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A Ciência de Leonardo da Vinci

Proportionsschema der menschlichen Gestalt nach Vitruv ­ Skizze von Leonardo da Vinci, 1485/90, Venedig, Galleria dell' Accademia
Proportionsschema der menschlichen Gestalt nach Vitruv ­ Skizze von Leonardo da Vinci, 1485/90, Venedig, Galleria dell' Accademia

É seguramente verdade o que Ralph Waldo Emerson, filósofo e poeta americano que liderou o movimento transcendentalista no século XIX, escreveu em seu ensaio Autossuficiência, em 1841: “- toda a história se resolve com muita facilidade na biografia de algumas pessoas fortes e sinceras”.

Estamos acostumados a ver Leonardo da Vinci (1452 – 1519) como pintor e não músico, poeta, escultor, arquiteto, engenheiro civil e mecânico, tampouco como cientista. O escritor alemão Herman Grimm o considerou um historiador notável, fazendo referência a sua monografia sobre a vida de Michelangelo.

Fritjof Capra, em seu livro A Ciência de Leonardo (2008), observa que o gênio do Renascimento, apesar do fato de ter sido um dos primeiros grandes inventores de máquinas modernas, contrário à crença comum, não era um pensador mecanicista.

Capra defende, com convicção, que a ciência moderna não começou com Galileu Galilei, mas com Leonardo. Foi ele quem, pela primeira vez, aplicou o método científico, a lógica, a observação e a capacidade de conceituar uma infinidade de dados em uma única coerente e consistente teoria.

Cem anos antes de Galileu, Leonardo desenvolveu uma nova abordagem empírica da ciência, envolvendo a observação sistemática da natureza, o raciocínio lógico e algumas formulações matemáticas – as principais características do que é hoje conhecido como o método científico.

Sua compreensão do mundo era predominantemente visual, assim como seu método científico; baseando-se em observações muito precisas da natureza e de todas as formas de vida.

Mesmo sendo um engenheiro brilhante, Leonardo não considerou o corpo humano como uma máquina. A natureza como um todo estava viva para Leonardo, que conseguiu enxergar os padrões e processos no microcosmo como sendo semelhantes aos do macrocosmo.

Enquanto a analogia entre o microcosmo e o macrocosmo remota a Platão, sendo bem conhecida ao longo da Idade Média e no Renascimento, Leonardo a desvencilhou de seu contexto mítico original e a tratou estritamente como uma teoria científica.

Sabemos hoje que a “vida” não é uma estrutura rígida linear e totalmente mensurável (exceto quando os organismos estão mortos), mas sim uma estrutura não-linear de padrões dinâmicos, que são essencialmente “relacionamentos”.

Capra chega a falar de Leonardo como “um pensador sistêmico”, devido sua forte capacidade de pensamento sintético, sendo capaz de “interconectar observações e ideias de diferentes disciplinas”.

Essa visão vem surgindo há algumas décadas e é chamada de ‘Visão Sistêmica da Vida’. Está relacionada à ecologia profunda e à teoria dos sistemas, sendo desenvolvida, além de Capra, principalmente por Ludwig von Bertalanffy, Francisco J. Varela, Ilya Prigogine, Humberto Maturana e Ervin Laszlo.

O que nossa ciência conseguiu apenas recentemente, nos últimos 30 anos, no domínio da teoria dos sistemas, foi para Leonardo uma “maneira naturalmente orgânica de pensar, pois na essência da sua síntese estava a compreensão das formas vivas da natureza”.

Capra relata que essa busca atingiu seu clímax nos estudos anatômicos que realizou em Milão e Roma, com mais de sessenta anos, especialmente em suas investigações sobre o coração humano, quando ninguém tinha, naquela época, uma ideia de como o coração funcionava.

Leonardo teve uma visão do corpo que precedeu a física quântica e a espiritualidade moderna. Para Leonardo, “o corpo humano era uma expressão da alma; sendo moldado pelo seu espírito”.

Nossas ciências e tecnologias tornaram-se cada vez mais estreitas em seu foco, nos tornando incapazes de compreender nossos problemas multifacetados a partir de uma perspectiva interdisciplinar.

Segundo Capra, precisamos urgentemente de uma ciência que honre e respeite a unidade de toda a vida, que reconheça a interdependência fundamental de todos os fenômenos naturais e nos reconecte com a Terra viva.

O que precisamos hoje é exatamente o tipo de pensamento e ciência que Leonardo da Vinci previu e delineou há quinhentos anos, no auge do Renascimento e no alvorecer da era científica moderna.

Confira o vídeo: