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Extrato de própolis mostra ação antiviral contra zika, chikungunya e mayaro

Pesquisa conduzida no Instituto Butantan busca identificar um composto que possa ser usado tanto na prevenção quanto no tratamento de arboviroses

 Imagem: Acervo dos pesquisadores
Imagem: Acervo dos pesquisadores

Cientistas do Instituto Butantan, em São Paulo, descobriram que o extrato aquoso de própolis é capaz de combater a replicação dos vírus Zika, Chikungunya e Mayaro. Esses vírus, transmitidos pela picada de mosquitos presentes no Brasil, causam arboviroses, doenças infecciosas para as quais ainda não existem vacinas ou tratamentos específicos. O estudo mostrou que o extrato de própolis foi eficaz na redução da carga viral desses patógenos, quando testado in vitro.

A pesquisa foi realizada no Centro de Toxinas, Resposta Imune e Sinalização Celular (CeTICS), e conduzida pelos pesquisadores Pedro Ismael Silva Júnior, do Laboratório de Toxicologia Aplicada, e Ronaldo Mendonça, do Laboratório de Parasitologia do Butantan. Os resultados foram publicados na revista Scientific Reports.

Análise do extrato de própolis

Este não é o primeiro estudo da equipe sobre o potencial antiviral e antibacteriano da própolis. Em pesquisas anteriores, usando o extrato hidroalcoólico da substância, os cientistas já haviam identificado atividade contra vírus como o herpes, influenza e rubéola. A partir desses resultados iniciais, decidiram testar o extrato aquoso contra outros vírus de relevância para a saúde pública no Brasil.

Para a análise, os pesquisadores utilizaram própolis produzida pela abelha nativa sem ferrão Scaptotrigona aff. postica, originária da região de Barra do Corda, no Maranhão. O material foi coletado por raspagem das caixas de meliponicultura e congelado a -20°C. Após o congelamento, o extrato foi processado até se tornar um pó fino, que foi purificado com água ultrapurificada e centrifugado para separar a cera do líquido, resultando em um produto 100% purificado.

Resultados promissores contra os vírus

Para testar a ação antiviral, as células VERO (originárias de rim de macaco e comumente usadas em estudos virológicos) foram infectadas com os vírus Zika, Chikungunya e Mayaro. O extrato aquoso de própolis foi aplicado em uma única dose de 10% do volume, e os cientistas observaram uma redução significativa na carga viral. O Zika teve uma redução de 16 vezes, o Mayaro de 32 vezes, e o Chikungunya foi o mais afetado, com uma redução de 512 vezes.

Próximos passos da pesquisa

Embora os resultados sejam promissores, eles ainda são preliminares, limitados ao ambiente de laboratório. O estudo continua com uma nova etapa, em que os pesquisadores coletam própolis mensalmente para associar a eficácia do extrato à florada de cada período. Isso ocorre porque as abelhas Scaptotrigona aff. postica utilizam plantas da região do Maranhão, que possuem características diferentes das plantas do Sudeste, e isso pode influenciar os compostos bioativos presentes na própolis.

“Já observamos variações ao longo do ano. Agora, queremos identificar qual época do ano oferece a substância com maior ação antiviral e associá-la à planta que a abelha utiliza para a produção da própolis”, explicou Silva Júnior.

É importante destacar que a própolis utilizada no estudo é diferente daquela encontrada comercialmente. A maioria dos produtos vendidos nas farmácias é um extrato alcoólico que mistura todos os componentes da própolis, geralmente proveniente da abelha Apis mellifera (abelha europeia). No estudo, a própolis utilizada vem da abelha nativa Scaptotrigona aff. postica, e os compostos com atividade antiviral foram isolados e purificados.

A importância dos compostos bioativos

A pesquisa sobre compostos bioativos de origem natural, como a própolis, é um dos focos principais da ciência, especialmente no Brasil, que possui uma enorme diversidade de fauna e flora. O uso dessas substâncias pode não apenas abrir novas possibilidades terapêuticas, mas também reduzir custos na produção de medicamentos.

“Nosso objetivo é identificar um composto que possa ser usado tanto para a prevenção quanto para o tratamento de infecções por esses vírus. Embora ainda esteja cedo para conclusões definitivas, estamos caminhando nesse sentido”, afirma Silva Júnior.

Ainda assim, a jornada para o desenvolvimento de um possível medicamento é longa. “Embora os resultados in vitro sejam promissores, é necessário realizar estudos in vivo, em camundongos e cobaias, antes de realizar testes em seres humanos”, conclui.

O artigo completo, intitulado Antiviral action of aqueous extracts of propolis from Scaptotrigona aff. postica (Hymenoptera; Apidae) against Zika, Chikungunya, and Mayaro virus, pode ser acessado aqui.

Fonte: Agência Fapesp