Neste domingo, 12 de janeiro, Belém celebrou seus 409 anos. No entanto, é fundamental questionar: qual Belém está sendo comemorada? O professor de História da Universidade do Estado do Pará (Uepa), Leopoldo Nogueira Júnior, oferece uma análise crítica sobre essa data e a narrativa oficial que exclui outras histórias. O município paraense, que hoje é um centro urbano dinâmico, com uma população numerosa e atividades econômicas variadas, já era habitado por civilizações indígenas bem antes da chegada dos colonizadores portugueses.
A Belém Antes da Colonização: A Cidade de Mairi
Antes de se tornar o que conhecemos como Belém, existia a cidade de Mairi, pertencente aos Tupinambás, uma população indígena. Mairi, em sua cultura, era vista como uma manifestação da divindade Maíra, conectada profundamente à terra, à floresta e às águas. Segundo pesquisas do professor Leopoldo, Mairi chegou a abrigar mais de um milhão de habitantes em algum ponto de sua história.
Ao contrário do que é comumente ensinado nas escolas, Mairi não era uma cidade “atrasada”, mas sim uma civilização com cultura própria, organização social, costumes e religiosidade diferentes dos padrões europeus. Infelizmente, essa diferença foi vista pelos colonizadores como um sinal de inferioridade. Com a chegada dos portugueses, no século XVII, a cidade e sua população foram desestruturadas. Os colonizadores, inicialmente apenas 140 pessoas, ocuparam o território, construíram praças, a Igreja da Sé e o Forte, enquanto as populações originárias, que se opuseram à invasão, foram dizimadas.
A Data de 12 de Janeiro: A Celebração dos Invasores?
Para o professor Leopoldo, o dia 12 de janeiro marca, na verdade, a comemoração da chegada dos invasores: os colonizadores brancos e católicos, em detrimento das populações indígenas que sofreram genocídio. Segundo ele, essa data oficializa uma narrativa que apaga a violência histórica contra os povos originários e invisibiliza os processos de invasão do território Tupinambá.
Essa perspectiva crítica sugere que a data de 12 de janeiro deveria ser uma oportunidade para refletir sobre o verdadeiro significado da colonização e as consequências que ela trouxe para as culturas locais, invisibilizadas por um processo de institucionalização da memória.
Repensando a História e o Patrimônio de Belém
A partir de uma abordagem decolonial, é possível repensar o conceito de patrimônio e da criação de Belém, reconhecendo a cidade em sua totalidade e valorizando a pluralidade de pessoas, cores e histórias que compõem sua realidade. Embora seja essencial reconhecer a importância de legados materiais da colonização, como igrejas antigas e centros comunitários, o professor Nogueira defende uma revisão da história para dar voz a todos os segmentos da sociedade.
O Dia 7 de Janeiro e a Cabanagem: Uma História Também a Ser Celebrada
Além disso, o professor ressalta a importância de reavaliar outras datas históricas, como o dia 7 de janeiro, que marca a retomada de Belém por populações pobres, escravizadas e indígenas durante a Cabanagem. Esse evento, profundamente ligado à resistência e à luta por liberdade, merece ser lembrado, pois faz parte da verdadeira cultura e história da cidade.
Com informações de Fernanda Martins, jornalista (Centro de Ciências Sociais e Educação- CCSE/Uepa)