TEXTO: ALINE RODRIGUES
Em determinado momento de nossa vida, temos a convicção de que está na hora de partir rumo à realização dos nossos sonhos. Às vezes é uma percepção clara, às vezes nem tão clara, é uma intuição talvez. Mas, se você é daqueles que não espera uma crise para descobrir o que é importante na vida, você vai para cima, vai à luta! Deixa a sua zona de conforto…E vai viver suas novas vivências… Mas, sabe o que é bacana? É a gente se ver em Belém, de fora de Belém. A gente tem um outro olhar…a gente se vê na real …a vida vai ficando cada vez mais dura perto do topo! Da velhice, mas perto da vitória, também!!! Você reflete: E o que te vem na cabeça? Vem algo tão simples de dizer, mas que é um afago na alma da gente: a gente sai de Belém, mas Belém não sai da gente. Aí, vem o orgulho danado de poder dizer: sou do Norte… sou da Amazônia…sou brasileiro! Ah!, Tô voltando!…”
Este é um trecho do livro “Vertentes do mesmo rio”, que está sendo escrito pelo guitarrista paraense Manoel Cordeiro sobre a sua história e que ilustra bem o amor dessa artista pela cidade que hoje completa 407 anos. Um amor que transparece em sua música, cheia do ritmo vibrante que esquenta a noites da capital paraense.
Cordeiro é natural de Ponta de Pedras, no Marajó, mas ainda criança mudou com a família para Macapá (AP) e aos 19 anos foi acolhido pela Cidade das Mangueiras, onde veio tocar em uma banda do também músico Ely Farias. Atualmente, o músico está radicado em São Paulo, mas se prepara para voltar a Belém em definitivo.
Foi aqui que Cordeiro teve contato com músicos que ele considera sensacionais, como Tinnoko Costa, Paulo André Barata e Alcyr Guimarães. “Gravei muitos discos de uma cena de brega/lambada muito forte nos anos 1980. Esse disco que gravei com o Ely Farias em 1974, de carimbó elétrico, me fez despertar o interesse da música vista do ponto de vista cultural, de sentimento de um povo. Belém tem muitos artistas da cena do brega marcante e isso fica na tua memória afetiva. Me sinto muito envolvido com Belém, com o jeito de ser, com o sotaque, com o Ver-o-Peso, sabores, amores e o jeito das pessoas”, conta Manoel Cordeiro.
O artista se considera um apaixonado pela cidade, onde ele construiu a sua carreira de músico e onde pretende, até o final do ano, viver definitivamente. “Adoro Belém, amo, sou apaixonado pela praça Batista Campos, a mais linda! Construí em Belém uma carreira de músico bem fértil, trabalhei e montei estúdios, bandas. Sinto nesse instante uma vontade de participar mais efetivamente das nossas coisas do Pará, da Amazônia. Até o final do ano volto a morar em Belém, no Jurunas. Muitas pessoas pensam que sou de Belém, outras de Macapá. No filme falo disso, sou marajoara. Oh, sorte!”, conta Cordeiro, se referindo ao documentário sobre a sua história que pretende lançar junto com o livro.
Manu Bahtidão: batizada no tecnomelody
Emanuella Tenório Rocha, que os paraenses e o resto do Brasil conhecem como Manu Bahtidão, nasceu em Major Izidoro, em Alagoas. Mas foi em Belém que se encontrou e foi recebida pela cidade, como ela diz, como uma mãe recebe uma filha: de braços abertos. “Falar de Belém do Pará é me emocionar. Eu digo que Belém do Pará é a minha mãe. A minha mãe que eu perdi quando eu tinha nove anos. Foi a terra que me abraçou, cuidou de mim, me alimentou, educou. Belém do Pará é tudo, tudo de mais importante na minha vida, na minha carreira, claro, junto com a minha família. Eu digo que Belém é o meu lar, assim como dos meus filhos, meu esposo. Belém é o ar que eu respiro”, se derrama Manu.
A artista já chegou a morar em outro estado, mas é Belém que ela considera seu lar, sua terra. Ela se considera patrimônio paraense. “Eu sou muito grata por essa terra, por tudo que ela me deu e me proporcionou. Por todo o carinho, por todo o respeito. E Belém do Pará é algo imensurável para mim, a escolha de morar nesta terra foi simplesmente porque me senti acolhida, amada e porque me encontrei aqui. Certamente em outras vidas vivi por aqui e quando cheguei neste lugar não consegui mais sair”, conta a cantora.
Manu Bahtidão começou a carreira cantando forró, mas se firmou no Pará quando se identificou com o tecnomelody, conquistando o público paraense. Ela participou da Banda da Loirinha, além de passar pela Companhia do Calypso. Mas foi na Banda Batidão que se consagrou no tecnomelody e ganhou seu sobrenome artístico.
“Eu me sinto representante e acredito que o povo do meu Pará, principalmente da minha Belém, [porque o paraense] se sente representado pelo que eu faço, pelas minhas canções, pela minha arte, e sou muito grata por tudo que Belém proporcionou. Te amo, Belém”, se declara Manu.
Naldinho Freire carrega Belém sempre consigo
Paraibano de João Pessoa, o cantor e compositor Naldinho Freire hoje vive em Recife, mas tem em Belém um lugar guardado no coração. Ele conheceu a cidade quando esteve como representante da Funarte para as regiões Norte e Nordeste, em 2015, realizando ações culturais. “Fui recebido pela Cidade das Mangueiras, que tem uma arte potente; a sua música é cosmopolita. Vivi vários anos bebendo das águas paraenses”, diz.
O carinho foi tanto que, entre 2017 e 2020, o artista transformou a cidade em palco constante para o seu trabalho, em locais como o Teatro Margarida Schivasappa. “Atuei com grandes músicos e musicistas de Belém, como Dan Bordallo, Beá, Marcel Barretto, Lucas Torres, Andrea Silveira e Amanda Alencar e Ramón Rivera. Participei também de sessões de gravação em vários estúdios de Belém, como Casarão Floresta Sonora, Apce, Jungle, Budokaos e Fluxo”, relembra.
Em sua atuação artística por aqui, Naldinho desenvolveu projetos de intercâmbio cultural, provocando conexões entre artistas de Belém e de outros lugares, dos estados do Nordeste a Cabo Verde, na África, com shows, lançamentos de livros e de álbuns. É no desenrolar desses trabalhos que Naldinho diz que tem frequentemente levado Belém consigo, ainda que não viva aqui. Em 2019, escolheu a capital para lançar o álbum “Sem chumbo nos pés”, que teve participação de paraenses – Pinduca, Natália Matos, Pedro Vianna, Gláfira, Juliana Salgado e Camila Honda, além de artistas cabo-verdianos.
“O álbum recebeu da crítica especializada uma grande atenção e foi destacado como um dos melhores álbuns do Brasil lançados naquele ano. Com este álbum Belém seguiu comigo por várias cidades do Brasil onde o apresentei, além de outros países”, diz Naldinho, que lembrou que ouvia as canções de Pinduca – um igarapé-miriense que é a cara de Belém – na Rádio Tabajara.
Nessas idas e vindas, os ventos sempre o trazem de volta a Belém. Por exemplo, em 2021, veio lançar a coletânea de artigos “Turismo, Gastronomia e Música – Elos entre Belém do Pará e Cabo Verde”. E assim vai aproveita ndo para matar a saudade. “Consegui encontrar alguns amigos e ir à Ilha do Combu, um dos primeiros lugares que conheci em Belém e que gosto muito”, relembra. “Desejo a Belém e ao seu povo um feliz aniversário! Quero voltar em breve, poder fazer música novamente e encontrar as pessoas que tanto me acolheram”, festeja Naldinho Freire.