DANIELLE CASTRO
RIBEIRÃO PRETO, SP (FOLHAPRESS) – Um levantamento nacional da Fundação do Câncer divulgado nesta quinta-feira (16) mostra que o tabagismo é responsável por cerca de 85% dos óbitos por câncer de pulmão entre homens e aproximadamente 80% das mortes pelo problema em mulheres.
De acordo com o relatório “Câncer de Pulmão no Brasil: por dentro dos números”, publicado pela entidade, fumar é o principal fator de risco para essa neoplasia. O boletim indica que a maior parte dos pacientes com câncer de pulmão é fumante ou ex-fumante, o que representa 86% dos casos masculinos e 72% dos femininos.
Outro ponto destacado pelo estudo é que a maioria dos brasileiros com câncer de pulmão começa o tratamento já no estágio mais avançado da doença. A pesquisa revela que 63,1% dos homens e 63,9% das mulheres com o diagnóstico são atendidos já no estágio IV.
Alfredo Scaff, epidemiologista e consultor médico da Fundação do Câncer, diz que o diagnóstico precoce dessa neoplasia é um desafio para todos os sistemas de saúde do país, inclusive os da área privada, como os de planos de saúde.
Isso porque, além dos sintomas mais brandos no começo da doença, a sintomática inicial, como dores no peito, tosse e expectoração com sangue (hemoptise), são comuns a outras doenças, como tuberculose.
Algumas propostas, como o rastreamento populacional com tomografias de populações mais expostas (grupos de fumantes ou de ex-fumantes “pesados”) poderiam ajudar a diagnosticar o problema mais cedo, mas teriam um custo alto com benefícios que não alcançariam todos os casos. “No Brasil e no mundo inteiro o que nós temos que fazer é melhorar a capacidade de resposta do nosso sistema”, afirma Scaff
A prevenção ao tabagismo e a diminuição do tempo entre diagnóstico e tratamento, portanto, são apontados pela Fundação como etapas fundamentais para melhorar o cenário.
“A prevenção primária desempenha um papel crucial na redução da incidência de câncer de pulmão e, consequentemente, da sua mortalidade. Isso inclui um conjunto de ações de educação, legislativas, regulatórias e econômicas voltadas para a redução da iniciação ao fumo e/ou estímulo à cessação”, aponta o boletim.
O SUS (Sistema Único de Saúde), nesse contexto, é uma ferramenta importante e deve ser usada para facilitar o acesso da população e a investigação dos grupos de risco. “O médico que encontrar aquele paciente de 50 anos de idade, fumante pesado, que está com tosse crônica com certeza vai pedir uma tomografia para esse paciente, vai examinar melhor”, avalia o consultor.
O relatório constatou que, em média, dentre os pacientes que chegaram à unidade de saúde sem diagnóstico no Brasil, mais de 75% conseguiram realizar o tratamento em até 60 dias. Entre os já diagnosticados, porém, cerca de 50% receberam tratamento após 60 dias, sendo as regiões Sudeste e Centro-Oeste as com maiores tempos até o tratamento.
O médico Paulo Sérgio Perelson, oncologista do Hospital Badim (RJ), diz que o tratamento minimiza as chances da doença se disseminar pelo corpo, tornando o tempo um fator diferencial para a sobrevida do paciente. A idade em que se para de fumar também impacta o paciente.
“O ex-fumante sempre vai ter um risco de morte maior do que um não fumante”, diz Perelson. O oncologista aponta, porém, que estudos já comprovaram que quanto mais cedo a pessoa para de fumar, mais chances ela tem de reduzir os riscos de mortalidade, que, em contrapartida, aumentam progressivamente a partir dos 35 anos de idade.
No Brasil, a incidência e a mortalidade associadas à neoplasia pulmonar ainda são consideradas altas. A estimativa do Inca (Instituto Nacional de Câncer) é de que, apenas em 2024, surjam mais de 32 mil casos novos de câncer de pulmão no país, sendo 18 mil entre homens e 14 mil entre mulheres. Em 2022, 29 mil mortes foram provocadas pela doença.
Para o levantamento da Fundação do Câncer foram analisados dados de morbidade de 45.811 pacientes, sendo 25.568 homens e 20.243 mulheres, todos catalogados no Integrador de Registros Hospitalares de Câncer (IRHC) no período de 2016 a 2020.
Foram avaliados pacientes com “tumores malignos primários da traqueia, brônquios e pulmões”, incluindo-se variáveis como faixa etária (até 39 anos, 40 a 59 anos, acima de 60 anos), cor da pele e escolaridade.
Considerou-se ainda tempo entre o diagnóstico e o tratamento (até 30 dias, 31 a 60 dias e acima de 60 dias), estadiamento clínico (estágio da doença) e tabagismo.
Os pesquisadores também compararam a mortalidade proporcional por câncer de pulmão a outras causas e a Covid, no espaço de 2013 a 2022, para evitar a constatação de uma falsa redução nas mortes por câncer de pulmão.
O fator mais impactante, depois do tabagismo, porém, é do da escolaridade e, no Brasil como um todo, a doença reportada pelos registros hospitalares mostra que os pacientes costumam possuir baixa escolaridade (77% e 74,6% de homens e mulheres diagnosticados, respectivamente).
O levantamento evidencia ainda que existe uma diferença acentuada de incidência entre as regiões mais desenvolvidas do país, sendo a Sudeste a de maiores números absolutos de casos (14 mil novos em 2024) e a Sul, segunda em valores totais (8.000 casos), a com maior risco populacional para o desenvolvimento do câncer de pulmão e a com os mais altos índices de morte pela doença.
Entre o público jovem que pode reativar o ciclo, o principal perigo são os cigarros eletrônicos (também chamado de e-cigarettes, dispositivos eletrônicos de fumar ou vapes), que ganharam popularidade nos últimos anos. Esses produtos, além da nicotina, substância altamente viciante e prejudicial à saúde pulmonar, contém também líquidos vaporizados com substâncias tóxicas e cancerígenas, como formaldeído e acroleina, capazes de danificar os pulmões.
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