Não é preciso andar muito pela capital paraense para perceber que eles já estão entre nós: os visitantes de diversos lugares do Brasil e do mundo que vieram matar a curiosidade sobre a primeira cidade brasileira escolhida para sediar uma edição – a trigésima, no caso – do maior debate climático do planeta, a Conferência das Partes, a COP30, que será inteiramente realizada em diversos espaços de Belém entre os dias 10 e 21 de novembro deste ano.
De acordo com dados da Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo (Embratur), na comparação dos primeiros onze meses de 2023 com o mesmo período de 2024, as chegadas por via aérea à Cidade das Mangueiras cresceram quase 60% – fomos de 18.655 para 29.685 pousos, garantindo assim um ano de movimentação recorde no Aeroporto Internacional Júlio Cezar Ribeiro, também conhecido como de Val-de-Cans. Nacionais do Suriname, França, Estados Unidos, Portugal e Holanda formam os principais grupos a terem desembarcado por aqui no ano passado.
Desde antes de novembro de 2023, quando a capital do Pará foi oficialmente anunciada sede da Conferência COP30, esforços unidos dos governos federal, estadual e municipal têm sido direcionados a aprimorar a infraestrutura da cidade para receber os cerca de 40 mil participantes esperados ao evento. As ações, que vão desde capacitação profissional em diversas áreas, atenção à rede de hospedagens, além de reformas e modernização de equipamentos históricos, como os mercados do Ver-o-Peso e de São Brás, já podem ser considerados os responsáveis por esse aumento de movimentação turística, mesmo em meses considerados como sendo de baixa temporada.
Os investimentos do governo federal estão na ordem de R$ 4,7 bilhões, entre recursos do Orçamento Geral da União, do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e da Itaipu Binacional. Além da execução de obras, outros movimentos via governo federal já estão encaminhados em perspectiva da COP30. Em junho do ano passado, o Ministério do Turismo, em parceria com a Embratur e a Caixa Econômica Federal, assinou um acordo de cooperação com previsão de R$ 6 milhões em investimentos para desenvolver o turismo de base comunitária em Belém e nas ilhas metropolitanas dos arredores da cidade.
O foco é na elaboração de projetos de experiência autêntica com participação ativa dos ribeirinhos, potencializando o que há de significativo na região. “Pela primeira vez na história, nós vamos investir um valor tão significativo para desenvolver uma modelagem de turismo que aproxime as pessoas que mais precisam de uma fonte de renda sustentável, e ainda proporcionar experiências turísticas memoráveis”, declarou o ministro do Turismo, Celso Sabino, à ocasião.
Em novembro, também em Belém, foi inaugurada a primeira Escola de Turismo do Brasil. A escolha da cidade para o projeto pioneiro do Ministério do Turismo foi motivada exatamente pela proximidade da COP30 em terras paraenses. Com aulas presenciais em Belém, Santarém, Vigia e Bragança e também com aulas na modalidade online, são 4,7 mil vagas nos cursos como os de “Gestão de Negócios para o Turismo”, “Educação Ambiental e Sustentabilidade”, “Governança para a Hospedagem Familiar” e “Condutor de Atrativos Turísticos”, além de idiomas como inglês e espanhol.
Belém na mira dos viajantes
Turismóloga, guia de turismo e atualmente vice-presidente do Sindicato dos Guias de Turismo (Singturpa), Mônica Sousa confirma que o aumento significativo no número de visitantes, especialmente de diversas nacionalidades, sinaliza um momento ímpar para a cidade. Em seu entendimento, a realização de eventos como o tradicional Círio de Nazaré e a COP30 têm atraído um grande número de visitantes e colocado Belém no mapa do turismo mundial.
“Além da busca por experiências autênticas e contato com a natureza, a gastronomia tem levado muitos turistas a explorarem a Amazônia, com Belém como ponto de partida. Nossa cidade oferece uma experiência rica em história, arte e natureza, que certamente irá encantar a todos que a conhecerem”, convida.
A profissional aposta que esta somatória de elementos deve promover a capital e o estado como um destino turístico sustentável e com rica biodiversidade, e ainda que trará uma oportunidade única para fortalecer novas rotas turísticas, conectando Belém a outras cidades do interior, como Bragança, Curuçá, Salinópolis, Igarapé-Açu, dentre outras.
“Segundo os turistas que atendo, uma das principais razões para a escolha de Belém como destino é que conhecem pouco da região Norte, ou já foram para Manaus e acham que Belém oferece uma rica fonte histórica rica em detalhes, com casarões coloniais, igrejas barrocas e museus que contam a história da cidade, além de poder usufruir da natureza. E tem a gastronomia sem igual, apreciada por todos. Ou seja, Belém é um destino que oferece uma experiência completa”, revela.
Mônica, enquanto turismóloga, defende que, para garantir continuidade a essa atratividade, é preciso investir em infraestrutura de qualidade em todo o estado, não só na capital, para atender à demanda crescente de turistas, e em qualificação de mão de obra, essencial para oferecer serviços de qualidade e garantir a satisfação dos visitantes.
“A COP30 representa uma oportunidade única para o Pará fortalecer sua posição no mercado turístico internacional. Com planejamento adequado e investimentos estratégicos, o estado pode se tornar um destino turístico ainda mais atrativo e sustentável. Precisa ainda de uma identidade visual mais forte, que nos represente no cenário nacional e internacional. Já tivemos “Pará, obra prima da Amazônia”, “Visite o Pará”, e agora é “Viva o Pará, Amazônia mais viva”. Eu tive que pesquisar o último nome, pois não sabia qual era, devido a tantas mudanças. Imagina para um turista, visitante ou investidor?”, sugere a guia de turismo.
Para todos os preconceitos, conhecimento
Durante esta semana, grupos de fãs da cantora norte-americana Billie Eilish publicaram falas xenofóbicas em postagens sobre a possibilidade de um show dela aqui, dizendo que Belém era fim de mundo, que nem tinha como chegar aqui e tudo o mais. Esse tipo de preconceito ainda é uma realidade enfrentada para quem trabalha na promoção do turismo, lamenta Mônica.
“Muitos turistas me relataram que, quando comentaram com parentes e amigos que vinham para Belém, foram questionados o que vinham fazer aqui, que aqui não tinha nada para ver. E foi o meu papel como turismóloga e guia mostrar que se tem muito o que fazer aqui e em outras regiões. É lamentável que grupos de fãs de uma artista internacional expressem opiniões tão negativas e generalizantes sobre a nossa cidade, sem nem a conhecer de fato. Problemas, todas as cidades têm, e não só aqui no Brasil – como em outros destinos internacionais, que vemos as famosas ‘pickpockets”, compara.
Contra manifestações negativas que prejudicam a imagem de Belém e do Pará, reforçando a desinformação e contribuindo para a divisão do país, colocando lenha na fogueira das desigualdades regionais, Mônica defende a iluminação que só o conhecimento é capaz de trazer.
“É fundamental promover o diálogo e a educação sobre a diversidade cultural do Brasil, desmistificando estereótipos e mostrando a riqueza e a beleza de cada região. E é importante valorizar a cultura, a história e as tradições de Belém, para que os próprios moradores se sintam orgulhosos de sua cidade e sejam seus maiores promotores. É importante lembrar que o turismo é uma ferramenta poderosa para promover o desenvolvimento social e econômico de uma região”, estimula.
Setores animados
Maior movimentação de pessoas sempre é bom sinal para a economia em suas mais diversas frentes. Assessor jurídico do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares do Estado do Pará (SHRBS-PA), Fernando Soares conta que 2025 deve ser o ano para os empreendimentos dessas três áreas. “Esse movimento tende a se intensificar mesmo, pois acreditamos que já estão vindo muitos representantes de delegações e organizações que participarão da COP30 para providenciar hospedagem e logística na cidade”, avalia.
Ele confirma que os proprietários desses estabelecimentos já sentem um aumento no fluxo de clientes em uma época que, em regra, é mais calma. E é possível que essa antecipação tenha a ver com os preços inicialmente assustadores das hospedagens já sendo disponibilizadas para agendamento no período da Conferência.
O DIÁRIO publicou matéria em 19 de dezembro passado mostrando que, a pouco menos de um ano do evento, uma plataforma de anúncios de aluguel de hospedagem por temporada tinha apartamento de três quartos no centro de Belém sendo ofertado por R$ 2 milhões para estadia no período de realização da programação. Uma tendência que, na opinião de Fernando, não deve se confirmar.
“Eu acredito que esses preços vão se acomodar e tendem a cair, porque nem todo mundo vai aceitar pagar uma fortuna por 15 dias de hospedagem. Agora, é claro, isso também é gente se aproveitando do hiato que temos em relação a leitos de hospedagem”, avalia.
Fernando Soares antecipa que os preços praticados pelos hotéis costumam acompanhar o tipo e qualidade do serviço prestado, além de vantagens, conforto e outros elementos. “É um período atípico, que realmente é provável que os preços se elevem, mas não existe como a gente, no Sindicato, determinar um valor mínimo ou máximo. Já sei de delegações que estão enviando representantes para negociar reservas, mas ainda não tivemos dados ou números sobre isso”, explica.
Preços à parte, a expectativa para esse boom de oferta de serviços por causa da COP30 é a melhor possível. “Tem tudo para ser um ano fantástico, memorável para o setor. A gente já está vendo a movimentação de pessoas de fora na cidade, né, e em um período que é morto para os nossos setores. E a partir de março isso deve se intensificar, porque tem feriados, beneficiando pessoal do interior. Tem carnaval, férias de julho, e chegando o segundo semestre vai ser realmente tudo muito mais intenso. Tem tudo para ser um ano de ganhos memoráveis para os setores, com certeza”, confia o assessor jurídico da SHRBS-PA.