- O número de novos estúdios de tatuagem e body piercing cresceu 35% entre os anos de 2019 e 2022 no Brasil.
- Apenas no ano passado foram criados 6.763 novos pequenos negócios especializados neste segmento no país.
- Outra realidade que é percebida a olhos vistos é a maior presença de mulheres à frente desses empreendimentos. Conheça algumas tatuadoras que trabalham na capital.
Cintia Magno
O bom momento vivenciado pelo mercado da tatuagem é evidenciado em números. De acordo com um levantamento realizado pelo Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), o número de novos estúdios de tatuagem e body piercing cresceu 35% entre os anos de 2019 e 2022 no Brasil. Apenas no ano passado foram criados 6.763 novos pequenos negócios especializados neste segmento no país. Outra realidade que é percebida a olhos vistos é a maior presença de mulheres à frente desses empreendimentos.
Quando a tatuadora Beah começou a atuar na área, ainda em 2018, ela lembra de ouvir falar de duas tatuadoras que eram mais conhecidas em Belém, na época. Passados cinco anos, a realidade hoje é bem diferente. Ao adentrar em algum estúdio de tatuagem, já não é incomum encontrar mulheres atuando nos mais diversos estilos que a tatuagem possibilita. “Eu morava no Rio de Janeiro e quando eu voltei para Belém eu lembro que era uma raridade encontrar mulheres tatuando”.
Beah conta que a relação com a tatuagem iniciou no período em que ela morou no Rio de Janeiro. Na época, ela estava fazendo um estágio como técnica de farmácia, mas acabou conhecendo uma pessoa que percebeu a habilidade que ela tinha para o desenho e que chamou a atenção para a possibilidade de atuação no ramo da tatuagem.
“Eu já desenhava desde criança, muito bem, só que nunca foi algo muito explorado pela minha família. Mas na época eu morava no Rio de Janeiro e acabou que eu conheci uma pessoa que gostava dos meus desenhos e ela resolveu me ensinar a tatuar”, lembra a tatuadora, que é paraense.
“É muito diferente desenhar no papel e desenhar na pele. Eu lembro que chegou um certo período, depois de um mês e meio que eu estava aprendendo, que eu pensei em desistir porque é realmente difícil. É diferente quando você tem um lápis e uma máquina que fica vibrando na tua mão e que, mesmo assim, você precisa ter precisão”.
Apesar do desafio, Beah conta que decidiu seguir na profissão, sempre buscando se aperfeiçoar e se especializar. Na época em que ela retornou à capital paraense, ainda havia poucas mulheres tatuando e ela lembra que, como em muitas outras áreas de atuação profissional, não deixou de enfrentar preconceito por ser mulher.
“No início, teve um cliente que veio fazer uma tatuagem comigo e ficou ‘ah, mas é mulher, acho que ela não vai saber fazer direito essa tatuagem’, mas o dono do espaço onde eu trabalhava falou que ele poderia confiar, para ele fazer a tatuagem comigo e foi aí que o cliente fez e gostou muito do meu trabalho”, lembra, ela que hoje atua no seu próprio estúdio.
“Eu tinha uma amiga da época do ensino médio que também se tornou tatuadora e ela também enfrentou uns processos, até porque o estilo de tatuagem dela é o realismo e, naquela época, não era muito bem-visto mulheres fazendo isso. Então, sempre tinha um certo preconceito”.
No caso de Beah, a área de especialidade iniciou no estilo fineline, centrado em desenhos com traços finos e artes mais delicadas. Há dois anos, porém, ela também se especializou em microrrealismo. “Foi na pandemia que eu me especializei em microrrealismo. É um estilo que reproduz uma imagem, como se fosse uma foto de paisagem, de animal ou de pessoa, só que em tamanho menor, para quem não gosta de tatuagens muito grandes. É a área que eu, atualmente, mais gosto de trabalhar”.
Foi também através da habilidade com os desenhos que a tatuadora Nayla Perdigão acabou levada para o ramo da tatuagem. Ela lembra que tudo começou quando ela própria era a ‘tela’ de um amigo tatuador.
“Eu desenho desde criança e sempre gostei de tatuagem e coisas alternativas. Como eu já desenhava, esse meu amigo perguntou se eu queria aprender e eu disse que queria. Então, ele começou a me ensinar”, recorda. “Depois ele foi para um estúdio de tatuagem aqui de Belém e eu ficava indo de vez em quando lá, ficava prestando atenção no que eles estavam fazendo e decidi comprar a minha primeira máquina, mas eu tive que parar porque eu fui arrumar um emprego e fiquei um tempo trabalhando em um shopping”.
Apesar da pausa, a tatuagem foi a alternativa escolhida por Nayla para atuar profissionalmente. Assim que ela saiu do emprego no shopping, usou o dinheiro da rescisão para investir em equipamento, tintas e todo o resto necessário. Desde então, ela continua tatuando e já possui um estúdio próprio em Belém.
“Acho que a maioria das mulheres que tatuam agora começaram naquela época. Tem várias que estão tatuando hoje, pelo menos algumas amigas minhas, que começaram naquela mesma época que eu comecei, em 2017. Mas agora o mercado de tatuagem está bem grande, principalmente em Belém”, avalia. “Quase o tempo todo está abrindo um novo estúdio ou tem alguém dando aulas porque agora, também, abrem muitas escolas de tatuagens com os tatuadores que são mais experientes”.
Com o mercado aquecido e uma crescente participação feminina no ramo, Nayla lembra que tem tatuadoras atuando em diferentes segmentos. “O mercado está bem grande e cada uma faz um estilo diferente. Eu faço um estilo totalmente diferente de uma amiga minha, que é especializada em blackwork em pele preta, por exemplo. Eu sou mais para colorido, mas também faço tatuagens em pele preta. Então, tudo tem uma especialidade gigantesca. Eu faço bastante colorida, eu gosto muito de anime e o que sai muito, hoje, são as minhas autorais de referências regionais”.
Já entre os clientes da tatuadora Glenda Souza, as tatuagens mais pedidas são as escritas e os florais. Especialista no estilo fineline, ela conta que a maior parte do seu público é formada por mulheres. “Desde o princípio, eu foquei no fineline, que é o estilo de traços finos. Foi algo que eu decidi me aperfeiçoar e hoje em dia eu já sou reconhecida por essa referência. As pessoas que me procuram, já vêm procurando esse estilo”.
Glenda conta que decidiu seguir o ramo da tatuagem durante a pandemia. Na verdade, ela viu o segmento como uma oportunidade de atuação fora do regime celetista. “Eu comecei a tatuar mais pela vontade de deixar de ser CLT, porque eu já trabalhava há quatro anos em uma empresa e tive a minha primeira gravidez, gemelar, e logo em seguida, quando as crianças estavam com nove meses, eu engravidei de novo. Então, eu tinha necessidade de ter algo fixo para mim porque, por mais que eu trabalhasse CLT, não era tão seguro”.
Ela lembra que o esposo já era tatuador e foi com ele que ela começou a aprender. Depois de um ano, eles conseguiram abrir o primeiro estúdio e vêm caminhando juntos na área. “Eu vi como uma brecha de algo que eu poderia aprender e procurar viver da minha arte. Eu comecei na tatuagem logo quando meu filho nasceu, e inicialmente, a gente tatuava em casa. Nós passamos um ano assim e depois apareceu a oportunidade da gente abrir o nosso primeiro estúdio”, conta Glenda.
“Quando eu comecei, eu procurei referências de mulheres tatuadoras e tinha muita referência de tatuadoras de fora, mas aqui mesmo eram apenas duas que eu conhecia. Com o passar do tempo eu vi que foi crescendo bastante, foram surgindo mais mulheres dentro do ramo, até mesmo por uma questão polêmica que eu já ouvi de vários relatos de clientes mulheres que comentaram que se sentiam mais à vontade em serem atendidas por mulheres, algumas por terem sofrido assédio em certos estúdios e outras por quererem mesmo ser atendidas por mulheres para fortalecer esse movimento, então, o fato de ter crescido essa atuação feminina na tatuagem é muito importante”.