Diário no Qatar

SAQUÊ NO CHOPE ALEMÃO: Japão detona a Alemanha na estreia

O Japão surpreendeu a Alemanha e venceu por 2 a 1. Foto: Fifa/divulgação
O Japão surpreendeu a Alemanha e venceu por 2 a 1. Foto: Fifa/divulgação

LUCIANO TRINDADE
DOHA, QATAR (FOLHAPRESS)

No maior protesto em favor da igualdade de gênero e em apoio à comunidade LGBTQIA+ na Copa do Mundo no Qatar, os onze jogadores da Alemanha posaram para a foto oficial antes da estreia contra o Japão, nesta quarta-feira (23), com a mão na boca, num gesto contra a censura.

Foi a resposta do elenco a alemão ao veto da Fifa ao uso da braçadeira com as cores do arco-íris e a inscrição One Love (Um amor), que seria utilizada pelo capitão Manuel Neuer.
No estádio Khalifa, em Doha, o goleiro usou o adereço oficial da entidade máxima do futebol, com a frase “no discrimination” (não à discriminação). Quando a bola rolou, as duas equipes protagonizaram um bom jogo. E mais uma vez a zebra passeou em Doha, com a vitória de virada dos asiáticos, por 2 a 1.

Gündogan, de pênalti, abriu o placar aos 31 minutos de jogo, após falta cometida pelo goleiro Shuichi Gonda em cima do lateral David Raum. No segundo tempo, ele também quase fez o segundo, mas acertou a trave.

O duelo teve, ainda, dois gols anulados por impedimento, um do japonês Maeda e outro do alemão Kai Havertz, aos 8 e aos 49 minutos da etapa inicial, respectivamente. Depois do intervalo, Ritsu Doan, aos 30 minutos, deixou tudo igual.

Já aos 38 minutos, os japoneses conseguiram a virada, com Takuma Asano. Ele recebeu um lançamento nas costas da defesa, invadiu a área e venceu Neuer com um chute forte.
A zebra na estreia dos tetracampeões mundiais, porém, não ofuscou o protesto da Alemanha, que escancarou a insatisfação das seleções europeias contra a Fifa.

Sete países do continente (Inglaterra, Alemanha, Holanda, País de Gales, Dinamarca, Bélgica e Suíça) pretendiam usar a braçadeira One Love, mas foram alertados de que isso levaria os jogadores a serem punidos com cartão amarelo. No Mundial, com dois cartões acumulados um atleta já deve cumprir suspensão.

“Como federações nacionais, não podemos colocar nossos jogadores em uma posição na qual poderiam enfrentar sanções esportivas, incluindo cartões”, disseram os países em nota conjunta.

A seleção belga pretendia, ainda, usar uma camisa predominante branca, mas com cores do arco-íris espalhadas pelo uniforme, com a inscrição “Love” (amor) na gola. Isso também foi proibido.

As federações criticaram a inflexibilidade da Fifa sobre os gestos em favor da igualdade de gênero. A Dinamarca, por exemplo, ameaça se desfiliar da entidade. Antes da partida com o Japão, o presidente da Federação Alemã, Bernd Neuendorf, disse que os jogadores do país estavam “desapontados” com a proibição.

Nesta quarta (23), o veto à braçadeira era o principal assunto na capa do Bild, um dos principais jornais da Alemanha. Em resposta à situação, a cadeia de supermercados Rewe, uma das maiores patrocinadoras da seleção alemã, informou que vai romper o contrato.

“A atitude escandalosa da Fifa é, para mim, absolutamente inaceitável como CEO de uma empresa diversificada e como torcedor de futebol”, disse Lionel Souque, CEO da Rewe.
No Qatar, a homosexualidade é crime. Manifestações de afeto em público entre homens e mulheres também é proibido. Desde o anúncio de que o país seria a sede do Mundial, a questão foi motivo de preocupação.

A ONG para Humans Rights Watch denuncia que a Polícia da nação do Oriente Médio deteve arbitrariamente e praticou abusos contra migrantes da comunidade LGBTQIA+.

Já durante o Mundial, antes do jogo entre Argentina e Arábia Saudita em Lusail, autoridades locais tomaram uma bandeira do estado de Pernambuco, levada ao estádio por um grupo de brasileiros. Segundo testemunhos que estavam no local, os agentes pensaram que se tratava de uma bandeira de apoio à comunidade LGBTQIA+ por também ter as cores do arco-íris.

Em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo no início de 2020, o secretário-geral do Supremo Comitê da Entrega e do Legado, Hassan Al Thawadi, pediu que as pessoas que viessem ao país estivessem abertas a se adaptar à cultura local.

Na véspera da abertura da Copa, o presidente da Fifa, Gianni Infantino, causou polêmica ao comentar sobre os casos de discriminação no Qatar. Primeiro, ele chamou de “hipocrisia” dos países europeus as críticas direcionadas à nação do Oriente Médio.

Depois, em sua fala que causou mais revolta, ele comparou a discriminação que teria sofrido na infância por ser um itálo-suíço ruivo com a discriminação sofrida por gays e deficientes.

“Hoje me sinto árabe. Hoje me sinto africano. Hoje me sinto gay. Hoje me sinto deficiente. Hoje me sinto como um trabalhador migrante”, falou. “Claro que não sou qatariano, não sou árabe, não sou africano, não sou gay, não sou deficiente. Mas sinto vontade, porque sei o que significa ser discriminado”, acrescentou.