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E das mulheres se fez o barro...

O grupo Mulheres de Barro surgiu das ações de educação patrimonial desenvolvidas a partir do Projeto Salobo e, transformado em cooperativa, passou a ofertar oficinas de iniciação artística à comunidade. FOTOS: DIVULGAÇÃO
O grupo Mulheres de Barro surgiu das ações de educação patrimonial desenvolvidas a partir do Projeto Salobo e, transformado em cooperativa, passou a ofertar oficinas de iniciação artística à comunidade. FOTOS: DIVULGAÇÃO

Cintia Magno

A busca por uma identidade regional que transparecesse nas peças produzidas por um grupo de mulheres artesãs de Parauapebas foi o ponto de partida para um projeto que não apenas reforça o potencial artístico feminino para a economia criativa, como também conecta o trabalho desenvolvido por elas à valorização de um patrimônio histórico que data de mais de 6 mil anos. Das mãos das mulheres que integram o grupo Mulheres de Barro, as cerâmicas produzidas ganham formas e grafismos inspirados em vestígios recuperados em sítios arqueológicos localizados na Serra dos Carajás, trabalho que pode ser conferido no Centro Mulheres de Barro de Exposição e Educação Patrimonial, que conta com o patrocínio do Instituto Cultural Vale, via Lei Federal de Incentivo à Cultura.

O grupo Mulheres de Barro nasceu no período entre 2005 e 2011, fruto das oficinas do Programa de Educação Patrimonial, dentro das atividades ambientais realizadas pela Vale e pela Fundação Vale, durante a implantação do projeto Salobo.

Desde então, o grupo vem desenvolvendo ações para valorização da história e cultura da região de Carajás. A partir de 2013, com a criação da Cooperativa Mulheres de Barro, a entidade vem fortalecendo a atividade artesanal, com a produção, venda e divulgação de produtos cerâmicos inspirados em artefatos encontrados, por meio de pesquisas arqueológicas.

Presidente da Cooperativa Mulheres de Barro, Sandra dos Santos Silva lembra que, certa vez, algumas mulheres artesãs da cidade viajaram com seus trabalhos manuais para participar de uma feira em Belém. Sem que conseguissem uma boa venda, elas sentiram falta de uma identidade regional em suas peças, algo que representasse culturalmente o município de Parauapebas.

“Essa ida a Belém serviu para a gente perceber que precisávamos fazer alguma coisa para mudar essa realidade. Voltando dessa viagem nós criamos um projeto chamado Artesanato Sustentável de Parauapebas”.

A oportunidade que as mulheres artesãs esperaram para dar vazão à sua ideia veio com o Programa de Educação Patrimonial que estava sendo desenvolvido em meio ao processo de implantação do Projeto Salobo.

“Nós ingressamos nesse programa de Educação Patrimonial, onde ficamos seis anos. O Museu Emílio Goeldi era quem executava o programa aqui no município e, enquanto os arqueólogos faziam as pesquisas arqueológicas e salvaguardavam esse material encontrado, havia a equipe educativa que ia trabalhando com a gente a questão do patrimônio, da formação do povo brasileiro e da cultura em si em vários conteúdos teóricos”, lembra Sandra.

“No final de seis anos de programa, foi lançado para a cidade de Parauapebas um grupo Mulheres de Barro com as mulheres ceramistas formadas nesse processo. E nós decidimos criar a cooperativa que resiste até hoje”.

Já com uma identidade visual, slogan e um CNPJ, a cooperativa pode dar andamento à ideia que haviam desenvolvido ainda no começo dessa jornada. Foi quando começaram a atuar não apenas na produção, mas também na prestação de serviço, ao mesmo tempo em que encontraram o caminho que precisavam para criar o tão sonhado espaço colaborativo, o Centro Mulheres de Barro, inaugurado em 2016.

Contando com o patrocínio do Instituto Cultural Vale, hoje o espaço atende a um público variado nas três oficinas ofertadas. Voltada para o público a partir dos 16 anos de idade, a Oficina de Educação Patrimonial e Artesania Cerâmica atende 35 participantes em cada edição promovida.

Oficina de artesania cerâmica

Já a Oficina de Artes Cênicas com Incentivo à Leitura e a Oficina de Educação Patrimonial com Sensibilização às Artes Visuais, destinadas ao público com idade entre 9 e 15 anos, recebem 30 alunos e 20 alunos por edição, respectivamente.

Para além das oficinas, a presidente da Cooperativa Mulheres de Barro destaca as outras atividades do espaço, onde são produzidas, em média, 300 peças de tamanhos variados que são colocadas à disposição para comercialização na loja. “A gente reúne, aqui no centro, 20 cooperados, onde tem várias atividades. A principal delas é a produção e comercialização cerâmica, mas nós temos também uma exposição, hoje, que retrata a referência cultural da microrregião de Parauapebas”, explica Sandra.

Reforço à participação feminina na economia criativa

Sem jamais esquecer a origem que deu vazão a todas essas atividades, o centro também reforça a cada ano a sua contribuição à participação feminina na economia criativa. “O empoderamento feminino está muito relacionado à condição financeira da pessoa, então a gente trabalha muito o empoderamento via economia criativa e o artesanato”, destaca Sandra dos Santos Silva.

A possibilidade de ver, no artesanato, uma fonte de renda foi apresentada para a artesã Aurenice das Neves Oliveira no ano em que o Centro Mulheres de Barro foi inaugurado em Parauapebas. Ao conhecer o trabalho das mulheres artesãs, Aurenice logo estabeleceu uma conexão com as memórias da própria infância e, desde então, segue no caminho do artesanato cerâmico.

“Eu conheci o trabalho delas através de uma colega que já fazia parte do grupo. A gente trabalhava na mesma escola em que nós éramos professoras e ela me convidava para vir conhecer o trabalho delas. E assim que eu conheci, eu comecei participar das formações”, recorda.

“Era uma coisa que me atraía porque eu fui criada no interior do Maranhão e na minha infância eu tinha muito envolvimento com isso, de produzir coisas com barro. Quando a minha avó, que era aposentada, ia tirar o dinheiro dela em outra cidade, ela trazia lembrancinhas de barro para mim, como panelinha, potinho, miniaturas de barro. Então, aquilo já trouxe a memória da minha infância”.

O trabalho que as artesãs faziam chamou a atenção de Aurenice e ela acabou sendo convidada a participar da cooperativa como cooperada, atuando na área de desenvolvimento da produção artesanal. Ao mesmo tempo, ela pôde garantir uma fonte de renda no momento em que mais estava precisando.

“Para mim não foi difícil trabalhar com a cerâmica porque eu já tinha essa vivência, então foi mais o despertar mais uma habilidade”, conta.

O grupo Mulheres de Barro nasceu no período entre 2005 e 2011, fruto das oficinas do Programa de Educação Patrimonial, dentro das atividades ambientais realizadas pela Vale e pela Fundação Vale, durante a implantação do projeto Salobo.

“Em 2016 eu também estava sem renda, então, eu fui convidada para participar e as meninas me ofereceram até um trabalho no projeto e claro que eu aceitei de imediato e vim para participar junto com elas dessa produção artesanal e das atividades. Eu me identifiquei bastante, a gente participou das formações, das oficinas de design, de produção cerâmica e com isso a habilidade do desenho, da pintura foi só aflorando mais. Desde 2016 estou nessa parte da produção artesanal”, conta.

Também no caso da artesã Adi Marilda Batista de Souza, a relação com a cerâmica se fortaleceu depois que ela começou a fazer parte da formação que deu origem ao trabalho das Mulheres de Barro. À época, ela procurava por uma atividade que a ajudasse a ocupar o tempo e o que ela encontrou foi muito mais do que isso.

“Eu já gostava de artesanato e uma vez eu encontrei com a Sandra, que eu já conhecia e gostava do trabalho, e perguntei se estava tendo alguma coisa de artesanato porque eu queria fazer algo para não ficar muito tempo parada, alguma coisa como uma terapia. E ela disse que teria um curso de Educação Patrimonial e eu disse que podia me inscrever”.

Integrando a turma de Educação Patrimonial realizada em decorrência do Projeto Salobo, quando ela teve o primeiro contato com a produção cerâmica, Adi foi uma das mulheres que deram início à cooperativa que hoje atua em Parauapebas.

“Eu gostei tanto do artesanato cerâmico que continuei. Depois a gente já formou a cooperativa e hoje eu trabalho também com cestaria de taboa. Sempre que precisa de alguma coisa de embalagem na cooperativa eu faço, mas não deixo de ir para a mesa na cerâmica também. Para mim começou como uma terapia e hoje eu acho que já até curei a minha ansiedade. Estudar, conhecer a terapia do barro é muito bom”.