A cidade de Parintins, no interior do Amazonas, viveu dias de intenso movimento no último final de semana com a realização do maior festival folclórico do Brasil: a disputa entre os bois-bumbás Caprichoso e Garantido. Conhecida como a Ilha da Magia, a cidade amazonense respira cultura popular durante o ano todo. Com cerca de 100 mil habitantes, para onde se olha é possível ver uma referência aos personagens — seja nas cores, seja na própria imagem dos dois.
O impacto do festival no cotidiano do estado do Amazonas é sentido inclusive na capital, que teve um fim de semana mais tranquilo e com menos gente nas ruas. Totalmente o contrário de Parintins, principalmente na região do local onde o evento ocorre: o Bumbódromo — uma arena onde acontece o certame, e tudo conta ponto, inclusive a plateia. Ao todo, cada agremiação precisa apresentar 21 itens durante 2h30, ao longo dos três dias de competição.
Localizada a 370 quilômetros de Manaus, na parte norte do Rio Amazonas, a cidade, devido à proximidade com o Pará, sofre bastante influência das comunidades do Baixo Amazonas paraense — principalmente Juruti e Santarém.
Influência e Tradição do Festival de Parintins
Inclusive, a presença de paraenses nos dias de festival — neste ano realizado de 27 a 29 de junho — é intensa, como no caso de Daniele Ribeiro, 32, representante comercial, que trouxe o marido para conhecer o evento. “Moro há 10 anos em Manaus, mas sou de Santarém. Quem mora em Santarém tem a difusão das duas culturas, né? Porque Santarém, por ser Baixo Amazonas, acaba que é mais próximo do Amazonas do que de Belém”, explica Daniele. Ela conta que já torcia para o Caprichoso mesmo antes de morar no Amazonas.
“Eu já dancei no grupo Carimbó do Pará. Como eu sou de Santarém, e o Carimbó do Pará dança pro Caprichoso, a minha família tem toda uma influência dentro do boi-bumbá. E aí, quando a gente junta o Amazonas com o oeste do Pará — ali com Parintins, Juruti, Óbidos, Manaus —, a gente acaba sendo incluída dentro dessa cultura”, completa.
Ericky Nakanomé, presidente do Conselho Artístico do Caprichoso, ressalta que a festa, apesar de amazônica, tem o intuito de gerar reflexão em todas as regiões. “Nós não estamos num eixo onde todas as notícias e todas as realidades viram notícia. Então, o Festival de Parintins, os bumbás, viram arautos do seu próprio povo, cantando ao Brasil, mostrando ao mundo os anseios da sua população, os problemas que nós enfrentamos durante o ano inteiro, todas as questões relacionadas aos povos e comunidades que nela habitam”, opina.
“O Festival Folclórico de Parintins hoje dialoga com quase todas as comunidades do Norte. Então, aqui em Parintins, estão, em sua maioria, massivamente, 90% do elenco. Outra parte é manauara, e há o elenco de Juruti e Santarém, no estado do Pará, além do Rio Negro, com o Festival de Barcelos também compondo a cena, Barreirinha e outros grupos”, completa.
Apesar do grande fluxo de turistas na cidade, o público local é o elo mais importante do espetáculo. Cileusa Ribeiro, 50, autônoma, nasceu e foi criada em uma família torcedora do Garantido, legado que permanece até hoje. “É do sangue, é de família. Tenho parente artista, compositor. Eu vivo por isso, a gente ama essa festa. Não me vejo fora daqui”, conta. Ela diz que a rivalidade no dia a dia da ilha é muito grande. “Se não tivesse o Caprichoso, o Garantido ia fazer a festa sozinho. Como faz sempre. Sempre o Garantido é o melhor”, completa.
Outro ponto que se fala aos quatro ventos na Ilha da Magia é a lenda de que não é a pessoa que escolhe o bumbá para torcer, mas sim que “é o boi que escolhe a pessoa”. A professora brasiliense Elaine Sousa, 62, concorda e explica que começou a assistir ao espetáculo pela televisão há 15 anos. Desde então, tem ido frequentemente ao evento. “Em 2013 eu vim pela primeira vez. Sentei bem perto e o Caprichoso desceu num guindaste e foi caindo até o meu colo. Eu dei um abraço nele, fiz carinho e, assim, ele me escolheu. É sempre muito emocionante vir aqui”.
Apoio e Impacto Econômico do Festival
Uma festa do porte atual do Festival de Parintins só é possível com a presença de patrocinadores de peso. Também espalhadas pela pequena cidade, é possível ver diversas marcas nacionais e internacionais em ativações diversas — inclusive mudando as cores tradicionais dos logotipos e rótulos para azul e vermelho. Um dos apoiadores do evento é a maior empresa do Brasil, a Petrobras, que convidou o Diário do Pará a conhecer o evento.
“Aqui, na verdade, é uma ópera popular, um espaço de arena. Uma interação. A torcida aqui é chamada de galera. Esse pessoal que está aqui na galera chegou às dez da manhã, e está aqui desde então para garantir o lugar. Aí você olha oito, nove da noite, eles estão pulando, saltando meio metro aqui, porque é uma energia — e isso é uma coisa que na Petrobras a gente acredita muito”, comenta Luís Fernando Nery, gerente-executivo de Comunicação da estatal.
“Uma empresa como a nossa nasceu de um movimento popular. A energia do seu negócio tem que estar sempre junto no investimento cultural e em festas populares”, completa Nery, que aponta que mais de 30 projetos culturais estão sendo patrocinados pela Petrobras no Pará.
Sérgio Bacci, presidente da Transpetro (Petrobras Transportes), diz que o Norte vive um momento especial e que o Festival de Parintins conversa com temas que futuramente serão abordados de outra maneira na COP-30, em Belém. “Eu acho importantíssimo ter a COP-30 sendo feita no Brasil. Acho que, pela primeira vez, os grandes líderes mundiais vão saber o que é a região amazônica, efetivamente. Eles vão vir aqui ver a nossa população, os nossos povos, as dificuldades que a gente tem”, opina.
A festa dos bois amazonenses começou em 1965, com o intuito de arrecadar fundos para a paróquia da cidade. Segundo o Governo do Estado, 120 mil pessoas circularam durante os dias de competição, gerando uma movimentação de R$ 184 milhões na economia local.