SAÚDE

Alergias afetam até 40% da população mundial e aumentam no Brasil

Ao passo que as alergias pioram, a medicina avança em novas opções de tratamento que, embora ainda não configurem uma cura, melhoram a qualidade de vida. Confira!

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Alergias afetam até 40% da população mundial e aumentam no Brasil

– Alergias, como as respiratórias e a alimentos, são antigas conhecidas da Humanidade – acredita-se que um dos primeiros relatos seja de Menés, faraó do Antigo Egito, que morreu devido a um choque anafilático causado por uma picada de abelha ou vespa. Hoje, estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS) apontam que até 40% da população global vive com alguma alergia.

Embora não exista um monitoramento oficial sobre o número de pacientes no Brasil, Lucila Camargo Lopes de Oliveira, diretora da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (Asbai) e professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), conta que cerca de 4% da população deve viver com uma alergia alimentar e 30% com uma respiratória, números que muitas vezes se combinam:

– As alergias são uma resposta exagerada do sistema de defesa do organismo contra agentes externos que não deveriam nos preocupar. É um erro de resposta do sistema de defesa. E se você tem alergia a alimento, você tem uma chance maior de apresentar uma alergia respiratória ou de qualquer outro tipo, porque o mecanismo que causa a alergia é o mesmo, só é direcionado para diferentes agentes.

Além disso, a tendência é de alta. Dados do Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS), do Ministério da Saúde, acessados pelo GLOBO, mostram que na última década o número de internações por choque anafilático, reações alérgicas graves, mais que dobrou no país. Em 2024, foram 1.143 casos, uma alta de 107% em relação aos 551 de 2015.

Uma análise do Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS), com base em dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), também revelou que, entre 2019 e 2022, o número de consultas com alergistas e imunologistas cresceu 42,1% na rede privada do país, chegando a 3 milhões de agendamentos no ano.

– Se pensarmos em 20 anos atrás, era muito difícil encontrar uma criança dentro da classe do seu filho que tinha alergia alimentar. Hoje isso é quase uma constante. E sabemos que existem fatores para essa piora, desde a alimentação ultraprocessada até a poluição do ar, inalação de microplásticos, mudanças climáticas. São fatores que podem criar lesões nas mucosas em que recebemos esses alérgenos, a nasal e a gastrointestinal, e favorecer uma alergia – diz Carolina Aranda, alergista e imunologista do Grupo Fleury, também professora da Unifesp.

Lucila, da Asbai, afirma ainda que há um aumento na lista de alimentos que causam alergia, como uma maior prevalência de reações a castanhas e frutas, e cita práticas que elevam o risco de a criança desenvolver o problema, como parto cesárea, uso intenso de antibióticos no começo da vida, falta de aleitamento materno e pouca exposição à natureza:

– Há estudos mostrando que crianças que têm cachorro em casa quando nascem têm menos alergia alimentar aos 3 anos de vida. Porque ela troca bactérias protetoras, que são interessantes para o indivíduo. Nosso convívio com a natureza é extremamente necessário para regular o nosso sistema imune.

Esse aumento não ocorre apenas no Brasil. No Reino Unido, por exemplo, admissões de anafilaxia alimentar em hospitais triplicaram (228%) de 1998 a 2018, de acordo com uma análise publicada no periódico BMJ. Já uma revisão de estudos feita por cientistas italianos no ano passado identificou um crescimento na prevalência da rinite alérgica entre crianças, saindo de 8% no período de 2012 a 2015, para 20%, no de 2016 a 2022.

– Nosso estilo de vida mudou completamente, mas a biologia não mudou no mesmo ritmo porque a evolução humana é muito lenta. Nosso sistema imunológico foi treinado há milhares de anos num ambiente completamente diferente – complementa a pesquisadora americana Theresa MacPhail, autora de “Alérgicos: Como nosso sistema imunológico reage a um mundo em transformação” (Editora Best-Seller).

Ao passo que as alergias pioram, a medicina avança em novas opções de tratamento que, embora ainda não configurem uma cura, melhoram a qualidade de vida e diminuem os riscos dos desfechos graves, e muitas vezes fatais.

Em relação às alergias alimentares, por exemplo, um estudo publicado em abril mostrou pela primeira vez que a terapia com dessensibilização oral, a mais usada hoje em crianças, também funciona bem entre adultos.

Após acompanhar 21 participantes que recebiam doses pequenas e diárias de amendoim, os cientistas do King’s College London, no Reino Unido, observaram que 67% passaram a conseguir consumir o equivalente a cinco amendoins sem reagir.

O conceito de dessensibilização, também chamado de imunoterapia oral, envolve a ingestão do alimento alergênico em quantidades cada vez maiores, com o objetivo de elevar a dose limite que provoca a reação exagerada do sistema imune.

– As alergias alimentares atrapalham muito a qualidade de vida da criança, a família tem medo de colocar a criança na escola, de viajar, porque ela pode comer uma bolacha que tem alguma coisa que não estava escrita e passar mal. E essas possibilidades de tratamento, de chegar até uma quantidade bem razoável tolerada, é uma mudança de paradigma muito importante – diz Carolina.

As especialistas explicam que a dessensibilização tem riscos, por isso precisa ser feita por profissionais especializados e em locais com infraestrutura para lidar com a possibilidade de reações graves. Um dos avanços, porém, tem sido o uso conjunto de anticorpos que minimizam esses riscos.

Além disso, elas contam que novos formatos, como a dessensibilização via adesivos na pele e injeções, estão sendo desenvolvidos. E reforçam que as técnicas são para alergias, e não intolerâncias alimentares, embora seja comum a confusão entre os dois diagnósticos.

– A intolerância não depende do sistema de defesa. A intolerância à lactose, por exemplo, é um problema com a enzima que digere o açúcar do leite. Ele não é bem digerido, fermenta e dá os sintomas gastrointestinais. Já a alergia é a resposta da defesa do organismo que vê essa proteína como algo que precisa ser atacado – explica Lucila.

Em relação às alergias respiratórias, os anticorpos monoclonais, os mesmos que têm auxiliado a dessensibilização alimentar, são o que há de mais inovador, embora o acesso seja restrito, lembra Jamal Azzam, otorrinolaringologista pelo Hospital das Clínicas da USP:

– São medicamentos que agem no sistema imunológico para reduzir sua atividade. Especialmente para pessoas com asma grave, há bastante indicação. São injeções mensais, mas que infelizmente aindatem um altíssimo custo, em torno de 10 a 15 mil reais cada ampola mensal, e precisam de uso contínuo.

Ainda assim, os especialistas afirmam que há anti-inflamatórios e antialérgicos melhores no mercado hoje, que não produzem sono, por exemplo, e auxiliam o controle da doença para a maior parte dos pacientes.

E também confortam os pais: é comum que crianças alérgicas apresentem uma melhora conforme envelhecem, explica Lucila:

– Existe uma predisposição genética, mas no começo da vida o sistema imune está aprendendo, então tem mais dificuldade para discernir o que deve atacar. Com o tempo, com as exposições, vai entendendo. Por isso as alergias são mais comuns no início da vida. Para a maior parte das alergias alimentares que começam na infância, a criança adquire tolerância natural.

Texto de: Bernardo Yoneshigue