conexões que encontraram nos nossos trabalhos”, enaltece Alberto Bitar.
As Amazônias e a força das mulheres
A série da artista visual, arte-educadora e pesquisadora Evna Moura presente na exposição faz parte de sua pesquisa de mestrado, que foi realizada no Instituto de Artes de São Paulo, na Unesp, e fala sobre a ilha de Cotijuba, lugar com que ela nutre uma relação de encanto. “Falar da Amazônia nos faz pensar nas várias Amazônias que existem, seja por uma simbologia mais afetiva, seja por uma mais política, ou ainda por um discurso de riquezas naturais. Eu fico muito feliz de fazer parte dessa exposição, representando tantas outras falas, mas também aprendendo e trocando muito. Estou feliz também que seja no Maranhão, que é bem simbólico para mim”, diz Evna.
“O questionamento principal é trazer à tona debates tão necessários a serem feitos num espaço – que tem as dificuldades de viver, mas as alegrias e as potencialidades também. Então a ideia era falar um pouco disso, falar também um pouco sobre as nossas ascendências, nossos traços, os nossos povos originários, como essas configurações foram se dando em cada localidade”, destaca Evna Moura, mencionando sua vivência em Cotijuba com o Movimento de Mulheres das Ilhas de Belém (MIB).
“Olhares Ilhados” deu à Evna outra perspectiva de abordagem. “Neste trabalho finalmente fiz uma pesquisa grande só minha. Geralmente as outras coisas eram processos mais rápidos, como em performance, ou até mesmo documental. Para mim foi interessante usar essas técnicas que eu utilizava muito sozinha e compartilhar isso foi o mais legal”.
“Juradas de Morte” nomeia a série do fotógrafo maranhense Márcio Vasconcelos. Seu trabalho destaca a força e a fibra de seis quebradeiras de coco maranhenses, mulheres organizadas politicamente por meio do Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu – MIQCB, exemplos de liderança e bravura na luta por seus territórios. “As lideranças quilombolas envolvidas na luta pelos campos livres têm sofrido ameaças constantes que se deram acentuadamente no ano de 2017. A Maria da Glória Belfort é do Quilombo São Caetano e quebradeira de coco babaçu. Ela é uma das mulheres que lutam pela regularização do território quilombola e pela retirada das cercas eletrificadas nos Campos Naturais da Baixada Maranhense”, conta.
“O Maranhão é o único estado da região Nordeste que pertence à Amazônia Legal, então, como maranhense, ter a oportunidade de mostrar um trabalho que faz uma denúncia de ameaças que sofrem as mulheres trabalhadoras dos territórios herdados de ancestrais é muito significante. O Movimento das Quebradeiras de Coco Babaçu abarca os estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Pará”, relata o artista.