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Morre Antonio Meneses, um dos principais músicos de sua geração, aos 66 anos

O violoncelista Antonio Meneses — Foto: Divulgação/Satoko Kuroda
O violoncelista Antonio Meneses — Foto: Divulgação/Satoko Kuroda

O violoncelista Antonio Meneses, que era considerado o mais prestigiado músico brasileiro em atividade no mundo, morreu na manhã deste sábado (3), tarde na Basileia, na Suiça, onde morava, aos 66 anos. A informação foi confirmada por sua mulher, Satoko Kuroda.
Ele estava tratando um câncer e chegou a suspender seus cursos e apresentações em julho.
Meneses estava entre os 20 maiores nomes mundiais de seu instrumento, unindo uma técnica impecável à sensibilidade musical dos gênios, o que permitia uma visão aprofundada de um imenso repertório que, para ele, cobria do barroco às composições contemporâneas.
Ele já tivera problemas de saúde em 2011, quando foi operado de um tumor benígno no pulso direito –é a mão com que os violoncelistas empunham o arco–, forçando-o a interromper por algumas semanas a relação que mantinha desde menino com o instrumento.
Nasceu em Recife, em 1957. Seu pai era músico de trompa e passou em um concurso para a orquestra do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, mudando-se para aquela cidade quando Antonio tinha apenas um ano.
Começou a estudar o instrumento de cordas aos 10 anos com a professora Nydia Otero, e em quatro anos, com um talento e uma precocidade excepcionais, já integrava o naipe dos violoncelos da OSB (Orquestra Sinfônica Brasileira). Dois anos antes, com um conjunto sinfônico juvenil, foi pela primeira vez solista de um concerto, interpretando uma peça de Vivaldi, compositor veneziano do século 18.
Em sua página na internet, Meneses relaciona a gravação de 43 CDs. Não incluiu na lista os LPs dos tempos analógicos e nem os registros feitos entre outubro de 1998 e 2008 com o Trio Beaux Arts, grupo de câmara que por meio século teve a liderança, ao piano, de Menahem Pressley, músico nascido na Alemanha e cidadão israelense. Foi no trio que o instrumentista brasileiro tornou-se o terceiro e último ocupante da vaga de violoncelo.
O trio, completado em sua última formação pelo violinista sul-africano Daniel Hope, tem um histórico exemplar na música de câmara do século 20. Meneses via Pressley, que morreu em maio do ano passado, como seu maior mestre na compreensão da música. Disse que poderia até considerar muito boas as gravações que fizera antes de integrar o Beaux Arts. Mas o prodígio e a profundidade vieram apenas com os ensinamentos do veterano pianista.
Mas voltemos ao Rio do início dos anos 1970. Mesmo diluído na sonoridade dos demais violoncelistas da orquestra, a presença de Meneses foi notada pelo professor italiano Antônio Janigro, que o convidou a estudar com ele na cidade alemã de Dusseldorf.
O violoncelista juntou suas poucas economias, abandonou o colegial e foi para a Europa, onde Janigro, disse, ensinou-lhe a disciplina e a lógica do instrumento. Prosseguiu seus estudos numa outra cidade alemã, Stuttgart, e em 1977 ganhou seu primeiro prêmio importante, o do concurso ADR, de Munique.
Ficou na frente de 40 candidatos. A Filarmônica de Berlim contata seu empresário, e em 1981 ele grava com a orquestra –regida por Herbert von Karajan e em companhia da violinista Anne-Sophie Mutter. No ano seguinte, alçou novo voo, bem mais alto. Candidatou-se e venceu o Concurso Tchaikhovski, de Moscou. Estava com 25 anos e um bom futuro pela frente. Karajan o chamou para gravar “Don Quixote”, de Richard Strauss.
Seguiu-se um período em que Antonio Meneses, sem a personalidade inflada das celebridade, se acomodou numa posição discreta. Passou a lecionar numa universidade. Deixou de circular pela nata das salas europeias de concerto. E seu nome desinflou por encanto.
Escondido pelas atividades acadêmicas, ele fez o oposto que outro brasileiro do qual bastante se fala, o pianista Nelson Freire. E há um possível paralelo com outra violoncelista, bem mais jovem que Meneses, a argentina Sol Gabettta. Vencedora dos dois concursos que ele também venceu, o de Munique e o de Moscou, ela foi lançada de imediato por empresários a festivais e como solista de grandes orquestras.
Meneses fez o mesmo trajeto. Mas com um pouco mais de idade e precisando lembrar aos melômanos de toda a Europa de sua própria existência. Seu jeitão tímido e retraído dificultou esse caminho.
Mas o fato é que Meneses voltou a circular. Relacionou-se com grandes maestros e foi programado pelas grandes orquestras. Continuou a lecionar, dando aulas na Espanha, Itália e na Suíça, onde se tornou titular do Conservatório de Berna.
Ao mesmo tempo ele, um músico para muitos já bem “europeu”, fez de tudo para preencher ao máximo sua agenda com o Brasil, país que ainda era o dele.
Seus compromissos mais recente, antes de adoecer, demonstraram o conteúdo brasileiro de sua música. No final do ano passado, estreou em Belo Horizonte, com a Filarmônica de Minas Gerais, regida por Fábio Mechetti, o Concerto para Violoncelo de André Mehmari. Fez duo com o jovem pianista Cristian Budu e gravou álbum com peças de compositores franceses. E entrou no projeto da Osesp na gravação integral das obras de Villa-Lobos. Sob a regência de Isaac Karabtchevsky, lançou disco com os dois concertos e a Fantasia que o compositor brasileiro escreveu para seu instrumento e orquestra sinfônica.
Esse apego pelo Brasil foi demonstrado em “Arquitetura da Emoção”, excelente livro sobre Meneses feito pelos jornalistas João Luiz Sampaio e Luciana Medeiros. Dentro da mesma lógica, há cinco anos Meneses estreou um concerto para violoncelo do brasileiro Marlos Nobre. E foi, há bem mais tempo, num Festival de Inverno de Campos do Jordão, que o violoncelista, numa só tarde, preparou apresentação em companhia da pianista portuguesa Maria João Pires, que em seguida acabou rendendo um novo álbum.