Quem toma para si a missão de puxar a corda que movimenta a Berlinda de Nossa Senhora de Nazaré inicia a jornada ainda na noite anterior ao Círio. Para garantir um pequeno espaço que permita fechar a mão em torno da corda, centenas de promesseiros passam a noite na Avenida Boulevard Castilhos França, onde o símbolo de devoção é esticado no chão para aguardar o momento do atrelamento à Berlinda. Durante a espera para, enfim, levantar a corda de Nossa Senhora de Nazaré, há quem durma, ore, converse e reencontre amigos.
Já sentindo o cansaço pesando no corpo, a autônoma Maria do Socorro buscava se concentrar para vivenciar, pelo quinto ano consecutivo, a emoção de puxar a corda do Círio. Posicionada ao lado das ferragens da 1ª Estação da Corda, ela chegou ao local ainda às 22h30 de sábado e só iniciaria a procissão por volta das 8h, quando a corda foi atrelada. “O mais cansativo é ter que passar a noite em claro e depois encarar o esforço que é ir na corda. A gente não sabe de onde tira forças, mas quando a gente entrega a corda dela, a sensação é de gratidão e de missão cumprida.”
O que leva a autônoma a participar da corda todos os anos é a saúde da filha. Por esse motivo, não há esforço difícil o suficiente para fazê-la soltar a corda. “Quando vai chegando a hora de levantar a corda, acelera o coração; é inexplicável. Eu sempre fico na 1ª Estação, que fica bem pertinho da Berlinda, então a emoção é ainda maior.”
No caso do agente de portaria Elinaldo Marques, 42 anos, a participação na corda já completa 27 anos. Tudo começou com uma promessa feita por ele e, nos anos seguintes, ele continuou sua missão por pura gratidão à Virgem de Nazaré. “Não existe ano igual. Todo ano é diferente do outro.”
Acompanhado pelos amigos que integram o grupo que, todos os anos, sai junto na corda, Elinaldo não tem dúvidas de que a presença dos amigos ajuda a cumprir a jornada. Neste ano, em especial, o Círio será uma homenagem a um dos integrantes do grupo que faleceu, mas que teve sua memória lembrada na corda do Círio através da enorme bandeira levada pelos amigos. “Faz muita diferença ir na corda acompanhado dos amigos, porque um fortalece o outro. Este ano é um pouco difícil porque perdemos um amigo muito querido.”
A autônoma Silvane Pantoja, 37 anos, também acredita que cada novo ano que ela acompanha o Círio na corda é único. “Eu já participo da corda há 12 anos. É uma promessa que eu pago pela saúde da minha filha, e eu vou participar todos os anos enquanto eu tiver vida”, planeja. “Todo ano eu me surpreendo por conseguir seguir até o final. Eu não tenho palavras para descrever o que a gente sente; a gente só consegue sentir mesmo.”
Quando o administrador José Roberto Costa Santos, 58 anos, saiu na corda pela primeira vez, ainda não existia a organização dela em estações. A corda mantinha o formato anterior, circular. “Quando eu comecei a sair na corda, ela ainda era circular, não tinham as estações e ninguém cortava a corda”, lembra. “Hoje, o que melhorou é que a procissão é bem mais rápida.”
Independente do formato da corda, a certeza que José Roberto guarda com ele é de que, enquanto tiver saúde, ele estará na corda do Círio. “Não tem palavras para explicar o que é estar na corda. Tudo é difícil, mas a fé supera tudo. O que a gente sente é só gratidão por poder estar presente por mais um ano, com saúde e com muita fé. Enquanto Deus e Nossa Senhora de Nazaré me permitirem ter saúde, eu vou estar na corda dela.”