Wal Sarges
Há quatro décadas, a Associação Fotoativa atua na Amazônia como um símbolo do fazer e pensar a fotografia a partir da força coletiva. Este ano, a instituição celebra essa história com todos aqueles que acreditam no propósito deste espaço.
Com atuação em Belém desde 1984, quando o fotógrafo paulista Miguel Chikaoka percebeu a fotografia como meio de promover e desenvolver ações coletivas de reflexão, formação-educação, experimentação e pesquisa da linguagem fotográfica e seus desdobramentos, a Fotoativa ganhou amplitude ao longo dos anos e em 2000 se configurou enquanto uma associação cultural sem fins lucrativos, de interesse público estadual e municipal.
Há alguns anos, ocupa um casarão histórico na Praça das Mercês, uma construção do século 19 onde funcionou o primeiro estúdio fotográfico da Amazônia, o Foto Fidanza. É lá que a entidade tem promovido exposições, palestras e laboratórios de fotografia e informática, dando nova vida a esse espaço entre um conjunto de sobrados ecléticos, e se mantendo como uma das instituições culturais de mais influência na cena paraense.
Observar essa trajetória e perceber tudo o que foi construído é uma vitória coletiva, acredita Miguel Chikaoka, que não integra mais o núcleo gestor da Fotoativa, mas o acompanha de perto.
“A gente sonha e tem nossas utopias e eu me guio muito pelo sonho, daquilo que é tangível e intangível. Eu me lembro que antes, quando surgiu o grupo Foto Oficina, que foi, digamos, o estado embrionário da criação da Fotoativa, já tinha desenhado ali uma espécie de fluxograma no tempo que apontava uma importância muito grande de fazer coisas locais, com o que nós tínhamos, com nossas potências, e fazer a conexão com tudo que está acontecendo no mundo, no estado, no Brasil”, reflete Chikaoka.
“Esse talvez seja também outro aspecto que é importante, porque o Pará hoje é reconhecido como um polo importante da fotografia brasileira e isso se deu em função também dessa articulação constante entre o local, o nacional e o mundial”, considera.
O artista conta que a Fotoativa já nasceu com o perfil de uma entidade que não tinha regras de participação. Ou seja, qualquer pessoa interessada pela técnica e pela linguagem fotográfica e da imagem poderia se aproximar. Inclusive pessoas que não tinham o interesse na fotografia em si, mas muito mais na produção cultural, na criatividade e inventividade, por exemplo.
“Se for fazer uma investigação mais profunda na história da Fotoativa, pegando todas as pessoas que passaram por ela, perceberemos que são pessoas que até hoje são afetivamente conectadas também no nível do pensamento, que não são fotógrafos, são pessoas que estão em outras áreas de conhecimento e até hoje guardam para si esse sentimento de pertencimento”, diz.
DIMENSÃO AMPLIADA
Ao longo desses anos, Miguel Chikaoka diz que continua atuando na perspectiva daquilo em que acredita, que é a importância de exercitar a sua função não como um fotógrafo atuante no mercado, mas numa outra dimensão. “Eu continuo fotografando, mas exploro muito mais a fotografia como a potência, como o lugar possível desse exercício do coletivo. É um laboratório e um aprendizado muito incrível que a gente faz. Este lugar foi um estímulo para seguir nesse caminho”, considera Miguel, dizendo que depois de oito anos distante do núcleo gestor, observa que muita gente agregou e está fazendo trabalhos incríveis sem sua participação direta.
O artista visual, curador e pesquisador Alexandre Sequeira – cujo trabalho transcendeu o suporte tradicional da fotografia e chega até à instalação – é um dos desses nomes cuja trajetória se cruza com a da Fotoativa. “Eu celebro os 40 anos da Fotoativa, torcendo para que mais e mais pessoas sejam tocadas pela ação oficial que essa instituição desenvolve. É um trabalho muito especial, que acolhe artistas e não artistas, fotógrafos e não fotógrafos. Tem diversas ações que envolvem vendedores de rua, as erveiras, os vendedores de peixe do Ver-o-Peso, educadores da rede municipal de ensino, da rede estadual, que aqui entram em contato com uma perspectiva de compreender a imagem como um potente instrumento de reflexão sobre o mundo”, elogia.
Sequeira, que se prepara para levar uma nova exposição em breve a Manaus, diz que tudo o que vive hoje está ligado com a experiência que teve na associação. “De certa forma, a Fotoativa foi um indutor para eu pensar a fotografia como uma experiênciade construção de conteúdo e de sentido. O que eu faço hoje em artes visuais está diretamente relacionado com a experiência que eu tive na Fotoativa, especificamente também com o Miguel, com essa perspectiva humanista que ele imprime nas ações dele”, conta o artista, que no ano passado expôs em Belo Horizonte, depois São Paulo e também no México e na China.
TRABALHO
Assim como Alexandre Sequeira, muitas pessoas tiveram seu primeiro contato com a a fotografia a partir da Fotoativa e dali se projetaram para o mundo. O editor de fotografia do DIÁRIO, Octavio Cardoso, fez uma das primeiras oficinas do local. O designer Eli Sumida, responsável pela criação da placa em cerâmica com a logomarca do início da associação, e agora pelo selo comemorativo aos 40 anos – que foi lançado na última quarta, abrindo oficialmente as celebrações deste ano -, é outro cujo história se cruza com o grupo.
“A Fotoativa sempre foi um contraponto ao trabalho de redação, de vanguarda, de criatividade, uma outra forma de ver as coisas, porque realmente é uma outra cultura, e sempre fui apaixonado por essa proposta”, conta Sumida, hoje designer de revistas conectado com o mundo digital.
O selo é apenas um marco inicial. Mas o diretor administrativo da entidade, Jorge Ramos vinculado à Fotoativa desde 2017, diz que o ano será de muito trabalho, especialmente na concepção de projetos que possam captar recursos via financiamentos públicos, hoje basicamente a forma de manutenção das ações da entidade.
“A gente tem muito o que tentar fazer nessa casa, mas são coisas ligadas ao planejamento, construção, mas a gente quer envolver a Fotoativa cada vez mais com a sociedade”, resume, deixando no ar o que virá por aí.