CULTURA

Boi-bumbá é festa nos bairros de Belém

Brincantes da capital voltam a seguir a tradição dos cortejos com direito a um boi para chamar de seu

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Boi-bumbá é festa nos bairros de Belém

Arte e memória são evocadas na tradição do Boi-bumbá, que gradativamente, é resgatada nas periferias de Belém. Nas ruas afastadas do centro da cidade, os cortejos indicam que a cultura popular permanece viva e pulsante entre as pessoas. É o que demonstram as programações que ocorrem neste final de semana trazendo a festa do Bumba Meu Boi em vários bairros de Belém.

A lenda do Bumba Meu Boi conta a história de Mãe Catirina, uma mulher grávida com um forte desejo de comer a língua de um boi específico, o mais bonito da fazenda onde ela e seu marido, Pai Francisco, trabalham como escravos. O marido, o Pai Francisco, para atender ao desejo dela, mata o boi e retira sua língua. O patrão, ao perceber a falta do boi, fica furioso. Pai Francisco, arrependido, confessa o que fez. Curandeiros e pajés são chamados e, com a ajuda de forças sobrenaturais, o boi é ressuscitado, marcando o início da celebração. O Bumba Meu Boi é a festa que celebra a vida do boi, a importância do trabalho e a força da fé.

Numa releitura mais atual, pessoas que fazem a salvaguarda da expressão cultural fazem um papel de educar os outros sobre a importância da tradição e da preservação do meio ambiente e a sustentabilidade, como principais linhas de trabalho.

A professora Delmany Gomes é uma dessas pessoas. Ela coordena o Boi Curumim do bairro da Terra Firme, que já existe há 8 anos. E neste domingo, 22, ela reúne a comunidade para realizar um cortejo cultural. O evento começa às 16h, seguido de arrastão cultural, distribuição de mingau e show musical com a banda Parásileiros e a apresentação do Boi-Bumbá Curumim. “Vamos comemorar o aniversário do Boi Curumim com festa na rua. Nas festas, cerca de 200 pessoas nos acompanham. São pessoas de todas as idades e de vários bairros de Belém”, diz.

O projeto Boi Bumbá Curumim se traduz numa tentativa de resgate de uma das mais ricas manifestações do folclore regional, o Boi Bumbá. “Neste projeto, a dança e o teatro, expressões da cultura corporal, são as linguagens artísticas privilegiadas para o desenvolvimento de um enredo inusitado onde indígena, africanos, portugueses expressam as lendas, crenças, hábitos e tradições da cultura local”, comenta Delmany Gomes.

Ela conta que o projeto começou com o Boi Dengo do Parque, que foi criado no ambiente escolar. “O projeto Boi Bumbá Curumim é uma continuidade do trabalho que foi desenvolvido na Escola Municipal Parque Amazônia nos anos de 2001 a 2010, que fez história no bairro da Terra Firme participando de vários eventos e arrastões culturais nas ruas do bairro. Como sequência do trabalho, surgiu Boi Bumbá Curumim que é uma forma de promover e sistematizar a cultura popular, principalmente o folclore, de forma interdisciplinar, sem perder de vista a compreensão e a reflexão crítica dos outros fenômenos e manifestações culturais”.

EDUCATIVO

O projeto envolve diretamente 15 alunos na faixa etária de 7 a 15 anos, que participam de oficinas de danças, teatro, confecção de indumentárias com materiais recicláveis, seminários e pesquisas, além de visitas para troca de experiência com outros grupos folclóricos da comunidade. “O Boi Bumbá Curumim representa para seus atores um resgate das formas de manifestações culturais trazidas à escola, ao mesmo tempo em que possibilita vivenciar uma relação mais próxima com a comunidade circunvizinha à escola. O projeto e mais um caminho possível para promover o sucesso dos alunos, a democratização do espaço escolar e a melhoria da relação da escola com a comunidade”.

“É um trabalho educativo que acontece através de uma brincadeira, uma dinâmica em grupo. O trabalho com o boi-bumbá nos traz ainda um retorno porque as crianças se envolvem bastante. A gente percebe que as crianças ficam mais interessadas no aprendizado e passam a superar a timidez, por exemplo. Na comunidade, essa tradição do Bumba meu boi é importante porque traz uma valorização da cultura popular. Quando comecei, eram outras pessoas e hoje, são os filhos delas que estão participando, o que mostra que uma geração passa para outra essa tradição”, deduz Delmany Gomes.

BOI VAGALUME

O mestre Cuité Marambaia, fundador do Boi Vagalume, é artista plástico, palhaço e poeta. Ele conta que aos poucos ele e uma comissão estão fazendo esse resgate da tradição do boi-bumbá. O cortejo materializa esse desejo de trazer de volta essa manifestação cultural para a Marambaia.

“O Boi Vagalume tem 15 anos de tradição, com um cortejo que sai todo ano. A importância cultural disso é manter viva uma cultura de uma ancestralidade, do indígena e do negro, que durante muito tempo sofreu retaliações. Era no passado, segundo Vicente Salles, uma manifestação cultural, mas era proibida no século 20 porque sua essência remonta a ideias díspares entre a espiritualidade cristã e a umbanda, com a ressurreição do boi feita por um pajé e não pelo padre, de acordo com a narrativa da lenda. Isso parece brincadeira, mas era sério”, comenta Cuité.

Antigamente, havia outros bois. Cuité lembra com saudade quando os bairros pareciam contagiados pela cultura do boi. “Aqui na Marambaia já tiveram outros bois, como o Curió. No bairro Atalaia, tinha o Pai do Campo e na Prainha, o Pingo de Ouro. O boi Curió acabou sendo morto porque o guardião era idoso e os filhos já demonstravam que não tinham interesse em levar adiante essa cultura, então, ele fez um cortejo que simbolizava a morte do boi”, detalha Cuité.

PERTENCIMENTO

“Eu utilizo a cultura para referendar essa luta contra o preconceito e as conquistas sociais da luta do trabalhador. O boi Vagalume ainda não é um boi igual de antigamente, quando saia de um terreiro de umbanda e havia uma teatralização desse movimento, que remonta a uma canção onde Catirina desejava a língua do boi e o cortejo faz referência a essa história. O Boi Vagalume é um boi de homenagem e um boi de cortejo. Nas canções, a gente trabalha muito a questão do cuidado e do pertencimento. Coloco o bairro da Marambaia pra gente sentir que pode cuidar uns dos outros e pegar essa tradição e trazer tudo isso para um contexto de amor e cuidado pelo seu lugar”, afirma Cuité.

Artista plástico, Cuité trabalha ainda com brinquedos de outros bois e manifestações culturais. “Eu sentia a necessidade de trazer esse resgate e eu e o Flávio Gama, fundamos o Vagalume. Ele não atua mais com a gente, hoje trabalha com a confecção de instrumentos. Agora, somos um ponto de cultura e formamos uma comissão que continua resistindo, além de mim, tem a Claudia Santos, o Mateus Moura, a Larissa Mê, o Adilson Santos e Diler Sales. Mesmo tendo apoio cultural ou não, a gente bota o boi na rua, trazendo artistas de outros bois e participando de arrastões de outros bois também, dando prosseguimento com a cultura dos nossos ancestrais”, diz Cuité Marambaia.

É DIA DE BOI!

l Boi Vagalume – Marambaia

Quando: 21/06 (sábado), a partir das 17h ;

Onde: Concentração no Mercado Municipal da Marambaia (Av. Dalva, s/n). Cortejo até a Praça Tancredo Neves.

Quanto: Gratuito.

l Boi Acordado – Pedreira

Quando: 21/06 (sábado), das 9h às 22h;

Onde: Bosquinho da Visconde de Inhaúma, 1215.

Quanto: Gratuito

l Boi da Terra-

Terra Firme

Quando: 22/06 (domingo), a partir das 16h.

Onde: Passagem Nossa Senhora das Graças, 121 (esquina com Passagem Comissário).

Quanto: Gratuito.

l Boi Curumim-

Terra Firme

Quando: 22/06 (domingo), às 16h.

Onde: Rua 2 de junho, 35,

entre Vilhena e Santa Helena.

Quanto: Gratuito.

l Boi Marronzinho –

Terra Firme

Quando: 22/06 (domingo),

a partir de 16h.

Onde: Curral Cultural Seu Cici, Passagem Brasília, 170.

Quanto: Gratuito.