O assassinato brutal da artista venezuelana Julieta Hernández Martínez será lembrado nesta sexta-feira, 12 de janeiro, em atos públicos em mais de 80 cidades brasileiras, em todas as regiões, e ainda na Argentina, Chile, Colômbia, Espanha, Estados Unidos, França, Holanda, México, Portugal e Uruguai. Belém e as cidades paraenses de Alenquer, Santarém (Alter do Chão), Ananindeua e Belterra estão incluídas no manifesto, organizado no formato de uma “bicicletada” e com convite para que as pessoas levem uma flor.
O objetivo é prestar uma homenagem amorosa à artista, que era uma cicloviajante e se apresentava pelas cidades por onde passava, como a palhaça Jujuba, e também pedir um basta contra o feminicídio. Julieta desapareceu no Amazonas às vésperas do Natal de 2023. Foi estuprada e teve o corpo queimado, antes de ser enterrada. Thiago Angles da Silva, 32 anos, e a namorada Deliomara dos Anjos Santos, 29 anos, confessaram os crimes em Presidente Figueiredo (AM) e estão presos.
Artista de circo, Julieta atravessava o Brasil de bicicleta. Saiu do Rio de Janeiro em direção a Puerto Ordaz, na Venezuela, onde sua mãe mora. No caminho, dormia onde era possível. No começo de dezembro último, ela tinha passado por Belém, onde apresentou o espetáculo “Viagem de Bicicleta de Uma Palhaça Só…Sozinha?”, no Teatro Waldemar Henrique. É na frente do mesmo teatro, que o ato iniciará esta noite, às 19h. No mesmo horário, sairá uma ciclopasseata, do Memorial da Cabanagem até o teatro, onde será feita uma grande manifestação.
O ator, diretor e professor Marton Maués, integrante do grupo Palhaços Trovadores, está entre os articulares na capital paraense e falou ao Você sobre o movimento:
P Muitos artistas de Belém conviveram com Julieta e mesmo se apresentaram junto com ela durante passagem dela pela cidade, certo?
R Conviveram, não houve apresentações juntos. Ela ficou hospedada com um grupo de artistas palhaços também, do Circo Matutagem; se apresentou no Teatro Waldemar Henrique, a primeira vez. Disse que era a primeira vez que se apresentava num teatro. Acho que foi a primeira e única. Ela era artista de rua, cicloviajante. Uma migrante venezuelana que passou muito tempo no Brasil. Estava voltando para o seu país, quando foi assassinada. Ela também se apresentou na Casa dos Palhaços.
P Como foi o impacto da notícia da morte dela para ti e os artistas com quem convives?
R Eu fiquei e ainda estou muito abalado. Apesar de termos nos encontrado brevemente, nestes dois momentos, tivemos uma ligação muito forte. Julieta era doce, amável, de sorriso aberto. Todos ficaram chocados, principalmente porque estávamos na expectativa de encontrá-la bem. Ela parou de fazer contato no dia 23 [de dezembro] e havia já uma mobilização nacional em busca de notícias. Como a área em que ela estava tem dificuldades de comunicação, estávamos esperançosos… a notícia foi uma bomba.
P Como surgiu a ideia de fazer um ato em memória dela?
R Foi tão forte a perda dela, para todos, que os coletivos todos de teatro e palhaçaria começaram a se articular para ajudar a família e, depois para, em sua homenagem, deslanchar uma série de eventos de protesto contra o feminicídio, um mal que assola nosso país todo. Há propostas de manter o movimento o ano todo, até que sejam criadas leis de proteção às artistas mulheres viajantes, pontos de apoio etc. Também que se intensifique e entremos todos nessa luta antifeminicídio. Que artistas todos se mobilizem, realizem ações em seus espaços, antes de suas apresentações, de conscientização e luta contra essa barbárie, em memória dessa mulher maravilhosa. Eu, que gosto de desenhar, tenho feito um desenho-homenagem a cada dia.
P Essa mobilização reuniu artistas do teatro, de circo, de outras artes? O que gostarias de dizer às pessoas sobre a importância de se juntar a esse ato?
R Sim, poetas, músicos, dançarinos… É importante se juntar a nós para que possam ser tocados de alguma forma pela vida e trabalho encantador de Julieta Hernandez, a palhaça Miss Jujuba, como nós, que a conhecemos, fomos docemente tocados. E para que, em sua memória, possamos engrossar cada vez mais a luta contra o feminicídio. Basta de violência contra as mulheres!