
O mais longevo festival de dança contemporânea do país trará para Belém, nos dias 16 e 17 de agosto, quatro companhias internacionais e duas nacionais.
Lais Azevedo
“É mais fácil definir o que não é dança contemporânea do que aquilo que é, porque no fundo, ela surgiu na dança como um lugar onde tudo é possível. Tudo é possível no modo de fazer e tudo é possível de ser abordado também”, diz a portuguesa Beatriz Mira, que, ao lado de Tiago Barreiros, chega à Belém com outras quatro companhias de dança internacionais e duas nacionais para a 23ª edição do Dança em Trânsito.
O evento, que recebe patrocínio master do Instituto Cultural Vale, é conhecido como o mais longevo festival internacional de dança contemporânea do país. Ele chega ao Pará neste sábado, 16, com espetáculos sendo apresentados primeiro ao público ribeirinho e visitante da Ilha do Combú. Entre eles, o espetáculo “A CIEGAS”, da Elelei Company, de Barcelona, na Espanha, que cria a partir da metáfora de uma brincadeira de criança.
“Todo mundo já passou por isso: alguém cobre seus olhos por trás e pede para adivinhar quem é. Um jogo simples, feito por crianças ou pessoas muito próximas para nos fazer pensar. Mas e se, de repente, isso se transforma em outra coisa? Há momentos na vida em que as coisas chegam sem avisar, nos obrigando a tomar decisões, a mudar – e a viver essa mudança. Às vezes, esses momentos são visíveis. Outras vezes, não”, diz a sinopse.
Outro destaque da programação ribeirinha é “SOB A PELE”, da T.F. Cia de Dança, de São Paulo. A intervenção artística investiga os rastros que permanecem na relação entre corpo e cidade, que extravasa pelos poros. Ivan Gasparini, diretor da T.F., conta que tudo começou numa investigação sobre o efeito de São Paulo sobre o corpo das pessoas que lá vivem e crescem. “Não é uma dramaturgia descritiva, mas algo compartilhado a partir das tensões musculares, dos movimentos e também dos encontros”, afirma.
Ele destaca ainda o ineditismo que o Dança em Trânsito promove ao levá-los para a região insular de Belém. “Dançar na Ilha do Combu, no meio das palafitas, ao lado da natureza, é quase como uma contraposição ao que a obra [SOB PELE] diz. E da mesma forma, nos desafia a ‘como é que a gente vai carregar um pouquinho de São Paulo para o meio das águas, para esse encontro também com as pessoas locais?’”, aponta.
THEATRO DA PAZ
Depois de passar pela Ilha, os artistas atravessam para Belém e aportam no Theatro da Paz com mais espetáculos, como “DUAL”, da Marcat Dance, companhia de Vilches, na Espanha, que propõe uma jornada sensorial e emocional, com Javier de la Asunción e Alesia Sinato explorando a dualidade humana. “O diálogo entre conexão e individualidade guia a narrativa, marcada pelo risco e pela ocupação do espaço”, definem. E esta é uma versão curta da peça, criada para espaços não convencionais, estreada em Sevilha, ano passado.
Outro destaque é o espetáculo “REZA”, do Grupo Tápias, do Rio de Janeiro. Este, inclusive, é o grupo anfitrião do Dança em Trânsito, tendo sua diretora artística, Flávia Tápias, como idealizadora do festival. A peça apresentada por eles brinca e se emociona com situações do dia a dia em que a oração aparece quase sem a gente perceber: quando o avião balança, quando alguém quer muito que algo dê certo, quando o amor não chega. “Tem quem acenda vela, quem junte as mãos, tem quem dance”, dizem.
COP 30
O festival propõe-se ainda a dialogar com a COP 30, a partir de espetáculos criados para esta edição, alguns durante residências artistas entre companhias internacionais. É o caso de “FAN MADE”, do TOB Group, da Coreia do Sul. Eles contam que na Dinastia Chosun, o leque era um símbolo das pessoas da alta classe, que ainda tentaram manter essa posição mesmo após o fim do sistema de castas. Esses chamados ‘Yangban’ (nobres) chegavam a carregar leques até no inverno. A peça tenta reinterpretar esse fenômeno na vida atual.
RESIDÊNCIA
Belém também recebe uma das Residências de Intercâmbio Profissional com Criação, promovidas pelo Dança em Trânsito. Serão 10 bailarinos e bailarinas paraenses – já selecionados – que serão guiados pelos portugueses Beatriz Mira e Tiago Barreiros na criação de coreografias, fortalecendo a troca de experiências e ampliando o conhecimento dos envolvidos.
“A dança é sobre corpos, e os corpos são a coisa mais humana que nós temos, e enquanto humanos somos seres sociais, e que precisam da partilha para terem uma vida ‘ok’, nesse sentido é essencial também na dança essa partilha. E por isso estamos muito entusiasmados com a residência em Belém do Pará. Será nossa primeira vez no Brasil e vai ser com certeza muito especial conhecer alguns bailarinos daqui, poder também saber deles suas experiências e em conjunto conseguirmos criar alguma coisa nova”, comenta Beatriz Mira.
A dupla também apresenta no Theatro da Paz o espetáculo “CORRENTE”, que acompanha a formação de um ser uno pensando o papel da escolha numa sociedade onde viver implica a dualidade corpo-consciência. Explorando esta conexão, que se traduz em movimento plástico e vital, surge um dueto que procura sensibilizar para a unidade da existência. “[A dança contemporânea] é o lugar que nós encontramos para ir mais longe na expressão humana”, comenta Beatriz Mira.
O 23º Dança em Trânsito é apresentado pelo Ministério da Cultura, através da Lei de Incentivo à Cultura, e além de contar com o patrocínio master do Instituto Cultural Vale, também é patrocinado por Volkswagen Caminhões e Ônibus e Engie Brasil Energia. Em Belém e na Ilha do Combu, a produção local do festival é da coreógrafa Waldete Brito. Até 11 de outubro, o festival ainda passa por cidades como Canaã dos Carajás (PA), Parauapebas (PA), Serra Pelada/ Curionópolis (PA), Entre Rios do Sul (RS) e Florianópolis (SC).
SERVIÇO
Ilha do Combú
Quando: Sábado (16), às 11h
Onde: Espaço ORYBA
Espetáculos: “A CIEGAS” e “SOB A PELE”
Quanto: Gratuito
Belém
Quando: Domingo (17), às 11h20
Onde: Theatro da Paz
Espetáculos: “SOB A PELE”, “FAN MADE”, “CORRENTE”, “DUAL” e “REZA”
Quanto: Gratuito