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Crise migratória na fronteira dos Estados Unidos se agrava e expõe incoerências do governo americano

Tijuana, Baja California / Mexico - April 11, 2021: Graffiti spelling out "wall" in Spanish covers a portion of the USA and Mexico border wall.
Tijuana, Baja California / Mexico - April 11, 2021: Graffiti spelling out "wall" in Spanish covers a portion of the USA and Mexico border wall.

Durante as eleições de 2020 entre Joe Biden e Donald Trump, uma das maiores divergências entre os candidatos era sobre a imigração. Quatro anos antes, Trump havia sido eleito com a promessa de um muro na fronteira com o México, alegando a necessidade de políticas mais duras para evitar a entrada de ilegais no país. Biden criticava duramente as políticas do presidente republicano e dizia que, se fosse eleito, os imigrantes teriam maior acesso aos Estados Unidos, além de afirmar que um cidadão não deveria ser detido simplesmente por tentar cruzar a fronteira do país. A vitória do democrata aconteceu, mas as suas promessas não, e hoje seu governo enfrenta uma das maiores crises migratórias dos últimos anos, fazendo o presidente se afundar na demagogia que tanto denunciou.

Nos primeiros dias na Casa Branca, Biden assinou diversos decretos para reverter as duras políticas imigratórias antes estabelecidas por Donald Trump. A escolha da sua vice-presidente também não foi por acaso: Kamala Harris é filha de pai jamaicano e mãe indiana, ela estava ali para dar o recado de que os Estados Unidos voltaria a ser um país aberto para o mundo. O resultado foi um intenso fluxo de imigrantes, principalmente da América Central, buscando atravessar a fronteira na expectativa que o novo governo fosse recebê-los de portas abertas. A realidade, entretanto, é sempre muito mais decepcionante e o que encontraram foi um imenso esforço americano para barrar a entrada de quem quisesse tentar a sorte no país.

Pela primeira vez em 21 anos, mais de 200 mil pessoas foram presas em um mês por tentar cruzar a fronteira sem um visto. No mês de agosto, o número de detidos foi de 209 mil pessoas. Para se ter uma ideia do quão grave é a situação, em agosto de 2020, ainda sob o governo Trump, 50 mil pessoas foram detidas. Isso significa um aumento de 317% nas apreensões entre os dois governos, com a singela diferença de que Joe Biden prometeu fazer exatamente o oposto.

Desde março, o esforço diplomático para lidar com a crise ficou sob a responsabilidade de Kamala, que recebeu duras críticas pela demora em visitar pessoalmente a fronteira com o México. Além disso, em visita à Guatemala no mês de junho para tratar sobre o alto índice de cidadãos tentando entrar no país, Kamala foi muito enfática: “não venham”. Depois seguiu dizendo que os Estados Unidos iriam proteger as suas fronteiras, chegando até a alertar que quem tentasse atravessar, seria mandado de volta. Convenhamos, esse discurso poderia facilmente ter sido feito por Donald Trump. Essas atitudes e falas controversas, fizeram a popularidade da vice-presidente cair para 42% de aprovação, tornando-a menos popular que Joe Biden.

A américa central historicamente encabeça a lista de países com maior número de cidadãos tentando entrar nos Estados Unidos. A diferença é que hoje em dia a situação é ainda mais grave, já que o número de cidadãos haitianos, cubanos e até venezuelanos que buscam viver no país, aumentou drasticamente. Além desses, os tradicionalmente conhecidos: Guatemala, Honduras, El Salvador e México. São países que passam por instabilidade política, foram sufocados pela pandemia e o agravamento da crise econômica oriunda dela, além do alto índice de pobreza e insegurança. Na busca por uma vida melhor em um país desenvolvido, para muitos, vale tudo. Tentam a sorte em uma travessia perigosa com todos os seus pertences nas costas, às vezes até mesmo mandando apenas seus filhos pequenos para tentarem a sorte. A situação se agrava quando essas pessoas arriscam suas próprias vidas na expectativa de acolhimento do governo americano, que sob nova administração promete humanizar a situação, mas acabam descobrindo que tudo não passou de promessa eleitoral.

Lembro que há alguns anos o presidente da Síria Bashar al-Assad, deu uma entrevista para uma emissora americana onde foi perguntado se ele tinha medo das promessas de Trump para o Oriente Médio e ele disse que não se importava, porque tudo não passava de propaganda eleitoral, tanto dele quanto da Hillary Clinton, e que não fariam nada do que haviam prometido. Assad ainda completou dizendo que as pessoas só deveriam ouvir verdadeiramente quando o presidente fosse eleito e começasse a trabalhar, porque antes disso, não passava de enganação. Talvez ele tenha um fundo de razão.

Enquanto a situação na fronteira não se resolve, a crise humanitária se agrava. Aquilo que foi prometido por Biden em campanha, pelo visto, não passou disso: promessa. No calor do processo eleitoral, sempre há uma tentativa de mostrar que há um lado bom e o lado mau na história, mas na política americana, nem sempre são tão opostos assim. Diferente de Biden, goste ou não, Trump nunca escondeu quem ele realmente é.

“Acuse os adversários do que você faz, chame-os do que você é.”