RIO (AG) – A gravidez é resultado da fecundação do óvulo, o gameta feminino, pelo espermatozoide, o masculino. Nas aulas de ciência, aprende-se que isso ocorre por meio de uma relação sexual que envolva a penetração do pênis na vagina. Porém, há relatos raros que desafiam as regras da medicina, em que uma gestação aconteceu após até mesmo o sexo anal ou o oral.
É o que conta o professor da Universidade Lancaster, no Reino Unido, e diretor do Centro de Aprendizado de Anatomia Clínica da instituição, Adam Taylor. Em artigo publicado no site The Conversation, que reúne textos de pesquisadores de diferentes áreas da ciência, ele escreve que “há exemplos de mulheres que engravidaram em circunstâncias extremamente raras, que você esperaria que fossem impossíveis”.
Abaixo confira as 4 delas:
1. Via sexo anal
A gravidez via sexo anal é extremamente rara, mas é possível. Segundo o professor da Universidade Lancaster, ela pode acontecer com pessoas que tenham uma anormalidade reprodutiva chamada de malformação cloacal, que acomete 1 a cada 50 mil mulheres.
A cloaca é um único orifício presente em espécies de répteis e aves, além dos ornitorrincos, que é utilizado para urinar, defecar e reproduzir. Nos seres humanos, o tecido cresce e essa região se divide em duas aberturas, no caso dos homens, e em três, no das mulheres.
Porém, diz Taylor, nos casos raros da malformação, o tecido que divide o reto da cavidade vaginal não se separa completamente, criando passagens internas entre um e outro. “Quando isso acontece, os espermatozoides podem nadar através de qualquer abertura na parede do tecido divisor em direção ao óvulo para fertilizá-lo. O óvulo fertilizado normalmente se implantará no útero, como de costume”, conta o britânico.
“Se você está se perguntando por que os espermatozoides não continuam nadando pelo reto, é porque eles funcionam por quimiotaxia. Isso significa que eles são capazes de detectar traços de substâncias químicas que o óvulo produz. À medida que os espermatozoides nadam em direção ao óvulo, a quantidade desses “quimioatraentes” que eles detectam aumenta, sinalizando para que continuem viajando na direção certa”, continua.
A anomalia exige uma cirurgia corretiva, mas que tem uma alta probabilidade de levar a complicações como insuficiência renal, incontinência, dificuldade para engravidar e maior risco de parto prematuro.
2. Via sexo oral
Uma gravidez relatada após sexo oral é “um dos casos mais bizarros” da medicina, diz Taylor. Tudo começou quando uma jovem que havia nascido sem vagina buscou os médicos com queixas de dores abdominais. Após exames, descobriu-se que ela tinha um feto dentro do útero, e que as queixas eram contrações, pois ela estava entrando em trabalho e parto. Foi realizada uma cesariana e o bebê nasceu.
Por não possuir uma vagina, os médicos começaram a investigar como aquela fecundação teria acontecido. Eles descobriram que exatos 278 dias antes, cerca de 9 meses, a jovem havia dado entrada num hospital com ferimentos de faca no estômago. Os cortes foram causados pelo seu ex-namorado por ciúmes do novo parceiro da menina.
“Descobriu-se que, pouco antes da briga, ela havia feito sexo oral em seu novo parceiro”, conta Taylor. E, quando a cirurgia foi feita para reparar as feridas no estômago, ela “potencialmente lavou qualquer esperma que ainda existisse na cavidade abdominal”, o que eventualmente permitiu que os gametas migrassem em direção ao óvulo e o fertilizassem.
Isso foi possível porque a cavidade peritoneal (o espaço entre os órgãos abdominais e a parede do corpo) contém um fluido que ajuda os órgãos a se movimentarem. “E pesquisas demonstraram que esse fluido também pode ajudar na sobrevivência do esperma, permitindo que ele viaje por essa cavidade até o óvulo”, diz Taylor.
3. Após respingos
Casos de “gravidez por respingos” são outros em que a mulher ficou grávida sem que tenha ocorrido uma relação envolvendo a penetração do pênis na vagina. Assim como os anteriores, também é “altamente improvável”, diz o professor britânico, mas é possível.
São situações raras em que o sêmen respinga na genitália externa e isso já é o suficiente para o esperma entrar na vagina e nadar em direção aos ovários, sem que o pênis tenha sido sequer inserido no órgão feminino.
Mas Taylor explica porque isso é incomum: “Os espermatozoides não sobrevivem por mais de meia hora fora do corpo, por isso é incomum. Embora os espermatozoides saudáveis nadem a uma velocidade de até 5 mm por minuto, eles só sobrevivem por um período limitado de tempo (até cinco dias na genitália da mulher). Das centenas de milhões de espermatozoides que são ejaculados na vagina durante a relação sexual, quando as condições são ideais, apenas 200 a 300 chegam ao óvulo. Você pode ver por que a gravidez por respingo é tão rara”, escreve.
Além disso, ele garante que esse caso não pode acontecer com espermatozoides que estejam na água de uma piscina, no banho ou numa banheira de hidromassagem. “A água dispersa o esperma e dilui o fluido seminal que normalmente protege o esperma da genitália interna agressiva da mulher e do mundo exterior. Produtos químicos como o cloro na água também matam rapidamente o esperma”, diz.
4. Gravidez dupla
O último caso curioso citado por Taylor no artigo envolve o sexo convencional para a reprodução, com a inserção do pênis na vagina, mas surpreende por ser uma gravidez dupla, ou “superfecundação”, em que uma segunda gestação se instala no corpo da mulher enquanto ela já está grávida. Isso pode fazer com que ela carregue até mesmo dois filhos de pais diferentes, como acontece na série brasileira da Netflix “Pedaço de Mim”.
“Nesse processo, uma segunda gravidez se manifesta enquanto a primeira já está em andamento. Esse fenômeno é tão raro que os cientistas não entendem completamente como ele acontece. A maioria dos casos registrados ocorreu em mulheres que usaram a fertilização in vitro”, diz o cientista.
As duas gestações geralmente ocorrem próximas, com duas a quatro semanas de diferença, e os bebês podem nascer ao mesmo tempo, como gêmeos. “Embora haja uma diferença de idade gestacional, a maioria dessas gestações progride normalmente sem complicações além das observadas em geral”, continua o professor.
Mas ele destaca que é bem raro que isso aconteça. “O corpo tem um mecanismo que impede a ocorrência de gestações subsequentes quando a mulher já está grávida. Isso é verdade mesmo para as mulheres que nascem com dois úteros, pois esses mecanismos trabalham arduamente para evitar uma segunda gravidez. Os hormônios impedem a ovulação e produzem um tampão de muco espesso que cobre o colo do útero para impedir que o esperma entre no útero em direção ao ovário”, conta.