ACHADO ARQUEOLÓGIO

Embarcação ficou enterrada na Doca por mais de 110 anos; veja FOTOS e VÍDEO

Restauração histórica da embarcação encontrada em Belém. Conheça mais sobre o processo de conservação da embarcação.

Embarcação foi encontrada no canal da Doca. Foto: Celso Rodrigues/ Diário do Pará.
Embarcação foi encontrada no canal da Doca. Foto: Celso Rodrigues/ Diário do Pará.

Belém - A embarcação encontrada em meio às obras do Parque Linear da Doca, no centro de Belém, passará por um processo de restauração e conservação que vai durar cerca de 150 dias úteis. A informação foi confirmada durante coletiva de imprensa, na manhã desta sexta-feira (17). A estrutura foi desenterrada na última terça-feira (14) e encontra-se no estacionamento de uma faculdade privada, localizada próximo ao local do achado arqueológico, na avenida Visconde de Souza Franco, onde será montado um laboratório para o restauro. 

Em agosto de 2024, o barco foi identificado durante as escavações do canal da Nova Doca. Após alguns estudos, dois segmentos do barco (proa e o casco) foram desenterrados esta semana. A terceira parte do navio, o segundo pedaço do casco, ainda está em processo de escavação para o desterramento. Ao final de todo o processo de restauro e conservação, o material deverá ser exposto no Porto Futuro I, ao lado da área onde foi encontrada.

O processo de restauro será realizado por uma equipe multidisciplinar, composta por arquitetos, engenheiros, conservadores, restauradores, arqueólogos e museólogos, que estarão empenhados em buscar informações sobre a embarcação. Através de coleta e análises laboratoriais, os resultados da pesquisa devem apontar os procedimentos adequados para o tratamento e conservação da estrutura, que será feita em aproximadamente 7 meses em um laboratório ao ar livre. 

“Inicialmente, no processo de restauração vai ser realizada uma limpeza para, também, encontrarmos mais informações. Vamos fazer coletas e análises laboratoriais para ter a compreensão do material e qual o melhor procedimento, como os melhores produtos para a restauração e tratamento. Como ele [barco] vai ficar exposto em ambiente externo, temos que utilizar materiais adequados para essa exposição, mantendo a sua conservação”, esclarece a arquiteta restauradora Thainá Arruda. 

O processo será acompanhado de perto pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Conforme a superintendente estadual do Instituto, Cristina Vasconcelos, a avaliação da estrutura será um processo importante para revelar questões-chave com o objetivo de entender os aspectos históricos sobre a embarcação, além de um trecho da história da própria cidade de Belém. 

“A gente precisa entender qual é o período dessa embarcação, o que essa embarcação nos traz de notícia do período dela. Nós sabemos que Belém nasceu de frente para o rio e essa embarcação foi abandonada. Ela não era uma embarcação que estava embaixo da água, como várias outras embarcações são encontradas, ela estava soterrada. Então, por que ela foi abandonada? Em que período foi? Tudo isso deve ser respondido para que possamos deixar ela bem estruturada e colocar isso para a sociedade. Ela vai ser musealizada e precisa estar totalmente restaurada e com sua história contada”, afirmou Cristina Vasconcelos.

DESCOBERTA

A obra da Nova Doca, assim como nos principais centros históricos das capitais brasileiras, está sendo realizada mediante licenciamento e acompanhamento arqueológico. Por isso, uma equipe de especialistas foi contratada pela Secretaria de Obras Públicas (Seop) para fazer a observação e a resguarda da ocorrência de possíveis achados arqueológicos. Durante o processo de escavação na área inicial da Doca, próximo a avenida Marechal Hermes, foram encontrados fragmentos de uma embarcação antiga. 

De acordo com o arqueólogo contratado pela empresa responsável pela obra, Kelton Mendes, a estrutura dá conta de uma proa e parte do casco de um barco que supostamente seria de um período do final do século 19 e início do século 20, entre os anos de 1890 a 1910. Nessa época, aquela área, anteriormente chamada de “Igarapé das Almas”, foi aterrada, dando início a construção dos armazéns da Estação das Docas e a urbanização do centro da capital. 

“Essa embarcação está em um contexto histórico muito interessante e a gente já imaginava que iria ocorrer. Aqui onde estamos, essa área foi aterrada para a construção dos armazéns que, hoje, chamamos de Estação das Docas. Esse processo de aterramento soterrou algumas embarcações que foram abandonadas. A gente tem uma previsão de que ela [embarcação] tem mais de 110 anos enterrado nesta área porque o processo de construção dos armazéns foi no final do século 19, entre 1890 a 1910”, revela o arqueólogo. 

Foto: Celso Rodrigues/ Diário do Pará.

Segundo o arqueólogo do Iphan, Augusto Miranda, as primeiras observações dão conta de um barco com estrutura de ferro, possivelmente movida a vapor e construída em outra cidade. Foram encontradas a polpa (frente) e duas partes do casco, sendo desconhecido o destino do popa (traseira) da embarcação, totalizando aproximadamente 28 metros de comprimento descobertos. O barco ainda estava de frente para o rio e foi abandonado, ao invés de naufragado. A localização próxima ao cais e a menos de 40 centímetros abaixo da camada de asfalto afirmam a constatação. 

“Essa embarcação revela para a gente uma cidade que, muitas vezes, a gente não conhece. Ela está em um período na história tão longe, mas que a materialidade vai trazer à tona a realidade que a gente desconhece sobre o século 19. Através desse material, a gente também pode entender um pouco sobre a ocupação da cidade, se utilizava no transporte através do rio, entre outras coisas. Ele estava a uma altura que nitidamente estava em um contexto de um barco que foi encostado e a cidade foi acontecendo, até o momento em que foi soterrado”, disse Augusto Miranda.

Uma terceira parte, referente a continuação do casco, ainda está em processo de escavação para ser desenterrada do canal. Logo após, a equipe multidisciplinar será responsável pelo trabalho de pesquisa, restauração, levantamento histórico, conservação e disposição. “A nossa finalidade, além de fazer o cumprimento da lei de preservação, é entender como ela foi utilizada, por que tipo de pessoas a gente, tentar entender um pouco dos que estavam participando desse momento histórico que ela estava sendo utilizada”, finalizou o arqueólogo Kelton Mendes.