ENTREVISTA

Gaby Amarantos afirma que novo disco recria experiência de ir a festa de aparelhagem

Se a discografia de Gaby Amarantos fosse uma festa de aparelhagem, ela chegaria agora ao momento máximo de euforia.

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Se a discografia de Gaby Amarantos fosse uma festa de aparelhagem, ela chegaria agora ao momento máximo de euforia.

A cantora com show marcado em São Paulo para domingo (14), no festival The Town, como convidada de Joelma lançou na semana passada o álbum “Rock Doido”, que carrega no nome a vertente mais acelerada e festeira do tecnobrega paraense.

“O rock doido é o ápice de gritaria e loucura o extremo frenesi com muita pirotecnia”, diz a cantora. “Quem vai [a uma festa de aparelhagem do estilo] sabe que vai ouvir o que é mais frenético.”

Esse é o ritmo do disco da artista, uma das maiores referências da música paraense contemporânea. São 22 músicas em 36 minutos, nos quais ela absorve a linguagem fluida e ultra-dinâmica, com viradas ágeis, do rock doido.

“Dou o crédito às aparelhagens, que fazem isso há uns 20 anos”, diz a cantora. “No Rock Doido, pensamos em como fazer para as pessoas terem a experiência de um set de aparelhagem. Por isso que vem toda essa narrativa a pessoa decide ir para a festa, e depois que ela vai vestir?”

As letras acompanham a personagem desde a decisão de usar um short estilo “beira-cu” e conforme ela vive uma desilusão amorosa e sua superação, decide se jogar na festa, entra no modo sedução, pega um “bonito feio” e por aí vai. Tudo numa só noitada.

Um filme de 20 minutos explora ainda mais explicitamente a narrativa. Há referências a influências clássicas de Amarantos, como Beyoncé, mas nas cenas se destacam artistas, espaços, a dança, a moda e a cultura de festa do Pará.

Para a cantora, só agora o Brasil está pronto para absorver o rock doido. Ela se refere ao movimento de fazer o tecnobrega pegar no resto do país, que vem da virada para a década de 2010, quando Amarantos despontou nacionalmente cantando o estilo.

Ela lançou seu primeiro disco, “Treme”, em 2012, passou a frequentar a MTV e virou tema de novela da Globo. Tornou-se, pelo menos para quem estava fora de sua região de origem, o rosto do tecnobrega, gestado desde os anos 1990.

Quando o jornalista Hermano Vianna escreveu pela primeira vez sobre aquele movimento, afirma a cantora, ele “disse que daqui a dez ou 15 anos essa sonoridade seria onipresente e onisciente, e esse movimento seria compreendido pelo Brasil”. “Há muitas nuances, o Pará às vezes parece um mundo paralelo.”

Nesse período, Amarantos produziu menos. “Purakê”, seu segundo disco, em que ela segue um caminho mais conceitual, começou a ser feito em 2015, mas só saiu em 2021.
O trabalho seguinte, “Tecno Show”, contempla a produção da cantora com o grupo que dá nome ao álbum. Amarantos surgiu para a música cantando esse repertório nos anos 2000, mas ele nunca tinha sido lançado oficialmente.

Isso porque a maioria das faixas eram regravações de sucessos estrangeiros, prática comum no tecnobrega. Após anos lutando para conseguir a liberação dos autores, o disco saiu em dezembro de 2022. Há planos para uma parte dois da obra, a depender das negociações.

Com uma Amarantos novinha na capa, e produção do músico Félix Robatto, “Tecno Show” rendeu à cantora um prêmio no Grammy Latino em 2023. Em paralelo, ela viu Pabllo Vittar fazer sucesso com o projeto “Batidão Tropical”, em que faz sua releitura pop do tecnobrega.
Amarantos teve a ideia de fazer “Rock Doido” quando viu amigos sudestinos embasbacados ao presenciarem uma festa da aparelhagem Tudão Crocodilo. “Falei, foda-se, vou pegar toda a grana da minha planilha e vamos dar um jeito de fazer”, ela conta sobre a espontaneidade da produção, tão rápida que “não daria tempo de botar em edital”.

A produção das músicas é assinada na maioria pelo jovem trio MGZD, que Amarantos chama de “mineiros muito paraenses”, responsáveis por “traduzir” o som do Norte para os outros estados. Ela também diz ter tido ajuda de Félix Robatto (“uma espécie de curador”), Baby Plus Size, DJ Iran, Jaloo, DJ Valdo, DJ Gordo (do Crocodilo), DJ Gigio Boy, DJ Pedrita e Zek Picoteiro.

Além deles, Gang do Eletro participa da música “Tumbalatum”, a rainha do tecnomelody Viviane Batidão reforça “Te Amo Fudido”, a cantora sertaneja Lauana Prado empresta violão e voz a “Não Vou Chorar” e MC Dourado canta em “Cerveja Voadora”. DJ Meury assina a produção da nova versão de “Crina Negra”.

A vasta maioria do repertório de “Rock Doido” é autoral, mas uma das músicas que desponta como hit é uma versão. Trata-se de “Foguinho”, recriação do hit “Somebody That I Used to Know”, do belga-australiano Gotye, que por sua vez sampleou a música “Seville”, do violonista brasileiro Luiz Bonfá. Aqueles acordes viajaram, mas voltaram ao Brasil através do Pará.

Falando à Folha por ligação de vídeo do Jurunas bairro da periferia de Belém onde ela cresceu Amarantos afirma querer levar os olhos dos brasileiros, e do mundo, ao Norte. Não é coincidência a proximidade da COP30, conferência da ONU sobre mudanças climáticas que acontece no Pará em novembro.

“Mamãe não é boba nem nada de lançar nesse momento”, ela diz. “Temos esses olhares todos do mundo para gente, então sim, vamos preservar a Amazônia, vamos fazer COP, vamos para Belém. Mas o que essa galera escuta?”

Além do rock doido, as equipes de aparelhagem costumam ter os momentos chamados de “saudade” e de “marcantes”. O primeiro conta com bregas românticos e mais antigos, geralmente dos anos 1970 a 1990, enquanto o segundo tem músicas com as batidas eletrônicas do tecnobrega mais clássico, do fim dos anos 1990 e começo dos 2000.

“Digamos que a aparelhagem tem vários atos, em que o rock doido é um deles”, diz Amarantos. “Quando a pessoa chega, vai estar tocando ‘marcantes’. Depois, vira para o momento mais animado, toca ‘saudade’ e o DJ vai te preparar para aquele ápice.”

Se a discografia de Gaby Amarantos fosse uma festa de aparelhagem, “Tecno Show” seria o momento de “marcantes”, enquanto “Rock Doido” chegaria para botar o espaço abaixo. Como num desses sets de DJ, nada é entregue de cara há uma construção.

“Agora, o Brasil está pronto para o rock doido. Cansei dessa história de música regional. Assim como o funk é nacional, o rock doido é nacional também. É música do Pará, mas é do Brasil.”

ROCK DOIDO

  • Onde Dispinível nas plataformas de streaming
  • Autoria Gaby Amarantos
  • Produção Amarantos, MGZD, DJ Baby Plus Size, DJ Iran, DJ Méury, Félix Robatto
  • Gravadora Deck
    JOELMA COM GABY AMARANTOS DONA ONETE E ZAYNARA NO THE TOWN
  • Quando Domingo (14), às 17h
  • Onde Palco The One – Autódromo de Interlagos – av. Sen. Teotônio Vilela, 261, Interlagos, região sul
  • Preço R$ 975 (inteira)
  • Link: https://www.ticketmaster.com.br/event/thetown

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