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Fiocruz alerta para meningite fatal transmitida por caramujo

Caracol gicante africano apresenta cerca de 7 a 12 cm na fase adulta e pode colocar até 400 ovos por postura (foto: Josué Damacena)    
Caracol gicante africano apresenta cerca de 7 a 12 cm na fase adulta e pode colocar até 400 ovos por postura (foto: Josué Damacena)    

Em trabalho de investigação epidemiológica, o Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) confirmou a presença do verme Angiostrongylus cantonensis, causador de meningite eosinofílica, em caramujo coletado na cidade de Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense. A identificação foi realizada pelo Laboratório de Malacologia do IOC/Fiocruz, que atua como Laboratório de Referência Nacional para Esquistossomose-Malacologia.

O Serviço de Referência foi acionado pela Secretaria Municipal de Saúde de Nova Iguaçu após a confirmação de óbito pela doença na cidade, em 22 de abril. Profissionais da Superintendência de Vigilância Ambiental em Saúde do município (Suvam/Nova Iguaçu) e do Laboratório de Malacologia do IOC/Fiocruz realizaram coletas de caramujos em diferentes pontos do bairro Ipiranga, pertencente à Unidade Regional de Governo de Cabuçu (URG Cabuçu), onde o paciente contraiu a infecção.

O verme causador da doença foi detectado em caramujo aquático do gênero Pomacea, conhecido popularmente como lolô ou aruá. A detecção foi realizada por meio de exame parasitológico dos moluscos e sequenciamento genético do parasito. Um total de 22 moluscos foi analisado. Um molusco da espécie Pomacea maculata estava infectado.

O achado foi comunicado pelo Serviço de Referência à Secretaria de Saúde local e ao Ministério da Saúde (MS).

Após a confirmação da infecção no molusco, outra equipe do IOC/Fiocruz passou a integrar a investigação epidemiológica na cidade. O Laboratório de Biologia e Parasitologia de Mamíferos Silvestres Reservatórios, que atua como Referência Nacional em Taxonomia e Diagnóstico de Reservatórios Silvestres das Leishmanioses, foi acionado pela Superintendência de Vigilância Ambiental em Saúde de Nova Iguaçu.

Os especialistas do Serviço de Referência iniciaram a investigação de campo no bairro Ipiranga com o objetivo de identificar os animais que atuam como reservatórios do verme A. cantonensis na localidade. A atividade contou com colaboração do Laboratório de Pesquisa Clínica em Dermatozoonoses em Animais Domésticos do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz) e apoio da Suvam/Nova Iguaçu.

Ao todo, foram coletados 15 animais, incluindo ratos, gambás e preás. As análises estão em andamento para confirmar a infecção nos mamíferos.

Ciclo da doença 

A meningite transmitida por caramujos é chamada de meningite eosinofílica. A doença é causada pelo verme Angiostrongylus cantonensis. No ciclo de vida desse verme, roedores (por exemplo, ratos urbanos) atuam como hospedeiros das formas adultas do parasito, que se reproduzem no organismo dos animais e geram larvas (formas jovens do verme).

As larvas são eliminadas nas fezes dos ratos e ingeridas por caramujos. Dentro dos moluscos, elas adquirem a forma capaz de infectar animais vertebrados. A infecção humana ocorre quando as pessoas ingerem um caramujo infectado ou o muco liberado por ele, contendo as larvas do verme.

A chefe do Laboratório de Malacologia do IOC/Fiocruz, Silvana Thiengo, alerta para a importância de conscientização sobre a doença, que pode ser transmitida por diferentes espécies de caramujos. “No Brasil, muitos casos são associados ao molusco Achatina fulica, conhecido como caracol gigante africano. Porém, outros moluscos terrestres e aquáticos também podem transmitir o parasito. A população precisa estar alerta para adotar cuidados ao manusear caramujos, higienizar verduras e não ingerir esses animais crus ou malcozidos”, afirmou a pesquisadora.

O responsável pelo setor de Vigilância Malacológica da Suvam/Nova Iguaçu, José de Arimatea Brandão Lourenço, diz que as orientações para a população foram reforçadas na região onde o caso foi registrado. “Relatos indicam que o paciente se infectou ao ingerir um caramujo de água doce cru.  Fizemos ações de reforço das informações para alertar a população na área para evitar novos casos”, afirmou Arimatea.

Sintomas, tratamento e prevenção 

A dor de cabeça é o sintoma mais comum da doença. Rigidez da nuca e febre, que são comuns em outras formas de meningite, ocorrem apenas em parte dos casos de meningite eosinofílica. Alguns pacientes apresentam ainda distúrbios visuais, enjoo, vômito e parestesia persistente (como, por exemplo, sensação de formigamento ou dormência).

Na maioria dos casos, o paciente se cura espontaneamente. Porém, o acompanhamento médico é importante porque alguns indivíduos desenvolvem quadros graves, que podem levar à morte. O tratamento busca reduzir a inflamação no sistema nervoso central e aliviar a dor, além de evitar complicações.

Caracol gicante africano apresenta cerca de 7 a 12 cm na fase adulta e pode colocar até 400 ovos por postura (foto: Josué Damacena)    

 

Por causa da sua grande reprodução e larga distribuição no país, o caracol gigante africano tem um papel importante na disseminação da meningite eosinofílica. Para combater esse vetor, o indicado é realizar a catação manual dos caramujos, da seguinte forma: catar os caramujos usando luvas ou sacos plásticos para proteger a mãos; colocá-los em recipiente com água fervente por cinco minutos; quebrar as conchas e enterrá-las ou jogá-las no lixo (as conchas não devem ser descartadas inteiras porque podem acumular água, tornando-se criadouros do mosquito Aedes aegypti).

Outros cuidados importantes são: não ingerir moluscos crus ou malcozidos, incluindo caracóis terrestres, lesmas e caramujos aquáticos; e lavar bem frutas e verduras, deixando de molho por 30 minutos em mistura com um litro de água e uma colher de sopa de água sanitária, enxaguando-as bem em água corrente antes do consumo.

O alerta vale também para outros estados do Brasil. De 2008 a 2021, o Serviço de Referência para Esquistossomose-Malacologia detectou o verme A. cantonensis em moluscos de 14 unidades da federação. Confira o artigo.

“Esperamos que esse alerta possa incentivar outros estados a manterem a vigilância malacológica. É importante que as Secretarias de Saúde e a classe médica tomem conhecimento desse cenário para uma prevenção efetiva e diagnósticos mais rápidos”, destaca a bióloga do Laboratório de Malacologia Jucicleide Souza.