O futebol de seleções tem uma dinâmica completamente diferente do de clubes. Esporadicamente, os elencos se reúnem para dois jogos em nove dias. E todas as principais competições são de tiro curto. Justamente por isso, vencer a Copa do Mundo de 2026 está longe de ser uma meta impossível para o Brasil. Mas o ciclo preparatório, até aqui, foi perdido. E, a pouco mais de um ano do Mundial, a seleção volta ao ponto de partida.
Sem conseguir implementar uma identidade tática e fazer o time apresentar boas atuações após mais de um ano de trabalho, Dorival Júnior deve ser demitido sexta-feira. É quando ele e o diretor Rodrigo Caetano se encontrarão com o presidente da CBF Ednaldo Rodrigues. A insatisfação com o trabalho atual é grande na entidade. O cartola quer fazer com eles uma avaliação do trabalho até aqui, e a expectativa é que o treinador seja informado do fim de sua passagem.
Para a sucessão, um velho nome volta à pauta: Carlo Ancelotti. E é aí que a situação volta à de 2023. Assim como no começo do ciclo, o italiano segue ligado ao Real Madrid, com quem tem contrato até 2026. Na Espanha, especula-se que sua passagem pelo Santiago Bernabéu chegará ao fim após o Mundial de Clubes, entre junho e julho. Ainda assim, a seleção voltaria ao mesmo estágio de espera de dois anos atrás.
Na ocasião, Ancelotti não confirmou o acordo citado por Ednaldo e ainda se mostrou irritado com a situação, já que seu contrato com o Real ia até meados de 2024. No fim, ele renovou com os espanhóis, e o Brasil pagou em campo pela espera.
Vale lembrar que 2023 – com o interino Ramon Menezes e, depois, o temporário Fernando Diniz (acumulando o cargo com o comando do Fluminense) – foi o pior ano da história da Amarelinha desde 1940. Foram cinco derrotas, um empate e apenas três vitórias, com um aproveitamento de meros 37% no período.
De acordo com o site ge, a CBF já retomou o contato com Ancelotti e recebeu uma sinalização positiva. Mas com a condição de que se espere o fim da temporada europeia, já que o Real briga em três frentes: o Campeonato Espanhol, a Liga dos Campeões e o Mundial de Clubes. A questão é o que fazer com a seleção até lá, sendo que ela terá dois jogos pelas Eliminatórias em junho (contra Equador e Paraguai). Demitir Dorival e arriscar um interino? Ou manter o atual treinador numa situação semelhante a de um funcionário em aviso prévio?
Para além de a segunda opção ser constrangedora para o técnico e para a própria seleção, pesa contra sua manutenção o fato de que o trabalho de um ano e dois meses parece não ter mais margem de evolução. Uma fragilidade que, inclusive, se reflete nos números. São sete vitórias, sete empates e duas derrotas. O aproveitamento de 58,7% é o quarto pior entre todos os treinadores com mais de 100 dias no cargo (fica à frente apenas de Luis Vinhaes, com 53,3% entre 1931 e 1934; de Fernando Diniz, com 38,9%; e de Ramon Menezes, com 33,3%).
O topo desta lista negativa, com os três treinadores da gestão Ednaldo, ilustra como o atual ciclo tem sido mal conduzido. As marcas negativas se acumulam. Uma delas foi atingida na goleada em Buenos Aires. O Brasil pós-Copa do Catar chegou a 31 gols sofridos e ultrapassou os 30 de toda a Era Tite, que foi de junho de 2016 até dezembro de 2022.
O sistema defensivo é um dos maiores problemas que atravessa todos os treinadores do atual ciclo. Das 25 partidas disputadas após a Copa de 2022, em apenas seis delas a equipe não foi vazada. Nas Eliminatórias, a seleção já soma 16 gols sofridos e está a apenas um de igualar seu recorde na história do torneio, registrado nas classificatórias para os Mundiais de 2002 e de 2006. E, com mais quatro rodadas pela frente, há um grande risco, inclusive, desta marca ser superada.
A edição atual das Eliminatórias já acumula outros recordes negativos para os brasileiros. A campanha atual é a pior desde que a competição adotou este formato. E, com cinco derrotas, a equipe nunca perdeu tanto no torneio.
Nas duas partidas contra os argentinos, duas marcas caíram. No primeiro turno, no Maracanã, o Brasil perdeu como mandante pela primeira vez nas Eliminatórias. Já no Monumental, na última terça, levou não só sua maior goleada na competição como amargou a pior derrota no clássico nos últimos 61 anos.
Todos estes números e marcas mostram como o ciclo tem sido de desgaste na imagem da Amarelinha. O consolo é que, apesar de todo o tempo perdido, ainda dá para virar esta página e mudar o rumo antes da próxima Copa.
– A gente tem que repensar tudo o que a gente vem fazendo, porque as cobranças vão vir. O povo quer a nossa vitória, Falta só um ano para a Copa do Mundo. Eu já joguei a Copa e não quero perder outra vez – desabafou Vini Jr, numa das declarações dadas após a goleada que melhor traduziram a situação do Brasil.
31 gols sofridos pela seleção após a Copa de 2022
Nos 25 jogos do atual ciclo o Brasil já superou os 30 gols levados em todos os 81 da Era Tite
5 derrotas nas Eliminatórias para a Copa
O Brasil nunca perdeu tantas partidas no torneio e faz sua pior campanha no atual formato
58,7% de aproveitamento com Dorival Junior
O índice do técnico na seleção é o quarto pior entre aqueles com mais de 100 dias no cargo
Texto de: Diogo Dantas e Rafael Oliveira (AG)