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As guardiãs do carimbó: mulheres comandam o ritmo

O Festival de Carimbó em Marapanim exalta o novo papel da mulher na preservação desta manifestação cultural secular. Foto: Denilson D'Almeida
O Festival de Carimbó em Marapanim exalta o novo papel da mulher na preservação desta manifestação cultural secular. Foto: Denilson D'Almeida

Denilson D’Almeida

O protagonismo das mulheres no carimbó é, sem dúvidas, a principal pauta que regeu o tradicional Festival de Carimbó em Marapanim, que ocorre este final de semana. A cidade está em festa e exaltando a cultura popular. No centro do palco e nas rodas estão as mestras de carimbó e as instrumentistas que nos últimos anos passaram ocupar cargos que por séculos eram desempenhados apenas por homens.

Esta foi a primeira vez que o festival trouxe uma temática que quebrou paradigmas e se permitiu olhar para dentro do próprio movimento do carimbó, mostrando as gerações futuras que a cultura não pode mais ser patriarcal. Pelo contrário, ela é difundida por todos – por homens, mulheres, idosos, adultos e jovens, independente de gênero.

“A mulher sempre esteve presente ativamente na realização dos festivais e nas rodas de carimbó. São elas que organizam os bingos para conseguir fundos para os festivais nas comunidades, organizam as rodas de carimbó. A nossa função não é só costurar e dançar. Agora estamos mostrando que a gente também pode compor, cantar e tocar. Podemos fazer o que quiser”, destacou Amanda Rabelo, produtora do grupo As Boiunas, formado somente por mulheres.

Dos 42 grupos de carimbó catalogados pelo município, 16 participam do festival em 2022. A maioria não fica na sede do município, e sim nas comunidades rurais e ribeirinhas onde o cotidiano inspira as letras e composições que embalam o ritmo e registram a vivência nestas localidades.

Neste domingo (4), o Festival de Carimbó em Marapanim será encerrado com uma homenagem justa e merecida à mestra Bigica, fundadora do grupo Sereias do Mar. Raimunda Vieira é a primeira mulher a ter o reconhecimento do título de “mestra de carimbó”.

O Sereias foi fundado em 1994 por ela, com a ajuda da mãe, da irmã e do pai – que também era mestre de carimbó. Já tem um CD com 12 músicas autorais gravado e se preparam para gravar o próximo.

“Eu cresci no meio do carimbó, acompanhando o meu pai e meus irmãos que tinham um grupo. Um dia eu precisei do grupo deles para tocar e eles não puderam se apresentar. Era dia de futebol. Então tive a ideia de fundar um grupo só com mulheres. O papai e os meus irmãos ensinaram a gente tocar”, lembrou mestra Bigica.

Para ela, ser homenageada no festival, ainda em vida, é uma honra que compartilha com todas as mulheres do grupo e do carimbó. “Nunca imaginei que aos 62 anos seria homenageada. Isto significa muito, não só para a minha pessoa, mas todas nós, mulheres. Dedico isto a minha mãe, que hoje não está mais conosco”, projetou.

As mulheres comandam o ritmo do carimbó em Marapanim. Foto: Denilson D’Almeida

Mestra Bigica mora na comunidade de Vila Silva, distante a 35 quilômetros do centro de Marapanim. O vilarejo, de 255 habitantes, tem na agricultura familiar a principal atividade econômica. No quintal da casa da mestra funciona uma casa de produção de farinha de mandioca. Durante o dia ela, a irmã e as sobrinhas lidam na lavoura. À noite, ensaiam para as apresentações e shows.

O grupo Sereias do Mar é um dos poucos que conta com um centro próprio (alguns chamam de barracão) para guardar os instrumentos e ensaiar. “A gente quer transformar o centro cultural num grande espaço de aprendizagem, ensinando música, artesanato, costura e produção de instrumentos. Queremos ensinar os nossos filhos e netos para manter viva a cultura do Carimbó e repassá-lo de geração a geração como sempre ocorreu”, projetou.

Hoje, os netos de Bigica já ensaiam no curimbó, um dos principais instrumentos para se tocar o carimbó. Os meninos são chamados carinhosamente de “botos” numa espécie de trocadilho por serem os únicos do sexo masculino a participar das rodas de carimbó.

O Festival de Carimbó é uma realização da prefeitura de Marapanim, em parceria com a Associação Marapaniense de Turismo (Amatur), e viabilizado pelo Governo do Estado, por meio da Fundação Cultural do Pará (FCP), com patrocínio da Equatorial, por meio da Lei Semear.