Luiza Mello
O Brasil teve 795 indígenas assassinados entre 2019 e 2022. Os dados fazem parte do Relatório Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil – dados de 2022, publicado pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi). Os estados com o maior número de assassinatos foram: Roraima (208, Amazonas (163) e Mato Grosso do Sul (146).
No Pará foram 38 assassinatos no período de quatro anos. O relatório revelou que no ano passado ocorreram 835 mortes de crianças indígenas entre 0 e 4 anos, representando um aumento com relação ao ano anterior. Em 2021 foram 744 mortes de crianças indígenas de 0 a 4 anos de idade. Em todo o Brasil, a Sesai registrou um total de 3.552 óbitos nesta faixa etária entre 2019 e 2022.
Os dados divulgados pelo Cimi retratam a violência contra os povos indígenas durante o governo de Jair Bolsonaro, que foi, segundo o texto, “marcado por violações e desmonte dos órgãos de proteção e assistência”. O Pará foi um recordista em conflitos relativos a direitos territoriais, um total de 20 entre os 158 casos relatados pelo Conselho.
A maioria das mortes de crianças indígenas foi registrada no Amazonas (233), em Roraima (128) e em Mato Grosso (133), de acordo com o relatório do Cimi. No levantamento, há a ampliação da análise para um período mais longo.
Considerado o período de quatro anos, entre 2019 e 2022, os mesmos três estados concentraram a maioria dos óbitos: foram, no total, 1.014 mortes de crianças menores de cinco anos no Amazonas, 607 em Roraima e 487 em Mato Grosso.
Em relação às violências cometidas contra pessoas, classe que inclui, além dos assassinatos, outros tipos de violência não letais, o ano passado terminou com um total de 416 casos. Esse número é 15,2% superior ao de 2021. Dentro dessa categoria, as ameaças de todo tipo praticamente dobraram quando comparados os registros do ano passado com os de anos anteriores, assim como os casos de racismo e discriminação e as violências sexuais.
Em muitos casos, as execuções ocorrem após uma sucessão de acontecimentos, que eleva o clima de tensão na região. O monitoramento das disputas que tomam conta dos territórios é também parte do trabalho do Cimi, que apresenta esses detalhes desses dados.
O documento também traz números sobre violência contra o patrimônio. Esses casos totalizaram 467, um aumento de 10,4% na comparação com o ano de 2021, quando o total foi de 423. A categoria inclui conflitos relativos a direitos territoriais, invasões de terra, exploração ilegal de recursos naturais e danos ao patrimônio.
O Cimi documenta ainda como a falta de atuação do poder público afetou os indígenas em 2022. Nesse contexto, o dado mais expressivo é o relacionado à mortalidade infantil, que abrange 835 casos.
O relatório do Cimi registrou ainda casos de total desassistência na área de saúde (87); disseminação de bebida alcoólica e outras drogas (5) e morte por desassistência à saúde (40), totalizando 243 casos.
Organizado em três capítulos e 19 categorias de análise, a publicação apresenta um retrato das diversas violências e violações praticadas contra os povos indígenas em todo o país. Para a produção do documento foram sistematizados dados obtidos através de informações dos regionais do Cimi, de comunidades indígenas e de veículos de comunicação, além de fontes públicas oriundas da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) e de secretarias estaduais de saúde.
O Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) Yanomami e Ye’kwana, que cobre a Terra Indígena Yanomami e estende-se entre os estados de Roraima e Amazonas, registrou 621 mortes de crianças de 0 a 4 anos entre 2019 e 2022, concentrando 17,5% de todas as mortes de crianças indígenas nesta faixa etária.
Segundo o DSEI-YY, a população na TI Yanomami é estimada em aproximadamente 30,5 mil pessoas – o que corresponde a apenas 4% do total de indígenas atendidos pela Sesai, como indicam as informações obtidas pelo Cimi.
“O fato de que parte da estrutura de saúde da TI foi apropriada por garimpeiros, em regiões isoladas e de difícil acesso, indica que a realidade certamente é ainda mais grave do que os dados oficiais reconhecem”, analisa o relatório.
Os dados mostram que não houve homologação nem emissão de portarias declaratórias: “um vergonhoso total de zero avanços em processos demarcatórios de terras indígenas no decorrer de quatro longos anos”, diz o texto que destaca também “a atuação da Funai no sentido de desproteger os povos indígenas em isolamento voluntário que vivem em TIs interditadas por meio de Portarias de Restrição de Uso, um instrumento temporário que impede a circulação de não indígenas nestes territórios”.
“Sob Bolsonaro, a Funai adotou a prática de renovar estas portarias por períodos de apenas seis meses – como foi o caso das TIs Ituna-Itatá (PA), Piripkura (MT) e Pirititi (RR) – ou de desprotegê-las completamente, como foi o caso da TI Jacareúba/Katawixi (AM), que passou todo o ano de 2022 sem que sua portaria, vencida em dezembro de 2021, fosse renovada”, aponta o relatório ressaltando que as medidas protetivas somente foram retomadas graças às ações do Ministério Público Federal.