A importância das políticas de fomento para o setor cultural vai além da promoção artística. No último ano, o setor gerou 7,8 milhões de novos postos de trabalho: o maior número desde 2012. Na Amazônia, que historicamente enfrenta inúmeros desafios para obter financiamento no setor, o cenário também tem ganhado fôlego e o fortalecimento das leis de incentivo tem papel fundamental para isso.
A volta da Lei Rouanet, depois de quatro anos suspensa, e o aumento do teto da Lei Semear no Pará impactaram numa onda de eventos culturais no estado. Em 2024, o edital da Semear passou a aceitar inscrições de dois projetos por proponente, no limite total de R$ 600 mil por submissão – R$ 200 mil a mais do valor anterior.
“Eu estou observando no mercado um grande crescimento nos investimentos das empresas nas leis de incentivo. É imperativo frisar que a volta do Ministério da Cultura e das políticas de incentivo, principalmente, para a cultura amazônica, tem potencializado e muito a retomada e o protagonismo da região na produção cultural”, garante Lanny Cavalléro, profissional do setor cultural há 23 anos e diretora executiva do Festival Aceita, que estreia em 2024 com um line-up LGBTQIA+ de artistas regionais, nacionais e internacionais após quatro anos de esforços para ser erguido.
“Vejo que as marcas estão mais abertas a ouvir e a investir na Amazônia, dada a importância e singularidade da região como sede da COP 30 e de seu grande papel para a justiça climática e alternativas para sustentabilidade ou a transição ecológica que encontra-se em nossa vivência com a natureza”, celebra Lanny.
No Pará, a Lei Semear movimentou R$ 17 milhões em 2023, e a projeção é que chegue a R$ 20 milhões este ano, uma dinâmica capaz de gerar emprego e renda a milhares de pessoas. “Com as captações realizadas a partir dos recursos de 2023, de acordo com os proponentes dos projetos, foram gerados cerca de 70 mil empregos diretos e indiretos”, destaca Carmem Fischer, secretária executiva da Semear.
CUSTO AMAZÔNICO
Produtor que atua na cena de Belém há 16 anos, Gibson Massoud destaca as especificidades de promover eventos culturais no Norte – desafios que tornam ainda mais fundamentais as leis de incentivo para o setor. “A gente sempre conversa com os empresários dos artistas e produtores de outros estados sobre o ‘custo amazônico’. Temos sérios problemas logísticos, malha aérea complexa, clima diferente e menos patrocínios que as outras regiões”, pontua.
Além do custo amazônico, Massoud destaca que os preços dos serviços após a pandemia aumentaram muito, o que onerou ainda mais a promoção de eventos culturais no Norte. “O aumento do teto da Lei Semear foi fundamental, pois o mercado pós-pandemia é outro. Os preços dos fornecedores, cachês artísticos e passagens aéreas, praticamente triplicaram. A Lei precisava acompanhar o mercado”.
A reativação dos editais desengavetou um dos projetos de Massoud: o Festival Sunset, que teve sua primeira edição em 2018 e foi descontinuado por falta de apoio financeiro. Este ano, o line up traz nomes de sucesso internacional, como a cantora Marina Sena, além do cantor Silva, destaque na nova MPB, e Zaynara, estrela do beat melody.
“Só está sendo realizada a segunda edição do Sunset agora, depois de seis anos, pela falta de patrocínio. As leis de incentivo são fundamentais para que os patrocínios aumentem na região. Sem as leis, 80% dos projetos nem existiriam aqui”, diz Massoud.
NORTE NO CENTRO
Realizado na Amazônia há doze anos, um dos maiores festivais independentes do Brasil comprova esse momento de retomada. Com diversas edições realizadas “na garra”, o Festival Psica acontecia graças a uma vaquinha colaborativa que juntava verba entre amigos.
“A gente financiava e executava juntos ali com todo mundo: via o que cada um tinha no cartão de crédito, algumas milhas sobrando, algum dinheirinho. A gente juntava tudo e fazia o festival acontecer. A gente se comprometia em retornar o valor com o que a gente fizesse de bilheteria e bar. Então era meio que um empréstimo coletivo”, explica Jeft Dias, diretor do festival ao lado do irmão Gerson.
Em 2018, o Festival Psica conseguiu girar a chave e passou a ter apoiadores. No entanto, depois da pandemia e em meio a profundos cortes em políticas públicas para a cultura, em 2022, o evento foi realizado sem qualquer patrocínio – um desafio hercúleo. Eis que, em 2023, já com os ventos soprando a favor graças à reativação e ampliação das leis de incentivo, o Psica realizou a maior edição de toda sua história, com mais de 30 atrações gratuitas na Cidade Velha e diversos palcos no Estádio do Mangueirão. Na edição deste ano, o festival já tem shows de Pabllo Vittar, Duquesa e David Assayag (Boi Garantido).
“Esse apoio das marcas via leis de incentivo e renúncia fiscal foi fundamental: cobriu 83% de todo nosso custo, sendo que a maior parte do orçamento é destinado ao artístico e à estrutura”, detalha Jeft sobre o festival, que ao longo de sua trajetória já promoveu mais de 300 shows conectando a cultura popular do Norte a grandes nomes da música brasileira, especialmente focando na cultura preta e periférica.
As empresas estão de olho no momento de reconhecer a importância que a região Norte tem para o Brasil e para o mundo, e o investimento em cultura, enquanto pilar para a identidade de uma comunidade, tem sido cada vez mais relevante. “O Festival Psica emerge como uma vitrine para a diversidade de narrativas culturais, alinhando-se com o nosso compromisso de fomentar iniciativas que promovem a inovação artística e o desenvolvimento econômico a partir do protagonismo regional”, afirma Caroline Afonso, head de ESG do Nubank, uma dessas marcas que garantiram a produção do festival paraense em 2024.
Além de associar suas marcas a eventos que tenham a ver com o público que esperam atingir, investir em projetos culturais também dá retorno fiscal às empresas. “Por meio dos incentivos fiscais ligados à cultura, queremos impulsionar pessoas, ideias e iniciativas que celebram a brasilidade e fazem a diferença de norte a sul, entregando sempre o melhor do Brasil, onde a cultura e a inventividade pulsam em todos os cantos”, declara Laura Motta, gerente sênior de Sustentabilidade do Mercado Livre no Brasil, outra apoiadora do Psica este ano, como ela diz, “para celebrar a potência da cultura amazônica!”
PROGRAME-SE
l Festival Aceita
Quando: 23 a 25 de agosto
Ingressos: sympla.com.br
Saiba mais: @festivalaceita
l Festival Sunset
Quando: 31 de agosto
Ingressos: bilheteriadigital.com
Saiba mais: @festivalsunset.pa
l Festival Psica
Quando: 13 a 15 de dezembro
Ingressos: ingresse.com/festivalpsica2024
Saiba mais: @festivalpsica