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Dia Internacional da Animação é celebrado pelos profissionais paraenses

Icamiabas na Cidade da Amazônia, série animada de Otoniel Oliveira, é uma das produções paraenses de sucesso. FOTO: DIVULGAÇÃO
Icamiabas na Cidade da Amazônia, série animada de Otoniel Oliveira, é uma das produções paraenses de sucesso. FOTO: DIVULGAÇÃO

Texto: Aline Rodrigues

Há anos que as animações deixaram de ser vistas apenas como coisa de criança e filmes desse gênero conquistam cada vez mais adultos. Grandes estúdios como a Disney/Pixar, DreamWorks Animation e a Illumination Entertainment produzem anualmente filmes que são sucessos de bilheteria e conquistam públicos de todas as idades, divertindo e emocionando. Aqui pelo Pará, já temos muitos profissionais talentosos no mercado de animação, gênero celebrado internacionalmente nesse 28 de outubro.

Alguns como o quadrinhista, ilustrador, professor universitário, animador e diretor de filmes de animação Otoniel Oliveira, que integra o estúdio Iluminuras. “Trabalhar como animador hoje em dia tem uma facilidade mais prática do que antes: se pode ter acesso a equipamentos mais baratos e se pode colaborar, pela internet, com projetos produzidos em qualquer parte do mundo. O setor de animação se adaptou muito bem ao trabalho remoto na época da pandemia. Grande parte do estúdio Iluminuras mesmo funciona pelo Discord [aplicativo de voz e comunicação de texto]. Mas isso também atrapalha a parte criativa, o senso de comunidade de artistas juntos, trocando feedback, tomando café, compartilhando piadas, e visão de mundo. É um equilíbrio que faz falta no dia-a-dia cada vez mais on-line do animador, e isso tem facilitado [síndrome de] Burnouts”, diz Otoniel.

Quadrinhista profissional com trabalhos no currículo como “MSP 50” (da Mauricio de Sousa Produções) e os autorais “Belém Imaginária” e “Pretérito Mais Que Perfeito”, Otoniel conta que a animação entrou na sua vida desde muito pequeno, assistindo a desenhos animados, que segundo ele, ainda são em sua grande parte para o público infantil. “Tem algo muito mágico e poderoso em se construir movimento a partir de algo criado ou desenhado. Fazer um mundo a partir de uma vontade estética. Daí para animar e trabalhar com isso, foi só encontrar as condições de possibilidade necessárias para qualquer campo profissional. No caso da animação, foram eventos como o Animamundi que deram experiência e caminhos e o financiamento público para curtas e séries. Animação é softpower, é um investimento inteligente em qualquer parte do mundo”, defende ele.

Otoniel, entre outros trabalhos, dirigiu, escreveu e animou a série de interprogramas “Icamiabas na Amazônia de Pedra”, ganhadora do prêmio de Melhor Série de Animação no Festival Animaí, e também foi animador, storyboarder e cenarista da série de interprogramas “Tu Conheces?”, dirigida por Petrônio Medeiros, ambas com financiamento da TV Cultura do Pará. Também dirigiu e animou o curta “A História de Zahy” (2017), realizado pelo edital de bolsa de pesquisa e experimentação artística da Fundação Cultural do Pará, premiado por melhor direção na Mostra Sesc Pará e vencedor do prêmio especial no IV FICCA – Festival Internacional de Cinema do Caeté.

Para o animador, atualmente existe no mercado uma facilidade maior para a qualificação da mão de obra, por ter muito conteúdo de formação disponível na internet. Logo, foi um campo de estudo que se diversificou. “Não precisa mais viajar para alguma escola ou universidade para se tornar um técnico competente nas ferramentas, mas ainda precisa que se tenha e se conheça amigos ou outros profissionais para fundamentarem aquele conhecimento técnico em um conhecimento conceitual”, explica Otoniel. “Sempre no estúdio temos uma parte do projeto voltada para formação. Vamos começar uma turma agora, por exemplo. A gente pega aquele interessado que já sabe algo da ferramenta, ao menos o básico, e conversa com ele sobre os fundamentos do que é expressividade para animação”, completa.

Anseio é por polo de produção local

Otoniel lembra que o mercado da animação no Pará passou por uma fase muito boa, onde ele e sua geração tiveram origem, período da bolsa de pesquisa e experimentação artística do antigo Instituto de Artes do Pará-IAP.

“Nela a gente pôde experimentar um monte de curtas de um monte de estilos. Depois veio o [projeto] ‘Cultura Animação’, da Funtelpa, que deu o pontapé para criação de séries, o que aconteceu efetivamente com o Edital Cultura de Animação, de onde veio as ‘Icamiabas na Cidade Amazônia’. Infelizmente o segundo edital, em que se ia produzir duas séries novas, está travado desde 2018. Passamos por um hiato muito grande de produção, tendo vivido esses anos em que a política escolheu a arte como um dos inimigos por ignorância”, pontua Otoniel.

Outro talento papa-chibé da animação é Ítalo Rodolpho, 29 anos, roteirista e produtor multimídia com trajetória na área audiovisual. Com experiência em produções como editor, roteirista e produtor, colaborou em diversos projetos, incluindo o videoclipe “Não vou sair daqui”, o game mobile “Protetores do Mangue” e as animações de videomapping do projeto “Sons, Cores e Sensações” dos últimos três anos.

“Trabalhar como produtor requer um esforço de organização, entendimento de todos os processos da animação e de liderança. Na área de produção, infelizmente não é algo em que encontramos cursos específicos. As escolas que temos são a prática diária e materiais soltos, a maioria em inglês”, detalha Ítalo, que tem na cabeça a ideia do que seria necessário para impulsionar a cena da animação paraense.

Ítalo Rodolpho produtor de animações paraenses, já atuou em projetos como os videoclipes animados “Galerinha da Casa”, disponíveis no YouTube FOTO: DIVULGAÇÃO

“Se tivermos pessoas experientes voltadas a essas práticas, podendo organizar oficinas de capacitação e também de divulgação, pois a maioria das pessoas sabe o que um animador faz, um roteirista faz, um cenarista faz, mas muitos não sabem o que um produtor faz. Sempre me perguntam o que é o meu trabalho quando digo que sou produtor”, disse ele, que se destacou também como cocriador das webtiras “O Mágico Se”, vencedor do 1º Prêmio Pretas Potências pela revista “Ju Desguiada e a Carne mais barata” e na produção de videoclipes animados infantis como “Galerinha da Casa”. Recentemente, produziu série de animação adulta frame-a-frame chamada “Wardogs”, demonstrando versatilidade e paixão pela criação de histórias de qualidade.

“O papel do produtor é sonhar com a concepção do produto, mas sempre colocando um ou os dois pés na realidade, no que é possível fazer dentro do prazo, da técnica e principalmente do orçamento, quase sempre limitadíssimo”, acrescenta ele.

Sobre a cena da animação local, o artista prefere comemorar os ganhos. “Sinceramente, só o fato de ser produzida animação na Amazônia, com todos os perrengues, com falta de incentivo político e até social, já é uma conquista. Eu sinto isso sempre que assisto a um curta-metragem novo feito por paraenses. Sinto uma vitória!”, declara Ítalo, lembrando que temos algumas produções premiadas.

“A mais recente que conheço foi o curta animado de terror ‘Caçador de Cabeças’, que venceu algumas premiações como o festival ‘Brazil New Visions Internacional Film’, além de ter sido exibido em inúmeros outros festivais pelo Brasil”, cita Ítalo, referindo à produção de 2021, roteirizada e dirigida por Rod Rodrigues. “Além disso, tem outras animações seriadas que já rodaram a TV Cultura por algum tempo como ‘Os Dinâmicos’ [trabalho dos animadores do Muirak Studio, com direção de arte do experiente Cássio Tavernard, mesmo de “A Turma da Pororoca”] e na TV Brasil, a série ‘Brinquedonautas’ [dirigida por Andrei Miralha e Petrônio Medeiros]. Mas para os grandes streamings não conheço algum que chegou lá, ainda”, conta.

Com oito anos de experiência na área de animação e ilustração, o ator, ilustrador e animador 2D, Giza Santos, também é um desbravador do mundo da animação paraense e acumula no currículo vídeos e cartilhas educativas para a ONG Rádio Margarida. Atualmente é animador sênior do Alopra Estúdio, trabalhando nas técnicas 2D cut-out e tradicional, além de trabalhar para vários estúdios do Brasil e exterior.

“Comecei na animação em 2015, no estúdio Iluminuras, em um curso, onde alguns alunos ficariam para trabalhar na produção da série animada ‘Icamiabas na Cidade da Amazônia’. Fui um desses animadores escolhidos, e a partir daí comecei nessa jornada, trabalhando para vários estúdios do Brasil. Participei de vários projetos nacionais e internacionais, como ‘Brinquedonautas’ , ‘Rick and Morty’, ‘Agente Elvis’ e outros”, enumera Giza.

Segundo o artista, graças à possibilidade de home office, o mercado de animação tem se expandindo cada vez mais. Isso fez com que profissionais digitais começassem a enxergar a animação como um meio de trabalho aqui no estado. “Até meados de 2020, se quiséssemos trabalhar com animação, tínhamos que ir para outros estados, como Rio de Janeiro e São Paulo. Isso por termos pouca mão de obra e visibilidade no mercado de animação. Sem falar em poucos estúdios de animação aqui em Belém, por exemplo. Graças ao retorno das leis de incentivo à cultura e ao audiovisual, esse cenário vem mudando”, conta ele.

O animador e ilustrador Giza Santos é animador sênior do Alopra Estúdio e trabalha também em outros projetos. FOTO: acervo pessoal

Para Giza, hoje existem mais pessoas interessadas em aprender animação e vários animadores já bem firmes no mercado, que têm a intenção de criar conteúdo totalmente nossos, com mão de obra local.

“Além de estarmos criando esses projetos nossos, com a nossa cara, o caminho é que tenhamos um polo de animação aqui no Norte e muito mais profissionais da área trabalhando aqui e produzindo coisas para o mundo”, finaliza Giza, que sonha em ter um estúdio-escola em Belém.

 

SAIBA MAIS

Por que hoje é o Dia Internacional da Animação?
Há 131 anos, no dia 28 de outubro de 1892, Emile Reynaud apresentou a primeira projeção pública de imagens animadas do mundo. O evento ocorreu no teatro de Reynaud e exibiu o filme “Pauvre Pierrot”. Porém, apenas em 2002 a ASIFA (Associação Internacional do Filme de Animação) instituiu o Dia Internacional da Animação.