O Parque Cemitério Soledade, no centro histórico de Belém, avança para a segunda etapa do projeto de restauração que devolve dignidade e valor histórico ao local. Inaugurado em janeiro de 2023 como um parque memorial, o espaço abriga túmulos e mausoléus datados entre 1850 e 1880 e é reconhecido como patrimônio arquitetônico, urbanístico e paisagístico pelo Iphan desde 1964 e pelo município desde 1994.
A nova fase contempla a recuperação de mais de uma dezena de túmulos históricos, entre eles o da chamada “Princesa Cecília” — Cecília Augusta de A. Chermont —, além de sepulturas de figuras como o general Gurjão, herói da Guerra do Paraguai, o cônego Manoel José de Siqueira Mendes, a escravizada Preta Domingas e o menino Zezinho, considerado santo popular.
O projeto é coordenado pela Universidade Federal do Pará (UFPA), em parceria com o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Fundação de Amparo e Desenvolvimento da Pesquisa (Fadesp), Governo do Estado e Prefeitura de Belém, por meio da Secretaria Municipal de Cultura e Turismo (Semcult).
Durante visita técnica realizada na última quarta-feira (23), o coordenador do projeto, professor Alexandre Loureiro, adiantou que a entrega oficial das obras está sendo planejada para ocorrer durante a Semana do Patrimônio, em agosto. “Estamos organizando para o mês de agosto, mas ainda sem data definitiva”, afirmou.
Tradição e Restauração
Embora alguns túmulos já tenham sido restaurados na primeira etapa, o costume de acender velas em homenagens devocionais tem causado danos. É o caso dos túmulos de Preta Domingas e do menino Zezinho, que sofreram com a ação do calor das chamas. Para preservar o trabalho feito, medidas de proteção e orientação ao público estão sendo implementadas.
“Não podemos impedir as manifestações de religiosidade, mas buscamos disciplinar essas práticas para evitar prejuízos à restauração”, explicou Loureiro.
Capela e paisagismo
Além dos túmulos, a capela do cemitério também passará por um processo de restauração, com foco em resgatar sua cor original. A igreja, ligada à Paróquia da Santíssima Trindade, continua ativa com celebrações semanais em sufrágio das almas.
O projeto inclui ainda o campanário, o cruzeiro e os túmulos de irmandades religiosas, além do cuidado com a vegetação centenária que compõe o cenário do parque. Segundo o arquiteto do Iphan, Geovani Blanco, o cemitério se enquadra na tipologia de “campo santo”, integrando dimensões religiosas, paisagísticas e arquitetônicas.
Legado monumental
O Cemitério de Nossa Senhora da Soledade é considerado um exemplar raro de cemitério monumental na região Norte do país. No local, as famílias mais abastadas de Belém entre os séculos XIX e XX encomendavam jazigos europeus, com pedras em lioz – calcário português importado da Europa. As inscrições em português arcaico nas lápides ainda são visíveis, revelando mensagens de afeto e saudade.
“É uma riqueza arquitetônica e simbólica que estamos resgatando”, reforça Alexandre Loureiro, que também é professor da Faculdade de Conservação e Restauro da UFPA e pesquisador do Laboratório de Conservação, Restauração e Reabilitação (Lacore).
A meta é que o parque esteja pronto para receber visitantes durante e após a Conferência Climática Mundial (COP30), marcada para novembro em Belém. Até lá, o Parque Cemitério Soledade deverá integrar oficialmente o circuito turístico e de memória da capital paraense, ao lado de monumentos como o Palácio Antônio Lemos, o Mercado de São Brás e igrejas históricas do centro.