Agência O Globo
O ronco pode reduzir a qualidade do sono, provocar múltiplos despertares durante a noite e ainda indicar uma condição mais grave chamada apneia do sono. O problema faz com que a respiração pare repetidamente durante a noite, às vezes por vários segundos de cada vez. Hoje, há poucas opções para quem sofre com a apneia, mas o primeiro remédio contra o distúrbio pode estar a caminho.
De acordo com a Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia, “a apneia do sono é um grave problema de saúde pública e os dados de prevalência desta doença são alarmantes”. Em estudo realizado na cidade de São Paulo citado pela organização, 32,8% da população geral tinha apneia do sono.
“Em populações de risco para apneia do sono, tais como, populações de obesos e de hipertensão arterial a prevalência de apneia do sono pode ser ainda maior. Portanto, apneia da sono é uma doença muito frequente embora uma grande parte dos indivíduos que a possui permanece sem o diagnóstico”, diz a SBPT.
“A apneia do sono é uma doença pouco diagnosticada porque todo mundo acha que o ronco é só uma coisa socialmente desagradável, que não tem impacto para saúde, mas ele pode ter”, diz Gustavo Moreira, especialista em medicina do sono, no Instituto do Sono.
Assim, é preciso estar alerta para detectar o problema. “Os sinais que indicam apneia são ronco intenso todas as noites, com paradas respiratórias e sensação de engasgo, sono inquieto e acordar diversas vezes para ir ao banheiro a noite. Durante o dia, há prejuízo à atividade cerebral, com sonolência, diminuição do desempenho, da atividade intelectual da memória e até mesmo do desejo sexual”, explica Moreira.
A doença pode desencadear diversos problemas de saúde sérios. “A apneia do sono tem sido associada a uma variedade de condições médicas, incluindo doenças cardiovasculares, acidente vascular cerebral, obesidade, diabetes, ansiedade e depressão”, afirma Danny Eckert, professor na Faculdade de Medicina e Saúde Pública da Universidade Flinders, na Austrália, e pesquisador.
Especialistas na Suécia, por exemplo, já descobriram que a falta de oxigênio que os roncadores e pacientes com apneia do sono sentem pode estar associada a uma maior chance de desenvolver câncer.
Atualmente, o tratamento da apneia do sono é limitado a máscaras de pressão positiva (CPAP), um dispositivo que fornece um fluxo constante de ar através de uma máscara usada enquanto a pessoa dorme, evitando que suas vias aéreas fiquem bloqueadas e permitindo que ela – e seu parceiro – durma em paz e acorde revigorada.
Entretanto, muitos pacientes não se adaptam ao dispositivo. Em alguns casos, também pode haver indicação de cirurgia. Mas isso pode estar prestes a mudar.
Um estudo clínico recente, cujos resultados foram publicados na revista científica Heart and Circulatory Physiology, mostraram que um spray nasal pode reduzir em até 70% os sintomas da doença.
No estudo, os pesquisadores testaram um spray nasal que bloqueia os canais de potássio das vias aéreas. De acordo com Amal Osman, principal e autor correspondente do estudo, esse medicamento tem o potencial de aumentar a atividade dos músculos que mantêm as vias aéreas superiores abertas e reduzir a probabilidade de colapso da garganta durante o sono.
Dez pessoas, sendo cinco mulheres e cinco homens, com idade média de 55 anos e apneia obstrutiva do sono receberam aleatoriamente um de três tratamentos: um spray nasal placebo, um spray nasal contendo um bloqueador dos canais de potássio ou o spray nasal bloqueador com respiração restrita apenas ao nariz, o que envolveu fita adesiva na boca ou no queixo. Em média, os participantes eram obesos, tinham apneia grave, não tinham muito sono e não tinham insônia.
Os participantes completaram três estudos de sono noturno com um intervalo de cerca de uma semana entre as visitas. Os pesquisadores descobriram que sete dos 10 participantes apresentaram uma redução modesta na gravidade da apneia quando o spray nasal foi combinado com respiração irrestrita em comparação ao placebo.
Os níveis de saturação total de oxigênio foram maiores com o tratamento com spray nasal de respiração irrestrita do que no grupo placebo. As medições matinais da pressão arterial também foram mais baixas com o tratamento com o uso do spray.
“O que descobrimos é que a aplicação por spray nasal do bloqueador dos canais de potássio que testamos é segura e bem tolerada”, disse Osman, em comunicado. “Aqueles que tiveram uma melhoria fisiológica na função das vias aéreas durante o sono também tiveram reduções entre 25-45% nos marcadores da gravidade da sua apneia obstrutiva do sono, incluindo melhores níveis de oxigênio, bem como uma redução na pressão arterial no dia seguinte.”
Por outro lado, os participantes restritos à respiração nasal não apresentaram melhora, apesar de receberem o bloqueador dos canais de potássio por spray nasal. Pelo contrário. Os pesquisadores descobriram que a respiração e a função muscular das vias aéreas superiores tendiam a piorar quando uma faixa de queixo era usada durante o sono.
As descobertas do estudo oferecem uma nova forma de expandir as opções de tratamento para apneia. O próximo passo é realizar estudos maiores.
“Neste momento, não existem medicamentos aprovados para o tratamento da apneia obstrutiva do sono, mas através destas descobertas e de pesquisas futuras, estamos cada vez mais perto de desenvolver medicamentos novos e eficazes, que sejam seguros e fáceis de usar”, pontua Danny Eckert, um dos coautores do estudo, em comunicado.