Quem acompanha esta coluna, deve ter lido a publicação sobre o caos político que os nossos vizinhos peruanos atravessam. O país entrou nas eleições presidenciais com postulantes à altura da crise que fez o Peru ter quatro presidentes em quatro anos: tinha candidato prometendo curar covid com sal e cachaça, outro conhecido como ”el Bolsonaro de Peru”, a filha de um ex-ditador e Pedro Castillo, o até então desconhecido professor do interior com idéias revolucionárias e declaradamente marxista que parecia não ter chances na acirrada disputa pelo poder. Sabendo que a incerteza é a única coisa previsível na América Latina, Castillo foi eleito presidente do Peru em uma eleição marcada por polêmicas.
Pedro Castillo não é um homem de esquerda qualquer. Apesar de seguir a cartilha ao defender o intervencionismo estatal para sanar as desigualdades, apoiar as revoluções de esquerda e ter seu discurso focado na defesa dos mais pobres, ele também rejeita o discurso da esquerda moderna e já declarou abertamente ser contrário ao aborto, contra o casamento homoafetivo e a favor do fechamento do tribunal constitucional do Peru para combater a corrupção. Não dá para negar que é um personagem peculiar, carregado de opiniões nada convencionais que sem poder político algum, aproveitou a crise na classe política para despontar como a voz daqueles que se consideravam esquecidos, representando também a revolta da população peruana com toda a corrupção latente no país.
A vitória apertada vem acompanhada de diversas dúvidas, especialmente sobre o futuro do país. O Peru encontra-se extremamente dividido, sua opositora não aceitou a derrota e convocou a população às ruas alegando fraude nas urnas, seu partido não tem maioria definida em um congresso que já demonstrou diversas vezes ser intolerante aos presidentes que não lhes convém e, além de tudo isso, as promessas de Castillo são muito difíceis. Com o lema “chega de pobres em um país rico”, o presidente eleito já chegou a prometer 1 milhão de empregos em 1 ano.
Desde o segundo turno e principalmente agora que foi eleito, Pedro Castillo vem tentando suavizar sua imagem ainda vinculada ao radicalismo, já declarou que vai respeitar o jogo democrático e também acenou para o mercado algumas vezes. O problema é que sua eleição não colocará fim à crise instaurada no poder público do país, pelo contrário, levanta mais suspeitas, principalmente de quem tem muito poder e estava acostumado a ter fácil acesso à presidência.
O futuro do país é muito incerto e se antes a crise era apenas no meio político, o novo presidente agora terá ao seu lado um povo que já demonstrou estar disposto a lutar caso haja nova tentativa de golpe. Resta esperar para descobrir se Castillo irá saber lidar com o difícil embate político ou se a máscara democrática irá cair e o professor passará a se inspirar em seu ídolo político: Velasco Alvarado, general de esquerda que deu um golpe de estado em 1968 e implementou muitas políticas que Pedro Castillo também prometeu.
Além da crise política, o Peru também enfrenta uma forte crise econômica e tem hoje a maior taxa de mortalidade por covid do mundo. O povo só quer paz, mas isso ainda parece ser uma miragem.