DELÍCIA

Vendedores de camarão viram atração e tradição em Mosqueiro

Acomodados em peneiros e em diferentes tamanhos, os camarões rosados dão as boas-vindas, ainda na estrada, aos visitantes que chegam a ilha

Acomodados em peneiros e em diferentes tamanhos, os camarões rosados dão as boas-vindas, ainda na estrada, aos visitantes que chegam a Mosqueiro. Fotos: Irene Almeida
Acomodados em peneiros e em diferentes tamanhos, os camarões rosados dão as boas-vindas, ainda na estrada, aos visitantes que chegam a Mosqueiro. Fotos: Irene Almeida

Acomodados em peneiros e em diferentes tamanhos, os camarões rosados dão as boas-vindas, ainda na estrada, aos visitantes que chegam a Mosqueiro. Distante 70 km do centro de Belém, a ilha é rodeada por rios que garantem fartura a uma experiência gastronômica que é tradição e fonte de renda para muitos moradores locais, o consumo do conhecido camarão regional.

Não é por acaso que a venda da iguaria, apreciada como tira-gosto por muitos visitantes de Mosqueiro, se concentra na saída da ponte Sebastião R. de Oliveira, na PA-391. É exatamente do rio que segue seu curso por debaixo da ponte que dá acesso terrestre ao distrito, o Furo das Marinhas, que os pescadores da região retiram o marisco, coletado nas tradicionais armadilhas chamadas de matapi.

Para que os camarões estejam à disposição dos visitantes, a rotina inicia no anoitecer, por volta de 18h. Neste horário, os pescadores se deslocam para pontos específicos do rio e instalam os matapis. Depois, resta esperar para que, por volta de 1h ou 2h da madrugada, eles retornem para recolher as armadilhas recheadas. O que os pescadores conseguem coletar no dia é negociado com os vendedores de camarão que têm pontos instalados na estrada.

É ali mesmo no acostamento da estrada que a iguaria é preparada. Para deixar o camarão no ponto de ser consumido, o processo é simples. Depois de bem lavados, os camarões acinzentados, ainda frescos, recebem uma boa camada de sal e de limão. Em seguida, são levados à panela que vai direto para o carvão. O fogo alto é o responsável por, em cerca de 20 minutos de cozimento, dar a coloração rosada e característica ao marisco. Cumprido o processo, o produto está no ponto para ser oferecido aos visitantes que passam na estrada rumo ao interior da ilha.

Há anos essa é a rotina do vendedor Fran Marques, que trabalha com camarão desde os 13 anos de idade. A economia gerada pelo marisco faz parte da própria história de sua família. Ele lembra que os tios eram pescadores e a decisão de seguir no ramo, focado na comercialização, foi um caminho natural. “É uma tradição dos meus tios, que eram pescadores. Eles pescavam e eu via. Mas eu só fui começar a trabalhar com camarão com 12, 13 anos. Todo mundo trabalhava com camarão na família e eu também fui trabalhar”.

Fran explica que a maior procura pelo camarão inicia na sexta-feira e segue por todo o final de semana, especialmente aos domingos. Entre a preferência dos consumidores que chegam até o seu ponto, batizado de Barraca do Louro, estão os camarões maiores e mais vistosos, ainda que nem sempre esses sejam os mais consumidos. “Se fizer vontade mesmo, é só do graúdo que as pessoas querem, mas eles querem pagar o preço do miúdo, aí fica difícil. O litro do graúdo tá R$50 e do menor tem de R$20, R$30”, conta. “É que nem o povo fala: se você vier em Mosqueiro e não comer um camarão, você não veio no Mosqueiro”.  

Em todo o tempo que já trabalha com camarão, Fran conta que nunca viu a iguaria faltar. Apesar da abundância, uma característica da atividade desenvolvida pelos pescadores locais pode influenciar a quantidade disponível para venda. “Aqui dá muito camarão, graças a Deus. Mas agora, no tempo do açaí, o camarão falha um pouco porque os pescadores de camarão é o mesmo povo que apanha o açaí”, explica. “Então, eles vão mais pro açaí porque dá melhor pra eles. Depois que acaba a safra do açaí, eles voltam pra pesca do camarão e a quantidade aumenta, a oferta. É quando tem o camarão mais graúdo, tem o Pitu”.

Para além do tira-gosto na beira da praia, o camarão comprado na estrada também é muito consumido como ingrediente de diferentes preparos. Mas um acompanhamento, em especial, é o preferido do vendedor Roberto Carlos da Silva, 56 anos. “Com um açaí é a melhor forma de comer”.

O dono da barraca Camarão do Silva conta que todo o sustento da família vem do marisco comprado dos pescadores locais e comercializado na estrada, em mais um exemplo de tradição familiar.

“O sustento da família é só do marisco, o camarão, o siri. É uma tradição da família também”, conta, ao revelar que trabalha com camarão desde 1980. “A gente compra do pescador e vende. Ele vem fresco e a gente coloca no sal, no limão e faz o preparo dele pra cozinhar”.

Natural de Mosqueiro, Silva acompanha desde muito jovem o interesse dos que visitam a ilha pelo camarão regional. Ele conta que entre os que mais chamam a atenção dos visitantes está o Pitu, considerado o maior camarão de água doce nativo do Brasil.

“Trabalhamos com o Pitu, mas a época que dá é de novembro em diante. Chama a atenção dos turistas porque é grandão, eles tiram foto, levam pra comer”, conta, ao explicar que, muitas vezes, os turistas não se contentam em consumir o camarão apenas ali na ilha. “Tem gente que passa, leva o camarão e gosta tanto que na volta eles compram de novo pra levar pra Santa Catarina, São Paulo, Macapá. Tem muito visitante que procura a gente pra levar porque não tem lá na terra deles”.

Durante o atendimento desses e outros clientes que visitam a ilha, não demora muito para que Silva tenha que responder uma pergunta que sempre se repete, mas cuja resposta é fácil de dar. “Muita gente pergunta: ‘Vocês já devem estar enjoados de comer camarão, não é?’, mas de camarão não se enjoa, não tem como enjoar”.