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Sociedade deve assumir protagonismo durante a COP 30

Realização da conferência na Amazônia dá oportunidade para que os debates levem em conta as realidades locais

Anúncio de Belém na COP 29: cidade se prepara para o evento. Foto: Isabela Castilho / COP 30
Anúncio de Belém na COP 29: cidade se prepara para o evento. Foto: Isabela Castilho / COP 30

Mais do que um espaço de negociação por compromissos capazes de frear o avanço das mudanças climáticas, as Conferências das Nações Unidas sobre o tema costumam abrir caminho para investimentos que permanecem como legado nos países que as recebem. Em novembro deste ano, Belém será palco, pela primeira vez, de um evento internacional da dimensão da COP.

Com os olhares do mundo voltados para a capital paraense, a expectativa é de que este marco histórico deixe frutos que ultrapassem os limites do evento e resultem em melhorias concretas para a população para além de novembro deste ano.

No contexto climático global e da produção científica desenvolvida na região, o Diretor do Núcleo de Meio Ambiente da Universidade Federal do Pará (UFPA), professor Christian Nunes da Silva, considera que a realização da COP tem o potencial de dar visibilidade aos problemas ambientais existentes não apenas na Amazônia, mas também no contexto global, em diferentes países.

“O fato de ser sediada na Amazônia brasileira, no Pará, direcionará o foco para nossos próprios dilemas socioambientais, como o descarte de resíduos sólidos, os impactos dos grandes projetos, o desmatamento, a expansão urbana, entre outros, destacando também a forma como manejamos nossos recursos naturais”, acredita.

“Além disso, será importante evidenciar as experiências exitosas que temos na região, especialmente aquelas relacionadas ao modo de vida amazônico – principalmente dos povos originários e das populações ribeirinhas, adaptadas ao contexto da floresta e dos rios, e que devem ser valorizadas no trato com a biodiversidade amazônica”.

O professor lembra que independente da realização da COP em Belém, a produção científica desenvolvida na região amazônica – fruto de projetos de pesquisa, ensino e extensão –, vem sendo realizada há décadas, sendo, portanto, uma prática contínua que pesquisadores amazônicos vêm conduzindo ao longo dos anos.

“As experiências oriundas dessas pesquisas deverão ser pautadas durante a COP, demonstrando que o que produzimos aqui não é, e não será, resultado do evento, mas sim uma responsabilidade e um legado de quem mora e trabalha na Amazônia”, avalia. “Em outras palavras, nossas produções já abordam os temas que serão discutidos na COP, e por isso devemos assumir o protagonismo, pois conhecemos, de fato, a realidade que estará em pauta durante todo o evento”.

Neste sentido, do ponto de vista da ciência, o professor considera que o verdadeiro legado da COP 30 para a Amazônia deve ser a consolidação de um ambiente permanente de fortalecimento da pesquisa, da inovação e da formação de recursos humanos altamente qualificados na própria região.

“A COP 30 deve deixar como herança o reconhecimento do protagonismo amazônico na produção de conhecimento, valorizando tanto a ciência acadêmica quanto os saberes tradicionais dos povos originários, comunidades ribeirinhas, quilombolas e outros grupos locais. Esses conhecimentos, quando integrados às instituições científicas, potencializam soluções sustentáveis e inovadoras, alinhadas à realidade social, cultural e ambiental da região”, aponta Christian Nunes da Silva.

“O lócus de decisão sobre as prioridades científicas deve estar aqui, com participação efetiva das populações amazônicas, garantindo que os temas de pesquisa e inovação estejam conectados às demandas locais e regionais. Esperamos que a COP 30, mais do que um evento pontual, seja um marco para criar condições estruturais, institucionais e políticas que assegurem que a ciência produzida na Amazônia seja protagonista na construção de soluções globais para a crise climática e para o desenvolvimento sustentável”.

Benefícios também devem alcançar a infraestrutura urbana e logística

A inédita realização de uma edição da Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP) na capital paraense deve deixar um legado também para a infraestrutura urbana e logística.

Em termos de investimentos em Transporte Aéreo, Belém já começa a sentir os efeitos das medidas adotadas em decorrência da conferência. Quando ainda faltavam seis meses para a realização do evento, as medidas de ampliação da malha aérea de Belém já resultavam em um aumento de 50% no número de voos programados para o período da COP30, em comparação com novembro de 2024.

As medidas são resultado de uma articulação do Governo Federal, da Secretaria Extraordinária para a COP30 (Secop), da Secretaria Nacional de Aviação Civil (SAC), do Ministério de Portos e Aeroportos, e da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac).

De acordo com a Secop, o investimento em obras de requalificação e antecipação dos prazos de entrega do Aeroporto Internacional de Belém foi de R$ 470 milhões. Além disso, a Base Aérea de Belém também foi qualificada para receber voos e os chefes de Estado, com ampliação da capacidade das salas de receptivo e salas VIP.

Outra medida é a adoção de ‘estratégia de parking’, que prevê o uso de 27 aeródromos da região como bases de apoio logístico. Os locais servirão para o estacionamento prolongado, pernoite e abastecimento de aeronaves, evitando que o Aeroporto Internacional de Belém fique sobrecarregado com o volume extra de voos previsto para o evento.

Ainda neste campo, o Governo brasileiro informou que Belém já tem garantidos voos internacionais diretos de Lisboa (PT), Fort Lauderdale (EUA), Miami (EUA), Caiena (GF) e Paramaribo (SR).

Impacto Social e Desenvolvimento da COP30

A preparação para a recepção de um evento tão grandioso como uma conferência do clima da ONU também envolve as pessoas que irão atuar durante a conferência. Para muitos, esta será uma oportunidade única de adquirir experiência na atuação em grandes eventos internacionais.

Não à toa, o Programa de Voluntariado da COP30 recebeu mais de 1.900 inscritos. São belenenses que serão capacitados como voluntários para atuar durante a conferência. Como legado, para além da COP, o programa estimulará a formação de jovens líderes comunitários e ajudará no desenvolvimento de habilidades pessoais e profissionais dos participantes.

Mais do que os debates ocorridos durante a COP30, espera-se que a conferência possa resultar também em um legado duradouro de educação ambiental. Um convênio realizado entre o governo federal e a Itaipu Binacional está destinando cerca de R$40 milhões para ações de educação ambiental na capital paraense.

  • O chamado Convênio 71 abrange uma série de ações, incluindo a reforma de Unidades de Valorização de Recicláveis (UVRs) e a estruturação de um Centro de Inovação em Bioeconomia, com o intuito de deixar um legado social;
  • o lançamento do programa Coleta Mais Belém, que envolve diretamente mais de um milhão de pessoas em 37 bairros, em uma ação de estruturação da coleta seletiva em parceria com quatro cooperativas locais; a formação de professores, com seminários planejados para cerca de mil docentes, e a oferta de um curso de ensino à distância em parceria com a Escola Internacional de Sustentabilidade da Itaipu;
  • a elaboração de materiais didáticos e a realização de dez oficinas sobre temas como hortas comunitárias, biojoias, fotografia da natureza, expressão artística com elementos naturais, aproveitamento de resíduos e jogos socioeducativos;
  • a previsão de 68 apresentações teatrais com roteiros focados na temática da reciclagem, a serem realizadas em espaços públicos como feiras e associações de moradores;
  • e a implementação de 36 biodigestores em 32 escolas municipais, atendendo aproximadamente 18 mil estudantes. Os equipamentos transformam matéria orgânica em biogás e biofertilizante, integrando as atividades ao projeto político-pedagógico das escolas.